quarta-feira, 31 de agosto de 2022

Quem perdeu o debate?

 


Fernão Lara Mesquita

 

Se o debate de domingo na Band serviu para alguma coisa além de embalar o seu sono foi para provar que Lula não resiste a um grama de contraditório. Ele só está nesta eleição porque ainda não tinha tido nem isso da imprensa nacional. E só acabou sendo chamado na cara exatamente daquilo que é domingo porque nem Alexandre de Moraes pode, por enquanto, prender e arrebentar por "fake news", "discurso de ódio" ou "ato antidemocrático" todos os outros candidatos a presidente fora Bolsonaro como acabará fatalmente fazendo se não for detido.

Resposta?

Nenhuma, pois não ha resposta possível para o que Lula é senão a que lhe deram os 9 unânimes juízes das três instâncias profissionais do sistema judiciário brasileiro que o monocrata Edson Fachin, guindado ao STF pela militância aguerrida que tinha no MST, revogou com uma única canetada expressamente inconstitucional.

Quem ainda hesita em aplicar a essa imprensa os qualificativos que ela pede pode basear-se ainda nas primeiras páginas e nas páginas editoriais de terça-feira, passados dois dias, em que se lê que cobrar Lula pelo "maior assalto de todos os tempos", na definição do Banco Mundial,  é "ataque pessoal", não havendo qualquer diferença digna de nota entre os 13 anos de saque à nação que o levaram à cadeia e a tentativa rejeitada de suborno que, segundo um obscuro cabo de uma guarda municipal, "teria havido" na compra que não aconteceu da vacina Covaxin.

Nada de novo, portanto, já que essa imprensa é aquela que jura de pés juntos que o que realmente ameaça a democracia brasileira é "o potencial de financiamento de atividades digitais ilícitas e incitação a atos antidemocráticos" do velhinho da Havan e outros "empresários bolsonaristas golpistas" noticiados por um site de internet mais obscuro ainda e não as prisões e as des-prisões ilegais, as violências inconstitucionais, a censura prévia, os bloqueios de contas de familiares de suspeitos, as prisões sem julgamento e a espionagem chinesa do WhatsApp de gente menos abastada mas igualmente protegida pela Constituição concretamente perpetradas por Alexandre de Moraes. É aquela imprensa, enfim que, olhando nos seus olhos com cara de séria, jura que a urna do monocrata Barroso "é inviolável" e que tudo que Lula deve ao Brasil são "desculpas" e "explicações" sobre o que fará para "deixar de ser" o que sempre foi...

Quanto ao mais, quanto aos demais candidatEs, homens e mulheres no corpo com que nasceram ou no que acham que têm lá dentro das suas cabeças feitas, o debate foi o que faz deles a bizantina legislação eleitoral que transforma a "democracia brasileira" na piada triste que é: um espetáculo de mau teatro "levado" por candidatos de si mesmos, por si mesmos e para si mesmos, produtos de "partidos políticos" estatais, propriedade intransferível de "líderes" sem liderados, com que o eleitorado brasileiro nada tem a ver nem antes, nem durante, nem depois de tiradas das cartolas as suas "candidaturas", ora fazendo-se de bravinhos e indignados, ora querendo ser engraçados.

Nenhum deles vê defeitos no sistema de (não) relacionamento entre o País Oficial e o País Real de que todos os problemas brasileiros decorrem e sem a solução do qual nenhum, por definição, poderá ser resolvido dentro de um contexto democrático. 

Decorre dessa falsificação do fundamento que define a democracia que todos juram querer macaquear que tudo se resuma a mais um debate de "eus" inteiramente apoiado no "quesejismo": "Eu quero um país que seja assim e assado e partidos e políticos que sejam isto ou aquilo" sem qualquer palavra que indique que suas excelências suspeitem que são diferentes tecnologias institucionais que determinam que tudo processado por elas "seja" inevitavelmente como é, e contemplem ainda que remotamente a ideia de montar um sistema que permita que o povo brasileiro, que sabe melhor que ninguém do que exatamente é que precisa, possa governar por si e para si como é da definição da verdadeira.

Pajelança pura, mas com a desvantagem de que os nossos modernos morubixabEs não acreditam nem por um segundo, como os dos bons tempos da Idade da Pedra, nos "passes" que estão dando.

*      Publicado originalmente em O Vespeiro, site do autor, que é jornalista.

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