terça-feira, 28 de fevereiro de 2023

Associações latino-americanas de dor pedem a priorização do tratamento da dor crônica e o reconhecimento dela como doença

 

Associações latino-americanas de dor pedem a priorização do tratamento da dor crônica e o reconhecimento dela como doença

No Brasil, pacientes com dor crônica terão que esperar pelo menos mais dois anos para que sua condição seja considerada de fato uma doença pelos órgãos oficiais

Representantes de 14 associações de dor na América Latina assinaram a Declaração de Lima sobre Dor Crônica,(1) com objetivo de gerar conscientização sobre sua classificação como uma doença em si(2) e o grave problema de saúde pública que representa na região. Segundo estimativas da Federação Latino-Americana de Associações para o Estudo da Dor (FEDELAT), a dor crônica afeta entre 27% e 42% dos latino-americanos.(3) No Brasil, segundo dados da Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor (SBED), pelo menos 37% dos brasileiros sofrem com dor crônica.(4)

Os especialistas signatários ressaltaram que os diversos contextos e deficiências do setor de saúde enfrentados pelos países latino-americanos dificultam a aplicação dos parâmetros estabelecidos na nova revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-11).

"O número insuficiente de unidades de tratamento da dor e profissionais de saúde treinados, bem como a falta de recursos alocados para programas de educação médica, são as principais barreiras que impedem o tratamento adequado da dor crônica. Isso é agravado pela pouca conscientização que existe sobre a dor crônica como uma doença e seu impacto na vida das pessoas”, diz o Dr. Marco Narváez, presidente da FEDELAT.(5)

Levando esses obstáculos em consideração, a declaração busca colocar em pauta iniciativas que contribuam para a formulação de soluções sustentáveis ​​e reitera a importância da participação articulada de governos, associações médicas, instituições de ensino e setor privado "para criar as condições ideais para avaliação, diagnóstico e tratamento adequados desta doença na América Latina”, acrescenta Narváez.(5)

Entre as propostas, se destacam:

  • Implementar a CID-11 o quanto antes, adaptando e integrando seus conceitos à realidade particular da América Latina, especialmente na atenção primária, principal ponto de partida das consultas para dor crônica na maioria dos casos em nível regional.
  • Incentivar a formação integral e capacitação de um maior número de especialistas em dor (médicos e outros profissionais de saúde), bem como o desenvolvimento de unidades de dor, que garantam uma abordagem personalizada e multidisciplinar da doença.
  • Promover e aprimorar relatórios de pesquisas clínicas que servirão de base para o desenvolvimento de estratégias e políticas públicas que possibilitem o manejo adequado do problema.
  • Alocar recursos, por parte dos governos, para financiar pesquisas sobre dor crônica e garantir que os pacientes tenham acesso aos melhores tratamentos possíveis.

Os pontos que requerem atenção urgente, contidos na declaração, são produto do trabalho contínuo das associações latino-americanas de dor que, reunidas em Lima, estabeleceram uma rota de atenção para este problema de saúde pública.

A realidade específica do Brasil é similar à dos demais países latino-americanos, de acordo com o Dr. Durval Kraychete, professor e coordenador do Ambulatório de Dor da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e co-editor do Brazilian Journal of Anesthesiology. O especialista conta que as políticas públicas e o investimento em educação continuada em torno do tema da dor são escassas, mas que as diversas sociedades e instituições regionais com foco na dor, como a SBED, têm incentivado a abordagem e tratamento adequado das dores aguda e crônica, cujos impactos econômicos, físicos e psíquicos provocam consequências graves à sociedade.

“Há um grande índice de afastamento do trabalho por conta da dor crônica, uma sobrecarga nos serviços de reabilitação e o índice de suicídio entre esses pacientes não é baixo. Seguindo as determinações da Declaração de Lima, podemos proporcionar a essas pessoas uma melhora psíquica e funcional, a depender de um diagnóstico correto e oportuno, além de um tratamento adequado, multimodal e personalizado feito preferencialmente de maneira precoce. A luta é árdua, e a sensibilização de governos e autoridades é urgente. Porém, com a Declaração de Lima, ao menos já temos um mapa que mostra e sintetiza o caminho para melhorarmos a situação no Brasil e em toda a América Latina”, ele conclui.

Apesar da CID-11 ter entrado em vigor em janeiro de 2022, o Ministério da Saúde iniciou o processo de tradução e validação do documento por especialistas no mesmo ano, tendo estipulado dezembro de 2022 como a previsão de conclusão dessa etapa. No entanto, ainda existe um período de transição da classificação anterior para a atual, que, seguindo a estimativa da Organização Mundial de Saúde (OMS), deve ocorrer entre dois e três anos. Assim, espera-se que a CID-11 esteja em uso nos sistemas de informação da vigilância em definitivo apenas a partir de 1º de janeiro de 2025.(6) “Isso significa que os pacientes com dor crónica do Brasil terão que esperar pelo menos mais dois anos para que sua condição seja considerada de fato uma doença pelos órgãos oficiais”, alerta o Dr. Kraychete.

Referências

(1) Declaração conjunta assinada pelos representantes das associações latino-americanas de dor durante o Primeiro Consenso de Dor, no âmbito do XIV Congresso Latino-Americano de Dor.

(2) Definição de dor crônica incluída na CID-11. Disponível em: https://icd.who.int/browse11/l-m/es#/http://id.who.int/icd/entity/1581976053 

(3) Estimativa feita pela Federação Latino-Americana de Associações de Estudos da Dor (FEDELAT) com base na incidência global refletida em: Pain as a Global Public Health Priority (2011).Disponível em: https://bmcpublichealth.biomedcentral.com/articles/10.1186/1471-2458-11-770

(4) Dor crônica afeta pelo menos 37% dos brasileiros. 2018. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2018-09/dor-cronica-afeta-pelo-menos-37-dos-brasileiros

(5) Entrevista com o Dr. Marco Narváez, presidente da Federação Latino-Americana de Associações para o Estudo da Dor (FEDELAT) durante o Consenso Latino-Americano sobre Dor em 21/08/2022.

(6) Ministério da Saúde coordena tradução do novo Código Internacional de Doenças para a língua portuguesa. 2022. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2022/julho/ministerio-da-saude-coordena-traducao-do-novo-codigo-internacional-de-doencas-para-a-lingua-portuguesa.

M-N/A-BR-02-23-0028 – MATERIAL DESTINADO A IMPRENSA – APROVADO EM FEVEREIRO/2022

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