Cidadãos que sofrem os efeitos da invasão ou que, do outro lado, acompanham seu desenrolar oferecem uma janela para o que o povo está pensando. Vilma Gryzinski:
A
retirada russa, a reconquista de um cinturão de pequenas localidades em
torno de Kiev, a revelação de atrocidades hediondas e outros
acontecimentos da guerra na Ucrânia levam multidões de especialistas a
fazer análises políticas e militares que nos ajudam a compreender a
enorme complexidade das questões envolvidas.
Mas
sempre é bom acompanhar o que as pessoas comuns estão pensando,
convencidas pelas propaganda oficial, arredias a ela ou simplesmente
espantadas com o horror que testemunham.
A seguir, uma pequena amostra destas reações levantadas por diferentes órgãos de imprensa nas últimas semanas:
“Minha
cabeça não consegue entender como é possível esta guerra com tanques e
mísseis. Contra quem? Contra civis inocentes? É a barbárie em estado
puro”, Olena Volkova, diretora do hospital de Trotianets, um dos locais
desocupados pelas tropas russas, falando ao New York Times. Foram
encontradas na localidade vinte pessoas executadas antes da retirada.
“Esta
pessoa foi morta sob tortura. As mãos e as pernas dele estão amarradas
com fita adesiva, perdeu os dentes e seu rosto todo desapareceu. Não
sabemos o que queriam dele”, a mesma médica, apontando um corpo no
necrotério local.
“Eles
foram de apartamento em apartamento, pegando televisões e computadores e
colocando nos tanques para ir embora. Estavam com pressa”, Svetlana
Semenova, moradora de Bucha, outra localidade abandonada pelos russos,
ao Dnyuz.
“Todas
as pessoas levaram um tiro na nuca. Famílias inteiras foram mortas.
Crianças, mulheres, avós. Este é o resultado da ocupação russa”, Anatoli
Fedoruk, prefeito de Bucha, calculando em 280 o número de sepultados em
valas coletivas na localidade.
“Vodka
não”, soldado ucraniano anônimo em vídeo no qual moradores de um
vilarejo rural oferecem aos libertadores o pouco que tinham, incluindo a
bebida feita em casa.
“Eles
estão nos dizendo que a Ucrânia está tentando entrar para a Otan e que
isso vai acontecer mais cedo ou mais tarde; a Ucrânia então tentará
recuperar a Crimeia, os Estados Unidos irão apoiar e acabaremos lutando
contra eles. E todo mundo sabe que isso significaria: armas nucleares.
Para evitar esta guerra, é necessário varrer a Ucrânia da face da terra.
Melhor que morram cem mil do que acabe o mundo. É essencialmente o que
Putin está nos dizendo. Não consigo avaliar. Pertenço ao mundo da
cultura. Aprendi que toda vida tem valor incalculável”, Dimitri Likin,
que pediu demissão como diretor de arte do Canal Um, estatal onde
trabalhou durante vinte anos, ao site Meduza.
“As
pessoas não querem matar ou ser mortas. Não é isso que dizia seu
contrato de trabalho. Além do mais, eles não sabem operar mísseis
terra-ar e conduzir tanques”, Mlkhail Benyash, advogado que diz já ter
sido procurando por cerca de 200 membros da Guarda Nacional russa que
não querem ir para a guerra, ao Meduza.
“Estamos
nos virando. Ontem comemos Alabay”, conversa de um soldado russo com a
esposa, interceptada por ucranianos. Alabay é uma raça de cão pastor.
“Parei
de falar com o meu pai. Ele disse que sou um traidor e deveria ser o
primeiro a ser fuzilado”, Vladimir Miroshnik, estudante de ciências
políticas sobre a relação complicada com o pai por causa de sua oposição
à guerra, ao Moscow Times.
“Minha
família só acredita em fontes do governo. Quanto mais dura a
‘operação’, mais ficam radicalizados. Já acham normal a morte de civis e
desejam a morte das autoridades ucranianas. Parece os dois minutos de
ódio do livro 1984”, outro moscovita que falou ao site, anonimamente.
“Kirill
foi um guerreiro de Cristo. Ele lutou contra o mal, contra espíritos
satânicos: nazistas ucranianos criados pelas multinacionais americanas”,
Gennady Zaridze, padre ortodoxo, no enterro de um jovem soldado russo
morto na Ucrânia, também no Moscow News.
“Ele
morreu heroicamente não em guerra com a Ucrânia, não em guerra contra o
exército ucraniano, mas numa batalha do bem contra o mal. Fez tudo o
que foi possível para que o bem ganhasse”, Dmitri Maslov, na mesma
cerimônia fúnebre. Ele é líder distrital da região onde morreu o soldado
e ex-agente do FSB, o serviço de inteligência.
“Nós,
cristãos, não podemos ficar parados quando irmão mata irmão, cristão
mata cristão. Não repitamos os erros daqueles que louvaram Hitler em 1
de setembro de 1939”, Ioann Burdin, padre ortodoxo detido e processado
por criticar a guerra.
“Ai,
meu Deus, eu queria cuspir e bater neles”, Iedokia Koneva, moradora de
Trotianets, ao New York Times. depois da retirada russa.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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