A Coordenação Socialista Latino-Americana existe desde os anos 80. Cai
muro, implodem as ditaduras comunistas e a América Latina insiste não
deu certo em lugar nenhum:
Quando se fala em grandes entidades suprapartidárias da esquerda na
América Latina, o Foro de São Paulo (FSP) sempre surge como o principal
exemplo. Liderado pelo Partido dos Trabalhadores (PT) desde a sua
fundação e sinônimo de vários líderes populistas que chegaram ao poder
no continente na virada do século, o Foro não está sozinho - e rivaliza
cada vez mais com uma organização ainda mais antiga, embora menos
conhecida: a Coordenação Socialista Latino-Americana (CSL).
A CSL começou a ser gestada no início dos anos 80, por meio de
conferências que reuniam os partidos socialistas do continente para
estabelecer uma agenda comum. A primeira conferência da CSL ocorreu em
abril de 1986, quatro anos antes do surgimento do FSP, e reuniu
representantes socialistas de Argentina, Chile, Uruguai, Peru e
Venezuela, observadores de todo o continente e também entidades aliadas
de outras partes do mundo - incluindo, por exemplo, a Organização para a
Libertação da Palestina.
Em defesa do socialismo
Desde o início, o objetivo permaneceu o mesmo. Ainda hoje, trata-se
de um grupo que organiza reuniões periódicas para aprovar resoluções,
posicionamentos e tentar pautar os governos aliados ou pressionar
aqueles dos quais não gosta, partindo de uma perspectiva socialista.
Exaltando a figura de Salvador Allende, o presidente chileno
derrubado por Augusto Pinochet em 1973, a CSL segue a cartilha de outras
organizações semelhantes: não só naquilo que diz ser a favor, mas
também nos temas aos quais se opõe frontalmente - os ataques ao
neoliberalismo, por exemplo, são uma constante.
A CSL prega a solidariedade latino-americana, particularmente entre
os movimentos da sua corrente ideológica, e afirma defender a
“democracia, a liberdade, o socialismo, a sociedade plural, justa,
solidária e ecologicamente equilibrada”.
Em seu estatuto, também afirma atuar em prol do “pluralismo político,
da proteção dos direitos humanos, da valorização social do trabalho e
da concretização dos direitos sociais básicos”.
O Foro do PT e a CSL do PSB
Como o nome sugere, embora a CSL seja composta por organizações de
esquerda de diferentes vertentes, o maior protagonismo vem
inequivocamente dos partidos socialistas tradicionais. Um exemplo claro
disso é a proeminência que o Partido Socialista Brasileiro (PSB) tem
dentro da organização, dominando sua cúpula há anos.
Até o início de 2019, o secretário-geral da Coordenação Socialista
Latino-Americana era Beto Albuquerque, vice-presidente nacional de
relações governamentais do PSB. Na última reunião, em maio, seu sucessor
foi definido e veio do mesmo partido: trata-se de Alessandro Molon,
deputado federal pelo PSB do Rio de Janeiro.
É também pela disputa por uma “liderança à esquerda” que a CSL não
está sozinha na tentativa por unir os partidos e movimentos desse lado
do espectro político no continente: em 1990, seu principal rival, o Foro
de São Paulo, foi criado no Brasil por Luiz Inácio Lula da Silva e seu
Partido dos Trabalhadores, em parceria com o ditador cubano Fidel
Castro.
O PT participa das reuniões de ambos (esteve presente no encontro
mais recente, em Lima, no Peru, celebrado em maio), mas sua força maior
está no Foro. De parte a parte, há um discurso de colaboração entre o
FSP e a CSL, mas nos últimos anos esse relacionamento tem azedado.
Ainda em 2015, na reunião da CSL realizada no Rio de Janeiro, líderes
do PSB aproveitaram o tema do encontro - combate à corrupção e promoção
de mecanismos de transparência - para criticar o governo Dilma Rousseff
e os escândalos que se acumulavam às vésperas do impeachment.
“A esquerda não pode falhar na transparência, porque quando um
partido de esquerda falha nesse sentido, abre-se espaço para que forças e
discursos conservadores ganhem força”, asseverava, na ocasião, o então
secretário-geral Beto Albuquerque, que um ano antes havia sido candidato
a vice-presidente na chapa derrotada de Marina Silva.
Mais recentemente, o PSB anunciou seu rompimento formal com o Foro de
São Paulo, de cujas reuniões participava no passado, embora viesse se
afastando de forma gradual. Antes do último encontro do FSP, realizado
em Caracas no final de julho, o presidente do PSB, Carlos Siqueira,
anunciava o posicionamento:
“Já são três edições que não participamos mais. Mas, agora, é uma decisão oficial. Queremos aprofundar nossas relações com partidos socialistas da Europa, principalmente da Espanha e de Portugal. Não temos muita concordância com esse Foro de São Paulo”, disse Siqueira em entrevista ao site O Antagonista.
Moderação?
Mas, embora alguns dos membros do CSL tentem se vender como uma
esquerda moderada e distante dos posicionamentos mais radicais
associados ao Foro, suas resoluções ainda guardam resquícios de outros
tempos. Em maio, após o final da sua reunião, o grupo emitiu uma
declaração colocando-se ao lado de Nicolás Maduro.
Segundo o CSL, é “inaceitável que o Grupo de Lima (fórum de
articulação política criado para discutir a crise venezuelana) se
constitua na prática em um braço internacional operador da agressão e da
ingerência dirigida por Donald Trump contra a soberania e
autodeterminação da República Bolivariana de Venezuela”. A declaração da
CSL também acusava o Grupo de Lima de promover “ações violentas e
terroristas que buscam subverter a democracia e a institucionalidade
venezuelana”.
Não foi a primeira vez que a CSL se colocou ao lado de um líder
identificado com a esquerda autoritária latino-americana. O órgão nunca
escondeu sua admiração por Fidel Castro e pela Revolução Cubana, algo
que deixou explícito na época da morte do ex-ditador, em 2016. Em nota, o
então secretário-geral Beto Albuquerque afirmava que “a força do
caráter e a inabalável crença de Fidel em um mundo mais justo e
igualitário foram capazes de transformar a pequena ilha do Caribe em uma
referência internacional”, e definia o ditador como “o último grande
líder político e o maior estadista da América Latina do século XX”.
E mesmo as discordâncias não impedem que, em última instância, as
várias organizações de esquerda convirjam para se defender. Sempre
disposta a comentar sobre a situação política dos países onde tem
integrantes, em maio a CSL se juntou aos gritos que pedem “Lula livre”,
emitindo um comunicado sobre o que considera a detenção “injusta e
ilegal” do ex-presidente. Na declaração, a entidade destaca Lula por
“nunca ter se dobrado aos interesses do neoliberalismo” e garante que a
“detenção arbitrária” estaria obedecendo à ideia de “deter o que ele
representa [...] uma grande esperança por um melhor devir para nosso
continente”. (Gazeta do Povo).
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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