quinta-feira, 29 de setembro de 2022

Lula e o cristianismo

 



Lula intensifica sua retórica de enquadramento dos cristãos (católicos e evangélicos), deixando muito claro que, num eventual terceiro mandato, só serão tidos por legítimos os cristãos que se comportarem de acordo com a etiqueta política do lulopetismo. Flavio Gordon para a Gazeta do Povo:


“O comunismo é de fato materialista e anticristão; embora declarem às vezes em palavras que não atacam a religião, os comunistas demonstram de fato, quer pela doutrina, quer pelas ações, que são hostis a Deus, à verdadeira religião e à Igreja de Cristo.” (Papa Pio XII, Decreto contra o Comunismo, 1.º de julho de 1949)

“Foi perguntado à Suprema Sagrada Congregação se é permitido aos cidadãos católicos, ao elegerem os representantes do povo, darem o seu voto a partidos ou a candidatos que, mesmo se não proclamam princípios contrários à doutrina católica e até reivindicam o nome de cristãos, apesar disto se unem de fato aos comunistas e os apoiam por sua ação. Os Eminentíssimos e Reverendíssimos Padres, responsáveis pela proteção da fé e da moral, responderam decretando: Não, segundo a diretiva do decreto do Santo Ofício de 1.º de julho de 1949.” (Papa João XXIII, Dubium, 25 de março de 1959)

É preciso jamais esquecer aquela cena marcante ocorrida em 2 de março de 1983, e registrada em vídeo, quando o papa João Paulo II, de dedo em riste, admoestou severamente o padre Ernesto Cardenal. O local do passa-moleque papal foi o aeroporto de Manágua, capital da Nicarágua. Cardenal, militante da Teologia da Libertação, ocupava então o cargo de ministro da Cultura do regime sandinista. A junta governamental que fora receber o pontífice contava também com a presença de Daniel Ortega, atual ditador da Nicarágua.

No pequeno país caribenho, João Paulo II oficiou uma missa. Durante a homilia, bandos de sandinistas gritaram palavras de ordem em favor da revolução comunista, incluindo a afirmação de que “entre o cristianismo e a revolução não há contradição”. Enfurecido com a algazarra política, a toda hora o papa pedia silêncio. Um trecho da homilia serviu de recado direto: “De fato, uma Igreja dividida, como já dizia na minha carta aos vossos bispos, não poderá cumprir a sua missão (...) Por isso, eu alertava sobre ‘o absurdo e perigoso que é imaginar-se como ao lado da – para não dizer contra a – Igreja construída ao redor do bispo, outra Igreja concebida só como ‘carismática’ e não institucional, ‘nova’ e não tradicional, alternativa e, como se preconiza ultimamente, uma ‘Igreja popular’. Quero hoje reafirmar estas palavras, aqui diante de vós. A Igreja deve manter-se unida para poder opor-se às diversas formas, diretas ou indiretas, de materialismo que a sua missão encontra no mundo”. A certa altura, o Santo Padre improvisou: “Cuidado com os falsos profetas. Eles se apresentam em pele de cordeiro, mas por dentro são lobos ferozes”. Tão logo os sandinistas terminaram de entoar o seu hino revolucionário, João Paulo II foi levado de volta ao aeroporto.

Quase 40 anos depois do evento, materializa-se na Nicarágua o temor do papa: uma Igreja dividida, enfraquecida e cismática. A parte infiltrada pela heresia da Teologia da Libertação imiscuiu-se definitivamente na ditadura socialista, servindo-lhe de chanceladora “espiritual”. Já a parte que, resistindo ao aparelhamento, permaneceu fiel ao magistério da Igreja sofre hoje uma perseguição cada vez mais implacável nas mãos de Ortega e correligionários. E isso deveria, sim, servir de alerta ao Brasil, sobretudo quando o candidato Luiz Inácio Lula da Silva – velho aliado do ditador nicaraguense, e ademais simpatizante declarado das estratégias revolucionárias chilena e boliviana (que incluíram ondas de ataques a igrejas) – intensifica sua retórica de enquadramento dos cristãos (católicos e evangélicos), deixando muito claro que, num eventual terceiro mandato, só serão tidos por legítimos os cristãos que se comportarem de acordo com a etiqueta política do lulopetismo. Num contexto em que, partidário de Lula e autoproclamado “iluminista” (talvez simpático, portanto, à proposta voltaireana de “Écrasez l’Infâme”), um ministro do STF restitui o mandato de um vereador cassado por invadir uma igreja e violar com slogans revolucionários um espaço de culto, esse discurso em prol de uma igreja “companheira” deveria preocupar todos os cristãos.

Buscando desfazer essa preocupação, que vem sendo obviamente explorada pela campanha de Jair Bolsonaro, Lula recorre àquilo que socialistas ateus (como Marcelo Freixo e Manuela D’Ávila, por exemplo) costumam fazer em período eleitoral: a famosa (e canastrona) pose de santinho do pau oco. No caso do ex-presidiário, todo o intelectual coletivo formado pela imprensa amestrada, artistas, marqueteiros e influenciadores petistas corre para requentar velhas mentiras. A primeira é a de que Lula é pessoalmente um homem de fé, um católico. A segunda é a de que o próprio PT surgiu da Igreja Católica.

Quanto à primeira mentira, convém lembrar um episódio envolvendo justamente o personagem com que iniciamos o artigo, o papa João Paulo II. Lula era o presidente da República do Brasil quando o Santo Padre polonês faleceu, no dia 2 de abril de 2005. Na missa de funeral do memorável pontífice, o petista comungou sem antes haver se confessado. Até aí, nada de extraordinário. Muito embora seja um pecado mortal, segundo o Catecismo da Igreja Católica (n. 1415), a comunhão sem confissão é, infelizmente, prática comum entre católicos de todo o mundo. Ocorre que, não contente em pecar, na época o petista autoproclamado católico resolveu exibir orgulhosamente o próprio pecado, escarnecendo da doutrina. Questionado sobre sua atitude, declarou cinicamente ser “um homem sem pecado”, algo que nem mesmo o mais desleixado dos católicos faria. Não surpreende que, tempos depois, o mesmo sujeito afirmasse haver sido mais açoitado do que o próprio Nosso Senhor Jesus Cristo.

Já em relação à segunda mentira, é preciso esclarecer que o PT definitivamente não surgiu da Igreja Católica. Assim como na Nicarágua, sua origem também está ligada à heresia da Teologia da Libertação, que, segundo a definição de um dos seus expoentes brasileiros, o “frei” Leonardo Boff, “não é teologia dentro do marxismo, mas marxismo dentro da teologia”. Ocorre que o magistério da Igreja afirma a total incompatibilidade entre o materialismo de origem marxista e a fé católica, e, nesse sentido, os “padres” da Teologia da Libertação são tão “católicos” quanto Marcelo Freixo, Manuela D’Ávila e Luiz Inácio Lula da Silva. A bem da verdade, como explica o padre (esse sim autêntico, sem aspas) Paulo Ricardo, da paróquia Cristo Rei (Cuiabá-MT), a adesão, a apologia ou o favorecimento ao comunismo são, segundo vários decretos da Igreja, motivo de excomunhão automática (latae sententiae).

Seguiremos daí no artigo da próxima semana, em que responderei ao pertinente questionamento que me foi feito nas redes sociais. O autor mostrou-se cético em relação à minha sugestão de que, seguindo o exemplo do que ocorre em vizinhos latino-americanos comandados por partidos socialistas, o Brasil corre, sim, o risco de, num eventual novo governo lulopetista, ver recrudescer a perseguição às igrejas cristãs.
 
BLOG  ORLANDO  TAMBOSI

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