Miriam Leitão diz que os militares (de hoje) não acham errado TORTURAR e MATAR dentro de instalações militares.
Miriam Leitão diz que os militares (de hoje) não acham errado TORTURAR e MATAR dentro de instalações militares. Para ela o relatório da semana passada causou PERPLEXIDADE.
Revista Sociedade Militar.
"... essas
instalações militares, elas existem para defender o Brasil...eu não
tenho dúvidas de que o senhor acha isso, mas os seus comandados não
acham... "
Respondendo questões colocadas pela Comissão Nacional da verdade, os
comandos militares elaboraram relatórios detalhados sobre o
funcionamento das instalações onde supostamente ocorreram crimes contra
militantes de esquerda. A imprensa se diz perplexa com as respostas.
Embora os relatórios juntos somem mais de 500 páginas e tenham sido
assinados por oficiais generais, incluindo os atuais Comandantes da
Marinha, Exército e Aeronáutica, parece que a imprensa não ficou
satisfeita. A CNV carioca, indignada, diz que se não houve desvio de
função nos quarteis investigados, isso significa que a tortura era uma
pratica sistematizada e endossada pelo governo da época.
Em 26 de junho Miriam Leitão
entrevistou o Ministro da defesa, Celso Amorim, o assunto foi os
relatórios preparados pelos comandos militares em resposta à
questionamentos da Comissão Nacional da Verdade sobre assassinato e
tortura em instalações militares.
Para Miriam os militares responderam
apenas com relatórios administrativos à questões específicas sobre
agressões à direitos humanos de presos em instalações militares, como a
Base do Galeão e Ilha das Flores. Obviamente ninguém, muito menos
Miriam, esperava que o Ministro da Defesa condenasse os relatórios
endossados por seus subordinados, comandantes Enzo, Saito e Moura Neto.
Miriam obviamente já sabia as respostas que seriam dadas, mas precisava
de deixas para fazer seus comentários, expressar sua opinião. No Brasil
grande parte dos repórteres faz assim, e parece que parte do público
aprecia mesmo esse tipo de “entrevista” em que o entrevistador é uma
espécie de expert, um sabe tudo, que já tem na ponta da língua às
réplicas para as respostas dos entrevistados e que, em muitos casos, até
fala mais que estes.
Amorim disse que as questões colocadas
pela Comissão Nacional da Verdade seguiam uma linha administrativa, e
que por isso os relatórios em resposta continham tantos detalhes
administrativos. Ele disse ainda que as perguntas nessa linha se devem à
questão da imprescritibilidade de delitos administrativos. Eis aí um
primeiro ponto interessante. Exaustivamente se diz que a Comissão da
Verdade não possui caráter punitivo, que não procura provas para punir
ninguém. Por que então se busca tão avidamente essa imprescritibilidade?
Miriam Leitão aproveitou a oportunidade e retrucou a resposta do Ministro, perguntando: Então foi a CNV que fez as perguntas erradas? Amorim
disse que não julgaria a CNV e que as Forças Armadas não contestaram as
citações sobre torturas cometidas em estabelecimentos militares. Disse
ainda que tortura cometidas em estabelecimentos militares não se
configura como ilícito administrativo, e sim como crime. Para ele a
Comissão não fez nenhuma pergunta sobre tortura, sobre isso fez
afirmações.
A reporter disse: “as pessoas foram
mortas dentro de instalações militares, foram torturadas e não foi pra
isso que foram instaladas essas instalações militares, elas existem para
defender o Brasil...eu não tenho dúvidas de que o senhor acha isso, mas
os seus comandados não acham... o senhor é comandante dos comandantes
militares, o senhor não deveria levá-los a tomar uma decisão sobre isso?
O que eles fizeram nesse relatório foi tergiversar a questão principal
que se pergunta.”
Miriam leitão, assim como outros
profissionais de imprensa, dá a entender que os comandos militares
exageraram em detalhes administrativos na intenção de omitir a questão
principal. Resumindo claramente, ela acha que a resposta foi uma
tremenda enrolação. Cita até uma menção sobre o TCU ter aprovado as
contas de determinado quartel, fato mencionado em um dos relatórios.
Vejam abaixo excerto do ofício da CNV enviado ao Ministério da Defesa.
O ministro da defesa disse que o Brasil
atravessa um momento de transição, que já chega ao fim. E que todos
terão que se posicionar diante do relatório final a ser produzido pela
CNV. Sobre assassinato e tortura dentro de instalações militares Amorim
disse que acredita que isso talvez fosse a norma implícita, mas não
explícita. Falou que “os militares de hoje tem de ser capazes de
separar o passado do presente. O 31 de março já não é mais comemorado,
era até há muito pouco tempo atrás”
Miriam insiste em dizer que os militares de hoje e de ontem são os mesmos, ela disse: “eles não fazem essa separação quando não admitem os erros do passado.”
O ministro não discordou, na verdade se
aliou à Miriam, dizendo que na sua opinião pessoal eles deveriam fazer a
separação, mas que isso não se faz com uma ordem, que uma mudança
cultural vem aos poucos, em vários momentos ele deixou claro que prefere
o convencimento à determinações.
Façamos uma pequena pausa na conversa
entre Miriam e Amorim. Perguntamos então: O que seria essa mudança
cultural no ponto de vista dos dois? Parece que seria o caso dos
militares de hoje estarem plenamente convencidos que a contra-revolução
de 31 de março de 1964 não foi uma ação justificada, e que as várias
facções criminosas que surgiram, como Var Palmares, lutavam para
implantar a democracia no Brasil, admitindo isso publicamente,
inclusive.
A Constituição Federal de 1988 diz que ninguém
será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção
filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação
legal a todos imposta.
Pelo que percebe-se, os militares não
invocaram sua convicção filosófica ou política para deixar de cumprir
sua obrigação, responderam às questões colocadas da melhor maneira
possível. Pode até ser que alguns dos que participaram da elaboração dos
documentos discordem da visão da Comissão Nacional da Verdade, pode ser
também que concordem. Contudo, agiram corretamente, não deixando isso
transparecer. E em nenhum local dos relatórios encontra-se algo que
sugira que concordam com tortura ou assassinato. Aliás, o próprio Amorim
disse que nunca ouviu de nenhum militar que tortura ou assassinato seja
algo justificado em qualquer lugar ou época.
Questão importante colocada por Miriam
Leitão foi sobre o currículo das instituições de ensino militares.
Ambos, entrevistadora e entrevistado, concordam que deve-se apresentar
uma nova versão dos fatos de nosso “passado recente”, entenda-se aí que a
revolução de 1964 foi injustificada e que os militantes de esquerda na
verdade lutavam pela democracia no Brasil. Celso Amorim disse que o
gerenciamento dessa questão está a cargo de um general, que deverá
convencer seus subordinados a adaptar os currículos. Deu a entender que
os livros usados devem ser exclusivamente os indicados pelo MEC. Uma
“coleção paralela” até hoje usada não teria "mais cabimento”.
A entrevista terminou com Miriam
perguntando se um dia os Militares iriam pedir desculpas pelo que
fizeram ao país na época da ditadura. Amorim respondeu que não sabe, que
talvez isso ocorra após a divulgação do relatório da Comissão Nacional
da Verdade. A última frase do Ministro da Defesa é um tanto quanto
enigmática. Ainda sobre o possível pedido de desculpas, ele disse: Talvez fosse bom pra eles, eu acho.
Robson A.D.Silva. EM: Revista Sociedade Militar.
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