Texto da Exame:
“Se colocarem o governo para administrar o deserto do Saara”, disse certa vez o economista Milton Friedman, “vai faltar areia em cinco anos.” O Prêmio Nobel Friedman,
como se sabe, era um notório crítico das intervenções estatais na
economia de mercado. Mas pensava nos burocratas americanos quando disse o
que disse.
Imagine o que
aconteceria se o governo brasileiro recebesse a missão de administrar o
Saara. Logo no início, o preço do transporte por camelo seria congelado
para segurar a inflação. O imposto provisório sobre o movimento de dunas
(IPMD) ajudaria a cobrir o buraco orçamentário.
Atendendo a uma demanda da bancada do
oásis do PMDB, uma norma do Ministério das Areias obrigaria beduínos e
tuaregues a adotar rotas diferentes das estabelecidas por seus
ancestrais. O resultado, além da falta de areia, seria uma confusão
completa.
Pode parecer uma parábola exagerada, mas
uma história real (e recente) ajuda, de forma didática, a entender o
que acontece quando o governo brasileiro se mete a fazer o que não sabe.
Nesse caso, gerir umfundo de investimento — o Fundo Soberano do Brasil.
Em dezembro de 2008, o mundo vivia os
efeitos do pânico causado pela quebra do banco americano Lehman
Brothers. Em meio ao pacote de medidas destinadas a proteger o Brasil da
crise estava a criação de um fundo soberano — nome dado aos fundos de
investimento controlados por países e que aplicam, basicamente, no
exterior.
Ao anunciar o novo fundo, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou que aquele era um passo para financiar empresas brasileiras que
investissem fora do país. No futuro, esse fundo seria engordado com
parte dos royalties pagos à União pela exploração das reservas do
petróleo do pré-sal, como fazem Arábia Saudita, Emirados Árabes, Noruega
e outros produtores. A expectativa era grande.
O fundo começou com 14 bilhões de reais, e sua administração foi delegada à Secretaria do Tesouro Nacional, comandada por Arno Augustin. Começava, ali, uma das lambanças financeiras mais impressionantes da história recente do país.
No primeiro ano, os gestores do fundo
não fizeram nada do que haviam prometido. O dinheiro ficou, basicamente,
parado em títulos públicos brasileiros. Mas em 2010 a criatividade
tomou conta do governo federal, que precisava de uma força para
financiar a gigantesca capitalização da Petrobras — feita para levantar
recursos para a exploração do pré-sal.
A equipe de Arno Augustin comprou nada
menos que 12 bilhões de reais em ações da Petrobras. Pagou 29,65 reais
pelas ações ordinárias e 26,30 reais pelas preferenciais e passou a ter
3,9% do capital da companhia. Além de não ter absolutamente nada a ver
com os objetivos do fundo, esse investimento foi desastroso.
As ações da Petrobras perderam cerca de
40% de seu valor nos dois anos seguintes. Mas foi aí que surgiu o
inexplicável. Arno e seus magos das finanças inverteram a lógica mais
básica que rege investimentos e decidiram vender tudo.
Compraram na alta e venderam na baixa — e
jogaram na lata do lixo 4,4 bilhões de reais. Até o fechamento desta
edição, ninguém havia sido responsabilizado por isso.
Nenhum comentário:
Postar um comentário