Obra
“Para revolucionar o amor: a crise do amor romântico e poder da amizade
entre as mulheres” vai a pensadores antigos e atuais para demonstrar
como a sociedade se estrutura para manter as mulheres submissas e
infelizes
“Este
livro não é um documento acadêmico, é o olhar de uma mulher em meio à
sua própria jornada que se confunde com as de outras mulheres. É uma
mistura de relatos pessoais e históricos, de devaneios e desabafos junto
a manifestos e lufadas de esperança por um outro modo de viver”
Trecho do livro
O livro de estreia da psicanalista, socióloga, documentarista e apresentadora Ingrid Gerolimich “ “Para revolucionar o amor: a crise do amor romântico e poder da amizade entre as mulheres” (editora Claraboia, 139 pág.), vocaliza
uma série de inquietações colecionadas ao longo da vida das mulheres,
em especial nas relações conjugais. A obra é uma versão estendida de um
artigo publicado na revista TPM que questionava justamente as
frustrações e pressões que permeiam a vivência feminina. Para entender
esses sentimentos, a autora busca em filósofos, pesquisadores e
estudiosos antigos e contemporâneos a gênese desse mal-estar e possíveis
caminhos para subvertê-lo. Um spoiler: a jornada precisará ser
coletiva.
A
obra também virou curso (“Por uma revolução afetiva: A crise do amor
romântico e o poder da amizade feminina”) na Casa do Saber, previsto
para outubro deste ano. Com um total de seis aulas, a proposta é
explorar criticamente as construções sociais do amor romântico e seu
impacto nas subjetividades femininas, propondo a amizade entre mulheres
como uma prática revolucionária de resistência e transformação social. O
curso combina perspectivas psicanalíticas, sociológicas e filosóficas
para reimaginar as relações afetivas e pensar coletivamente maneiras de
descolonizar o amor e o próprio inconsciente feminino.
Para revolucionar o amor
O
livro de Ingrid Gerolimich é dividido em três partes: “Mas, afinal, o
que é a mulher?”, “Eros em crise existencial” e” A amizade feminina é a
revolução”. Na publicação, Ingrid argumenta como foi construída a
sujeição das mulheres ao longo da história por meio de uma narrativa que
rebaixa as capacidades intelectuais, sociais e emocionais delas e
centraliza sua vivência nos deveres reprodutivo e familiar. Tese
difundida por figuras que foram basilares na construção da sociedade
ocidental, como filósofos e psicanalistas.
Nesse
contexto, o amor romântico serve para domesticar as ambições femininas.
“Acreditamos por muito tempo que este tipo de amor é para nós uma
vocação e um destino inquestionável, e, que a impossibilidade de o viver
significaria uma vida menos vivida, pior, uma existência fracassada”,
argumenta Ingrid.
Por
exemplo, em uma das passagens da obra, ela cita uma pesquisadora
norte-americana que estudou o adoecimento emocional das mulheres durante
uma relação amorosa heterossexual. A pesquisa revelou que o homem, que
no início do namoro é encantador e atencioso, transforma-se com o passar
do tempo em desinteressado e indiferente. A sociedade atribui à mulher o
esforço de consertar o relacionamento, sendo que muitas vezes o
comportamento masculino é engendrado a partir de um dispositivo
inconsciente de controle. Ou seja, o resultado desse empenho feminino é
nulo, somando-se a ele frustração e ressentimento.
A
escritora defende que sua cruzada, assim como de muitas estudiosas que
ela traz para o livro como bell hooks, Hannah Arendt, Audre Lorde e
Alexandra Kollontai, não é contra o amor e/ou o romantismo, e sim,
contra aquilo que se estabeleceu socialmente como normal e asfixia a
pulsão vital do sexo feminino. Para amar, argumenta, é necessário
compromisso, envolvimento, cuidado e respeito. “O amor não subjuga, ele
liberta, mas para isso é preciso ser exercido enquanto uma ética,
solidária, democrática e coletiva, e, não como instrumento discursivo
para auxiliar na manutenção do poder patriarcal”, defende a autora.
O
livro sugere que as amizades sejam a força propulsora que desloque o
amor romântico do protagonismo que hoje ostenta, oferecendo uma reflexão
ainda mais profunda sobre a questão. Para a autora, a amizade entre
mulheres desafia as normas de gênero estabelecidas, que insistem em
romantizar a dependência emocional e a submissão feminina. “Em vez de
buscar a validação e a completude através de parceiros românticos, as
mulheres podem encontrar em suas amizades um espaço de troca e
libertação das amarras que as impedem de ir além”, analisa.
Multi talentos a serviço da reflexão e luta das mulheres
Ingrid
Gerolimich nasceu e cresceu em Anchieta, bairro da zona norte do Rio de
Janeiro, capital fluminense. Atualmente mora em Copacabana. É graduada
em Ciências Sociais pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ),
mestre em Políticas Públicas pela Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ) e também tem formação em Psicanálise pela Sociedade
Psicanalítica Iraci Doyle.
Para
o leitor mais atento o nome de Ingrid pode remeter às suas recentes
incursões midiáticas. Em 2023, ela esteve à frente do “Brasil no Divã”,
uma série de entrevistas no canal da Carta Capital no YouTube. A
iniciativa propunha analisar e refletir sobre as principais questões
humanas da contemporaneidade. O programa, que contou com 30 episódios e
tem ao todo mais de 325 mil visualizações, reuniu nomes como Frei Betto,
Mario Sergio Cortella e Márcia Tiburi.
Ingrid
também imprimiu sua sensibilidade e inteligência na autoria de dois
filmes. Em 2020 lançou o curta-metragem “Revolução dos Afetos”, que fala
sobre solidão na contemporaneidade. Dois anos depois, criou e dirigiu o
documentário “Explante”, que acompanha sua própria trajetória na
retirada das próteses de silicone e levanta o debate sobre a pressão
estética na saúde física e mental das mulheres. O filme estreou no dia 8
de março de 2022 e ganhou repercussão na mídia pela relevância do
tema.
A
carioca ainda atuou como comentarista de assuntos relacionados à
atualidade, contribuindo com artigos em veículos como UOL e revistas
Cult, Marie Claire, Carta Capital e TPM. Foi nesta última, inclusive,
que publicou suas primeiras reflexões acerca do amor romântico. O
convite para transformar o artigo da revista em livro partiu de Tainã
Bispo, da editora Claraboia. A autora admite ter ficado muito feliz com o
convite. “Esse livro faz parte do meu próprio percurso analítico, nele,
escrevo e dialogo com outras mulheres tanto quanto escrevo e dialogo
comigo”, enfatiza. Diz ainda que a obra é uma possibilidade de explorar
melhor este tema que considera não só importante, mas estratégico para
as lutas das mulheres.
Confira um trecho do livro (pág. 37) :
“"(...)
o fato é que a relação das mulheres com a natureza, a fertilidade e o
poder da criação, despertavam o medo dos homens diante de algo que lhes
parecia fora do controle mundano, que era a maneira com que elas se
relacionavam com os mistérios da mãe-terra. A “caça às bruxas”
representava então a batalha entre o masculino, que exerce o poder
através da dominação, e, o feminino, representando a força cósmica e
misteriosa da fertilidade e da criação, mas não foi bem isso que ficou
registrado nos anais da história.
A
demonização da mulher é um projeto que nasce com o patriarcado e segue
acontecendo de diferentes maneiras ao longo de todos os anos que se
sucedem, gerando consequências psíquicas nas mais diferentes gerações de
mulheres que nascem a partir daí"
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https://www.lojadaclara.com.br/
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