O
Brasil é signatário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que
assegura que todas as pessoas têm direitos à liberdade, vida, segurança e
integridade. O direito de fazer o aborto não pode ser negado nos casos
em que a gestação coloca em risco a vida, liberdade, segurança e
integridade corporal da mãe. No Brasil, a interrupção de gravidez é
permitida e garantida nos casos em que a gestação decorreu de estupro da
menina e da mulher, representa risco de vida para a mãe e também em
situações de bebês anencefálicos, sem estabelecer um tempo máximo de
gestação para o aborto.
O PL 1904/2024, em tramitação no
Congresso Nacional em caráter de urgência, equipara o aborto realizado
após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio simples, inclusive nos
casos previstos em lei de gravidez resultante de estupro, risco de vida
da gestante e feto anencefálico.
A ciência mostra que as
experiências vividas na infância e adolescência geram impacto
irreversível no desenvolvimento físico, emocional e social dos
indivíduos. Esse projeto é uma revitimização brutal das meninas
estupradas, mais uma vez negando a elas o direito à infância e à
adolescência digna e segura.
Também sabemos que a criminalização
do aborto força meninas e mulheres, especialmente as mais vulneráveis,
na maioria dos casos pobres, negras e indígenas, a recorrerem a formas
clandestinas e inseguras para interrupção da gravidez, colocando em
risco suas vidas e saúde. Estupro e gravidez, resultante desse ato
hediondo, deixam sequelas incuráveis em mulheres de qualquer idade,
razão pela qual todas, meninas e mulheres, estão protegidas pela lei
vigente.
Esse PL ignora deliberadamente pesquisas e evidências
científicas, falseando a criminalização como política pública eficiente
para evitar a maternidade indesejada. Além disso, o projeto perpetua a
desigualdade e a marginalização de meninas e mulheres vulneráveis ao
desmantelar mecanismos de proteção e expor este grupo a ainda mais
riscos.
A Academia Brasileira de Ciências (ABC) se junta a outras
entidades conclamando o Congresso Nacional pelo arquivamento desse PL
que, de acordo com o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, é
inconstitucional. E, no lugar, que parlamentares se unam a
especialistas para implementar políticas públicas que garantam o direito
das meninas e mulheres à saúde sexual e reprodutiva, promovam uma
educação sexual abrangente e efetivamente combatam a violência contra a
mulher.
Rio de Janeiro, 18 de junho de 2024
Helena B. Nader
Presidente da Academia Brasileira de Ciências
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