quinta-feira, 30 de junho de 2022

Caso Piquet: o nosso "neguinho" não é o "nigger" deles. Nunca foi. Nem de longe.

 



O controle da linguagem, como sabemos, está na essência do movimento identitário. Que, além de ressentido e profundamente infeliz, é ignorante. Paulo Polzonoff via Gazeta do Povo:


Neguinho assistiu à entrevista do ex-corredor de F1 Nelson Piquet. Neguinho acompanhou as repercussões, sobretudo de Lewis Hamilton, que transformou a expressão em xingamento. Neguinho leu notas e mais notas de solidariedade a Hamilton. Neguinho até se compadeceu do cancelamento de Piquet – de quem não gosta nem nunca gostou. Aí neguinho abriu o computador e começou a escrever um texto sobre o assunto.

O controle da linguagem, como sabemos, está na essência do movimento identitário. Que, além de ressentido e profundamente infeliz, é ignorante. Já vimos isso no caso do verbo “denegrir” e no caso do simpático móvel chamado “criado-mudo” - que não deu um pio sobre o assunto. Sem freios que não uma consciência carcomida pela ideologia, contudo, o movimento racialista agora encontrou outra palavra para seu Index Prohibitorum: “neguinho”.

Não sei se são meus ouvidos angelicais, mas sempre ouvi “neguinho” como um termo carinhoso para se referir a alguém cujo nome na hora nos escapa. Já sei! É característica dos nossos diminutivos, comumente identificados até com a fala inocente das crianças (apud José Paulo Paes, Mário Quintana, etc). Pegue um leão, tão imponente e magnânimo que contém até aumentativo no nome, e o transforme num leãozinho para ver o que acontece.

“Neguinho” não tem nada, absolutamente nada, zero mesmo, – 273,15 °C a ver com a cor da pele. Na pior das hipóteses, “neguinho” é um pronome indefinido coloquial que pode ser usado até mesmo para fazer referências a racistas notórios como Che Guevara. “O negro indolente e sonhador gasta seu dinheirinho em qualquer frivolidade ou diversão”, disse neguinho. Ou “neguim”, em sua versão ainda mais indolente.

Tom e toada

Nessa toada, não vai demorar para os ativistas criminalizarem a palavra “nêga”, usada Brasil afora para se referir à mulher amada, independentemente da cor da pele. E não duvidarei nada se o movimento negro se unir às feministas para, juntos, criminalizarem o “minha nêga” – um clássico "possessivo" imortalizado em incontáveis músicas, de Paulinho da Viola e Adoniran Barbosa. Por falar em música, por favor, alguém corre para proteger “Preta Pretinha” antes que a música seja tirada das plataformas de streaming por pressão desses energúmenos.

Ah, Paulo, mas o problema é o tom com que Nelson Piquet fala o "neguinho" - argumenta alguém. Verdade, ainda que meia verdade. Porque o tom é um negócio assim meio esquivo. Incontrolável. O tom com que se ouve/lê uma palavra nem sempre tem a ver com o tom com que se diz/escreve. Dependendo do tom, palavras positivas como "gênio" podem se transformar em ofensa - sem jamais se tornarem crimes, muito menos de ódio. Pegue a afirmação "o Polzonoff é um gênio mesmo", por exemplo. É muito provável que eu a leia como elogio, mas você a tenha escrito/dito como ofensa.

Agora, a mágica: palavras e expressões negativas podem se transformar em demonstrações de afeto. Como bem me ensinou o professor Élio Antunes há longínquos 27 anos, você pode muito bem dizer a um amigo querido "vem cá, seu efedepê, me dá um abraço!". Ou então pode receber um merecido aumento, se virar para o chefe e dizer, sem medo de ser demitido por justa causa: “Patrão, eu te odeio! Muito obrigado”. Há alguns anos, aliás, teve um narrador repreendido por dizer que Lady Gaga era “ridícula”. Detalhe, “sua ridícula” era o bordão dele para jogadas maravilhosas no futebol americano.

Negrito

No caso específico do “neguinho” mencionado por Nelson Piquet, a reação do corredor/ativista Lewis Hamilton e de mais personalidades com vento na cabeça foi equiparar a palavra ao “nigger”, termo há muitos anos proscrito em inglês. Este é o problema de ser uma celebridade woke, milionária e estúpida: sempre tem um assessor mal-intencionado para soprar no ouvido de semideuses mentiras com ares de verdade que ela, a celebridade, propagará até alcançar ouvidos perturbadoramente férteis quando se trata de ideias daninhas.

“Neguinho” e “nigger” são como água e azeite. O primeiro, já disse, mas não custa repetir, tem um quê de carinhoso inerente ao diminutivo e não tem absolutamente nada nada nada nada nada (nada!) a ver com a cor da pele. “Neguinho” se aplica até a mim. E a índios e a pardos e a japoneses. “Aquele neguinho branquelo” não é, em português, uma contradição em termos. Já “nigger” traz em si uma carga muitíssimo pesada e específica do inglês norte-americano. Tanto que o termo é praticamente intraduzível, ainda que alguns possam optar por “criôlo” – dito e escrito assim com o “o” fechado e sem o “u” - ou o raramente usado "tição".

Veja que curioso: em vez de celebrarmos o fato de nossa língua não ter um termo pejorativo de uso amplo para se referir a uma raça específica, o movimento negro inventa uma falsa equivalência para ampliar o abismo da intolerância e, assim, promover sua causa. Falamos “neguinho” como também falamos “japa” – sem nenhum traço do ódio contido, por exemplo, na palavra inglesa “jap”. Olha só que maravilha!

E aqui vou escrever em negrito, antes que também proíbam a marca gráfica que nos ajuda a dar ênfase a alguma coisa: viver o pesadelo identitário, um pesadelo marcado por cenas de inveja, ressentimento, rancor histórico e uma infelicidade mais profunda do que a Fossa das Marianas, é uma questão de escolha. Que pode até ser lucrativa para os Hamiltons e Djamilas da vida, mas que provavelmente só trará prejuízos às pessoas comuns e normais. Por falar em normalidade, também já escrevi isso, mas não custa repetir: para sair do hospício, às vezes basta abrir a porta.
 
BLOG  ORLANDO  TAMBOSI

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