BLOG ORLANDO TAMBOSI
Até na tranquila Noruega as cabeças coroadas enfrentam problemas pelos motivos de sempre: amor, ambição, traição e outros dramas irresistíveis. Vilma Gryzinski:
Estressou-se
com a política? Não aguenta ver as caras de sempre dizendo as coisas de
sempre? Conceda-se um tempo para relaxar e ver como a vida não está
fácil para ninguém, nem para os mais privilegiados.
O
rei Charles III quase levou ovada – também metaforicamente, com a
estréia da nova temporada de The Crown, com a habitual mistura de ficção
e fatos (dentre estes, o episódio controvertido até hoje, de sua versão
de conversa sexy, quando diz que gostaria de reencarnar como o tampão
menstrual de Camilla).
O
rei aposentado da Espanha, Juan Carlos, continua a causar problemas
para o filho, Felipe. Atualmente, por causa do processo por assédio
moral movido na justiça britânica contra ele pela antiga amante, Corinna
Larsen, alemã de origem dinamarquesa com a qual Juan Carlos pensou em
se casar, no auge da paixão. Embora ele mantivesse um casamento de
fachada com a rainha Sofia e incontáveis relacionamentos fugazes,
Corinna abalou a monarquia espanhola.
Juan
Carlos confiava tanto na amante que depositou 65 milhões de euros, de
origem nada límpida, numa conta dela na Suíça. Era o dinheiro da
aposentadoria. Depois da ruptura, quis os milhões de volta. Ah, tolinho…
Mas
a grande intriga do momento envolve a filha dos reis da Noruega,
princesa Martha Louise, que perdeu o direito de representar a família
real. Pode continuar a usar o título de princesa no Instagram e mais
nada.
O
rebaixamento aconteceu porque ela e o noivo, o “xamã bissexual” Durek
Verrett, um americano que vende serviços espirituais, não quiseram fazer
um acordo que preservasse a reputação ilibada da monarquia. É claro que
Verrett atribuiu tudo à má vontade da família real em ter um integrante
negro.
Num
desabafo raro, a mãe da princesa, rainha Sonja, disse que os americanos
“não fazem ideia do que é um reino”. Por isso, o noivo da filha não
compreendeu que não poderia conciliar interesses comerciais (entre eles,
vender um amuleto que elimina da vagina as “impressões” de relações
sexuais anteriores) e as obrigações da família real.
A
rainha elogiou o futuro genro e disse que a família está unida. Martha
Louise tem 51 anos e se declarava vidente antes mesmo de conhecer o xamã
americano que a enfeitiçou, embora a imprensa norueguesa o tenha
retratado como um charlatão que chegou a dizer que o câncer é uma
“escolha”.
Esse
é o caso de maior repercussão a envolver a discretíssima família real
norueguesa desde que o príncipe herdeiro Haakon se casou com
Mette-Marit, então uma jovem mãe solteira de um filho com um traficante
de drogas.
Outra
família real nórdica, a da Dinamarca, passou por uma crise depois que a
rainha Margrethe decidiu sozinha que os netos nascidos dos dois
casamentos do “estepe”, o segundo filho, príncipe Joachim, não teriam
mais o tratamento de Alteza Real nem o título de príncipes. Joachim
perdeu a classe, dizendo que os filhos haviam ficado magoados e
aturdidos.
O
caso reavivou o interesse pelo futuro próximo dos dois filhos de Harry e
Meghan. Como o avô deles agora é rei, eles teriam direito a ser
chamados de príncipe Archie e princesa Lilibeth, mas isso depende de
Charles. A hipótese parece ficar cada vez mais distante à medida em que
se aproxima o lançamento da autobiografia de Harry.
O que o príncipe poderá dizer de pior do que já é conhecido em público e agora ganha nova vida por causa da série da Netflix?
Um
Charles que despreza a esposa e venera a amante já é fato histórico. O
intrigante que tenta tramar contra a própria mãe? Foi uma liberdade
criativa veementemente desmentida pelos dois ex-primeiros-ministros
envolvidos, John Major e Tony Blair.
Mas
Harry tem a visão única de quem estava do lado de dentro da família e
viu o pai planejar durante anos uma campanha para que Camilla fosse
aceita. Tem também sede de vingança: acha que foi passado para trás,
mesmo que tenha sido dele e da mulher a decisão de cair fora da família
real britânica.
Ontem,
durante uma visita a York, o novo rei e Camilla quase foram atingidos
por ovos jogados por um ambientalista fanático – uma ironia, visto que
Charles foi um precursor dos temas ambientais e é criticado, à direita,
por sair dos estritos limites de expressão política onde o monarca pode
se movimentar.
Charles quer sair deles, mas tem plena consciência de que preservar a monarquia é o interesse supremo da instituição.
Num
flashback chocante pelo realismo, The Crown mostra a execução da
família imperial russa, fuzilada no porão da casa onde estava presa, por
ordem de Lênin, depois da revolução de 1917. A conselho da mulher, a
rainha Mary, o rei George V, bisavô de Charles, nega o pedido de ajuda
feito pelo primo russo. O asilo ao czar e sua família, em plena I Guerra
Mundial, com a opinião pública voltada contra a Alemanha – que ainda
era a origem da casa real britânica – e sem simpatias por um autocrata
estrangeiro, poderia colocar em risco a monarquia.
É
inconcebível que os bolcheviques deixassem a família imperial sair viva
da Rússia, mas a decisão de George V mostrou que o instinto de
sobrevivência sempre fala mais alto entre as famílias reais. O xamã
americano que vai se casar com a princesa norueguesa deveria saber
disso. E nem precisa conhecer métodos divinatórios.
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