domingo, 2 de novembro de 2014

'Sagrado não tem cor', diz Mãe Stella em debate que lotou tarde na Flica


Ialorixá participou de discussão literária em Cachoeira, neste sábado (1º).
Cerca de 700 pessoas viram mesa intitulada 'Os Lastros de Antigos Laços'.

Henrique Mendes Do G1 BA
Mãe Stella na Flica (Foto: Henrique Mendes/G1)Participação de Mãe Stella lotou tarde de sávado na Flica, em Cachoeira (Foto: Henrique Mendes/G1)
Primeira homenageada nas quatro edições da Festa Literária de Internacional de Cachoeira (Flica), no recôncavo da Bahia, Mãe Stella de Oxóssi atraiu centenas de admiradores para o Convento do Conjunto do Carmo no final da tarde deste sábado (1º). Com espaço para 300 pessoas sentadas, o chão foi uma alternativa para um público estimado em 700 pessoas que com aplausos recebeu a primeira Ialorixá empossada em uma academia de letras no Brasil.
Mãe Stella integrou a décima mesa do evento literário. Sob a mediação do professor Jaime Sodré, a Ialorixá versou sobre um tema inspirado em sua história de vida: "Os Lastros de Antigos Laços". Para começar, reafirmou o vínculo com candomblé e ressaltou que a religião não é propriedade de um povo específico.  "O sagrado não tem nação. Não tem preto, não tem cor. O sagrado está em nosso coração", alertou.
Sobre a afirmação das crenças religiosas, Mãe Stella revelou que ainda há pessoas que não atestam a própria crença nos orixás. "Uma coisa que me choca muito é uma pessoa de orixá que não se tem como religioso. Diz que é católico. Raramente pessoas dizem que são  do candomblé", criticou. À respeito do orgulho de ser de santo, Mãe Stella relatou que tem a inspiração dos orixás até na literatura. "Oxóssi não chega [como inspiração], ele tá comigo. Se estou estudando, chorando, dançando candomblé, ele está comigo", afirmou.
Autora de livros como “Meu tempo é agora”, “Òsósi – O Caçador de Alegrias”, “Epé Laiyé- terra viva” e "Ófun", a Ialorixá disse que a produção literária é possível a todos. "Até quem não sabe ler pode falar para outro escrever, basta ter inspiração", defendeu. Ocupante da cadeira número 33 da Academia de Letras da Bahia (ALB) e inspiração do povo de santo, Mãe Stella não considera mais importantes do que os demais integrantes do candomblé. "Com espiritualidade não tem superior", ressaltou.
Sobre os 89 anos, Mãe Stella admitiu que já sente o peso da idade. "É fogo. Está difícil as limitações de velho. Às vezes, eu quero passar a noite cantando, fazendo  poesia ou lendo, mas não posso porque o sono chega antes da hora", relatou. Ela também destacou os problemas de atenção.
A idade, entretanto, não impede que a escritora e Ialorixá esteja antenada aos assuntos que são notícia no país. Sobre a recente discussão sobre preconceito regional de sulistas contra nordestinos, que veio após as eleições, ela brincou: "A pessoa comeu um mocotó mal comido e entrou esse delírio [preconceito] na cabeça, mas vai passar. É passageiro", vislumbrou.
À respeito da homenagem da Flica, Mãe Stella admitiu que não esperava um dia receber uma homenagem tão gratificante. "É muito difícil falar. As palavras faltam de tanta alegria e emoção. Nunca imaginei que estaria um dia aqui nesse bate-papo tão gratificante. Peço que tenham paciência comigo e aceitem minhas palavras", concluiu sob aplausos.

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