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A ideia de países-irmãos é frequentemente menos fraternal do que desconfiada ou sem peso! É isso que António Costa arrisca que Lula lhe faça no parlamento: defender a Rússia contra a América! Manuel Villaverde Cabral para o Observador:
Assuntos
não faltam, desde o caso do meu colega Boaventura Sousa Santos à crise
cada vez mais profunda provocada pela desorientação do actual governo
socialista. É urgente, todavia, alertar o Primeiro-Ministro, caso ainda
atenda à voz do público, para aquilo que se prepara em Lisboa no caso de
o recém-reeleito presidente do Brasil vir «botar sentença» acerca da
guerra da Rússia contra a Ucrânia e dos apoiantes activos desta última
através da NATO.
Neste momento, Lula já deu, através do seu ministro dos Negócios Estrangeiros, o prometido apoio do Brasil à causa russa
e isso será retomado em breve em Brasília com a presença do presidente
brasileiro e Sergei Lavrov, ministro dos Negócios Estrangeiros da
Rússia, o qual continua a funcionar, interna e externamente, como no
tempo da antiga URSS. Ora, a vinda do recém-reeleito presidente
brasileiro a Portugal não tem nada que ver com a guerra da Rússia contra
a Ucrânia, mas sim com a comemoração do 25 de Abril na Assembleia da
República Portuguesa.
Quem
conhece a laboriosa construção do chamado Partido dos Trabalhadores
(PT) brasileiro a partir dos sindicados da enorme região industrial de
S. Paulo, onde Lula conquistou o seu lugar político – primeiro como
líder sindical, depois como fundador do PT – sabe que se trata de uma organização na linha do corporativismo sindical da era Vargas criada no início de 1980.
Finalmente,
Lula foi eleito presidente da República brasileira durante 8 anos
(2004-2011), seguidos pela entrega do poder a Dilma Roussef a partir de
2012, mas esta foi exonerada em meados de 2016, tendo o Presidente do
Congresso, Michel Temer, presidido ao Brasil até 2018, quando
inopinadamente foi eleito Jair Bolsonaro, o qual exerceu a presidência
até 2022. Mas Lula foi reeleito resvés, estando de novo na presidência…
Acontece,
porém, que Lula não deixa de partilhar um nacional-populismo paralelo
ao de Bolsonaro, convergindo ambos em favor da Rússia perante a guerra
contra a Ucrânia. É neste ponto que convém chamar à actualidade a adesão
de Lula não só aos patentes interesses bélicos de Putin, como ao rápido
relançamento da anterior convergência político-económica dos chamados
BRICS, alegadamente deserdados pela Europa, a América do Norte e os
«capitalistas» do Pacífico, desde o Japão e a Coreia do Sul à Austrália e
à Nova-Zelândia.
Não
é à toa que Lula invoca de novo os membros da sigla BRICS, a saber, o
Brasil, a Rússia, a Índia, a China e o S de ‘South Africa’. Das duas,
três: ou Lula há muito tempo que está desligado da pretensa política de
apoio mútuo dos chamados BRICS, que ele tem visitado recentemente; ou os
ditos BRICS estão mais unidos do que antes graças ao desencadeamento da
guerra contra a Ucrânia e temos de estar prevenidos, mas não por Lula;
ou é o presidente brasileiro quem está mal informado acerca desses BRICS
dos quais já não ouvíamos falar e nada se sabe!
Seja
como for, Portugal está e estará, quer o primeiro-ministro e o
Presidente da República queiram ou não, completamente manietado pelos
triliões de euros despejados sobre nós pela União Europeia sem
contrapartida que se veja da nossa parte e, pior, sem incitação às
profundas reformas que o país teria de fazer e fez em parte antes de o
PS entrar no «euro» sem pedir licença a ninguém.
É
estulto, pois, pensar nisso tudo enquanto Portugal não for posto à
prova durante a prolongação da guerra. E obviamente que não é Lula quem
virá arrastar-nos para os BRICS… Se é disso que ele vem falar ao
parlamento da República na celebração do dia em que as Forças Armadas
puseram fim à guerra colonial e abriram caminho a um Estado
demo-liberal, hoje bastante abalado pelas permanentes manobras
politiqueiras do PS.
Finalmente,
a manifesta falta de oportunidade da vinda de Lula às comemorações
parlamentares de 25 de Abril estaria à vista se as autoridades
portuguesas tivessem os olhos abertos para as políticas efectivas do PT
enquanto duraram – e as do Bolsonaro eram as mesmas se não piores.
Ver-se-ia então como os governos e o grande patronato brasileiro pouco
ou nada têm que ver connosco, sobretudo em «tempo de guerra» como o
actual.
Com
efeito, no tempo da dominação do PT, as atitudes e comportamentos dos
governos brasileiros em relação a Portugal mostraram o nosso pouquíssimo
peso político no auge dos governos de Lula e Dilma, ficando as relações
reduzidas à retórica linguística. Ao mesmo tempo, os serviços de
informação governamentais, alheios à diplomacia formal, manifestavam não
só um ínfimo interesse em Portugal como sustentavam a comunicação com
os movimentos de extrema-esquerda e os governos pós-soviéticos! Numa
palavra, a ideia de países-irmãos é frequentemente menos fraternal do
que desconfiada ou sem peso! É isso que António Costa arrisca que Lula
lhe faça no parlamento: defender a Rússia contra a América!
Postado há 1 week ago por Orlando Tambosi
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