Diretor executivo do IPAM sugere que restrição na demarcação de terras indígenas deve intensificar judicialização de casos em vez de encerrar debate O entendimento de que adotar
um marco temporal das terras indígenas ‘pacificaria’ o debate no país é
contestado por André Guimarães, diretor executivo do IPAM (Instituto de
Pesquisa Ambiental da Amazônia), em posição divulgada nesta
segunda-feira (5). Para Guimarães, a instituição da medida teria efeito
oposto ao esperado por campos favoráveis ao marco temporal, e aumentaria
ainda mais a judicialização dos casos. O comentário se insere no
contexto de início das atividades da comissão de conciliação sobre o
marco, determinada pelo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal)
Gilmar Mendes. “A alegação de que a restrição à criação de
terras indígenas 'pacifica' o campo não é verdadeira. Na realidade, o
atrito entre o Supremo Tribunal Federal e o Congresso Nacional evidencia
que haverá mais, e não menos, judicialização do debate. Portanto, o
marco temporal cria ainda mais insegurança jurídica no campo, tanto para
agricultores como para indígenas", diz. A comissão foi
aberta por Mendes depois de o magistrado ter sido sorteado como relator
de uma ação pelo cumprimento da lei 14.701, votada no Congresso e
promulgada em dezembro passado para a validação do marco temporal das
terras indígenas. O STF havia julgado a tese inconstitucional em
setembro de 2023. “Terras indígenas são os lugares em que a
natureza é mais conservada no Brasil, mas estão cada vez mais ameaçadas
pelo fogo e desmatamento, além do garimpo ilegal. Nós precisamos das
terras indígenas protegidas para termos chance ao nosso futuro e para
conseguir, inclusive, continuar produzindo alimentos em um clima
equilibrado. Da mesma forma, precisamos manter nossa capacidade de
produção agropecuária, o que demanda segurança jurídica, entre outros
meios, para que sigamos sendo líderes globais de produção nesse setor.
Não é o marco temporal que nos propiciará tais garantias para seguirmos
sendo campeões da conservação e da produção agropecuária”, acrescenta
Guimarães. Um estudo divulgado pelo IPAM em setembro de 2023 mostrou que a
fragilização do direito constitucional dos povos indígenas às suas
terras colocaria em risco até 55 milhões de hectares de vegetação nativa, causando a emissão de até 18,7 bilhões de toneladas de carbono – o equivalente a 14 anos de emissões brasileiras, conforme o SEEG (Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases do Efeito Estufa). Atividades
predatórias no entorno e até mesmo dentro de terras indígenas colocam
em risco a vida das pessoas e da biodiversidade. De 2022 para 2023, a área queimada em terras indígenas na Amazônia teve um aumento de 73%,
indicou uma nota técnica publicada pelo IPAM em junho de 2024. Entre as
explicações para o número está a seca extrema no bioma, intensificada
pelas mudanças climáticas, combinada com a ignição humana do fogo, que
acaba perdendo o controle e se tornando um incêndio na floresta. O desmatamento nesses territórios já havia subido 153% no triênio 2019-2021
em comparação com os três anos anteriores, como mostrou outra nota
técnica publicada pela instituição em fevereiro de 2022, fator que
agrava a perda de umidade e multiplica a degradação que deixa a floresta
mais frágil ao alastramento de chamas. “Ar-condicionado”
do Brasil, as terras indígenas, com biodiversidade protegida por seus
povos, têm a capacidade de refrescar a temperatura média local em até
5°C. Ainda, com 80 mil pontos de garimpo, a Amazônia brasileira viu a mineração crescer em 361% dentro de terras indígenas de 2016 a 2022,
revelou um estudo de abril de 2024. Cerca de 122 territórios no bioma
estão localizados em bacias hidrográficas impactadas pelo garimpo. “Continuar defendendo o marco temporal das terras indígenas é assinar a ruína da humanidade, porque sem os povos indígenas e os benefícios que colhemos de sua proteção à natureza, não há economia, não há política, nem vida possível”, conclui o diretor do IPAM. Informações para a imprensa Bibiana Alcântara Garrido, bibiana.garrido@ipam.org.br (61) 99624-7371 |
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