sábado, 26 de fevereiro de 2022

Bolívar Lamounier examina 200 anos de política brasileira

 BLOG  ORLANDO  TAMBOSI



Sem uma nova Constituição e uma reforma política de gente grande, acho que não temos futuro. Com o “trânsito em julgado”, então, a corrupção terá um brilhante futuro. Bolívar Lamounier, em entrevista a Luciano Trigo, da Gazeta do Povo:


No livro “Da Independência a Lula e Bolsonaro – Dois séculos política brasileira”, o cientista político Bolívar Lamounier investiga episódios da nossa História política para tentar explicar de que forma as instituições democrático-representativas foram construídas e implantadas em nosso país – e como isso afetou a qualidade da nossa democracia. Do reexame da conjuntura do Império e do início do período republicano aos governos de Lula e Bolsonaro, o autor examina a evolução do Congresso, dos partidos políticos e das práticas eleitorais e faz uma revisão crítica da historiografia brasileira. Nesta entrevista, Bolívar fala sobre o seu livro e comenta o cenário político atual.

- O nosso passado colonial e imperial explica de alguma maneira a dificuldade para a consolidação de uma democracia plena e madura no Brasil? Se não é o nosso passado, qual é a causa dos percalços da nossa democracia?

BOLÍVAR LAMOUNIER: Esse é o mistério que tentei desvendar em meu livro “Da Independência a Lula e Bolsonaro”. Apesar da colonização portuguesa, da monocultura e da escravidão, fatores universalmente invocados, com razão, argumentei que não começamos mal. Ao contrário do que geralmente se afirma, a Constituição de 1824 fazia todo sentido como arcabouço para a transição de uma tirania absolutista ao Estado Constitucional.

É importante frisar que, na primeira metade do século 19, a democracia representativa engatinhava por todo parte, os Estados Unidos sendo uma exceção, mas a escravidão estava lá, tão ou mais cruel que aqui. A República foi um golpe militar, talvez inevitável, mas o pior foi ter desembocado em regimes de partido único em todos os Estados, um modelo imposto por Campos Salles, exceção feita ao Rio Grande do Sul, onde “gaviões” e “maragatos” se digladiavam.

Penso que esse ciclo aparentemente infindável de crises e retrocessos remonta à Revolução de 30 e à autotransformação de Getúlio Vargas de “Dr.Jekyll” em “Mr.Hyde”. Sua impensada guinada ditatorial, que só não foi mais longe porque tivemos que entrar na guerra ao lado dos Estados Unidos, deixou plantada a semente do antigetulismo e do antijanguismo, que levou ao militarismo e por aí afora.

E tivemos o imenso azar de Lula, um populista apoiado num aglomerado disforme de esquerdistas e estudantes, chegar ao poder justo quando Fernando Henrique havia arrumado o país para a retomada do desenvolvimento. Agora, sinceramente, estou pessimista: Lula por mais 8 anos prenuncia um retrocesso de várias décadas.

- Durante bastante tempo a disputa eleitoral no Brasil ficou marcada pela polaridade PT x PSDB. Hoje os dois partidos parecem cada vez mais próximos na oposição a Bolsonaro, Alckmin pode ser vice na chapa de Lula, e o próprio Fernando Henrique dá sinais de preferir Lula a Bolsonaro. Isso dá razão a quem enxergava no binômio PT-PSDB uma ilustração da “estratégia das tesouras” de Lenin?

BOLÍVAR: É mais um exemplo de nossa tragédia partidária. O populismo – há quem diga o “carisma” – de Lula permitiu ao PT, partido ambíguo em relação à democracia, se fazer passar por “centro”, até porque as principais lideranças da luta contra o regime militar desapareceram no curto período. E o PSDB se formou sem refletir direito sobre o significado de “socialdemocracia”.

Como é que um país que mal consegue equilibrar suas contas vai reduzir desigualdades mediante “entitlements”, atribuição indefinida de direitos a diferentes categorias? Foi uma forma meio envergonhada de conservar a personalidade passada de esquerdistas e cristãos-democratas, quando o que se impunha era um liberalismo sério, realista, que pusesse fim ao patrimonialismo e à superinflação que vinha desde 1961.

A aliança PT-PSDB é o melhor exemplo do que tenho afirmado: ter esse sistema partidário e não ter nenhum, dá na mesma. É tudo uma grande ameba, uma fraude à vontade do eleitor.

- Uma seção inteira do seu livro, aliás, é dedicada à Reforma Política. Poderia resumir quais devem ser as diretrizes dessa reforma, em relação ao sistema eleitoral, aos partidos políticos e a eventuais mudanças no Congresso?

BOLÍVAR: Fiz o possível para condensar minha ideia de reforma no capítulo 8 de “Da Independência a Lula e Bolsonaro. Defendo: 1) Um regime parlamentarista, sem as tergiversações “semipresidencialistas” dos adeptos do regime francês; 2) Um sistema eleitoral “misto”, designação imprópria do sistema alemão, mas com cuidado, porque sua complexidade pode dar margem a casuísmos sem fim; 3) Uma estrutura partidária séria – no momento, temos uma comédia, com 24 partidos – e grupos corporativistas fazendo-se passar por tal – na Câmara Baixa; 4) redução do número de deputados federais para cerca de 420, como propôs em 1986 a Comissão Afonso Arinos, e do número de Senadores para 54 – dois por Estado: Roraima com três senadores só pode ser anedota, não é?

- De que forma o crescimento das redes sociais e da internet tem afetado a política e a democracia no Brasil? O poder de censura das chamadas Big Techs é preocupante? Quais são os riscos que esse fenômeno traz, e como superá-los?

BOLÍVAR: Quem imaginava que a comunicação instantânea realizaria o velho sonho rousseauniano e anarquista de uma vontade do povo unificada e fraterna, enganou-se redondamente. O que estamos vendo é uma proliferação infindável de espirra-canivetes. E a presença cada vez maior das Big Techs só vai piorar isso, claro.

- Vivemos cada vez mais, uma época de “ódio do bem”. Não lembro, por exemplo, de ver na época de FHC amigos deixarem de se falar, ou parentes romperem relações por causa de política. Hoje há uma permanente demonização do outro, e parece que metade dos brasileiros odeia a outra metade. Como você analisa isso?

BOLÍVAR: É o resultado inevitável da dissolução da política, dos partidos e das elites no sentido sério desta segunda palavra), e também da estagflação – porque sem desmantelar o patrimonialismo e o corporativismo é óbvio que não teremos crescimento) – e da ignorância, no duplo sentido de estupidez e falta de escolaridade. E por aí afora. Sobriedade, respeito e outras qualidades necessárias em uma sociedade moderna foram “desconstruídas” – não é assim que se diz? – em proveito da boçalidade generalizada.

- Você enxerga a possibilidade de uma terceira via vencer a eleição deste ano? Por quê?

BOLÍVAR: Ainda não joguei a toalha, mas acho difícil. Sérgio Moro parece que não vai decolar. Dória será vítima de suas qualidades: está fazendo um grande governo em São Paulo, por isso não tem tempo para percorrer o país, o que, eleitoralmente, é o que devia estar fazendo, como Lula e Bolsonaro fazem. Antigamente havia uma legislação sobre o calendário eleitoral, lembra-se? Parece que não há mais.

- Há um desequilíbrio na relação entre os Poderes no Brasil hoje?

BOLÍVAR: Para o mau enredo que o Brasil vivencia hoje, de uma forma ou de outra, temos o pior elenco de nossa história, nos três Poderes. Sem uma nova Constituição e uma reforma política de gente grande, acho que não temos futuro. Com o “trânsito em julgado”, então, a corrupção terá um brilhante futuro...

- Voltando ao seu livro, de que forma a nossa historiografia foi contaminada (e comprometida) pelas premissas do marxismo?

BOLÍVAR: A primeira grande influência foi o que tenho denominado “protofascismo”, o pensamento autoritário que se formou na crítica à Constituição de 1891. Tratei de exemplificá-lo na figura de Oliveira Vianna, no capítulo 8 de meu livro “Tribunos, profetas e sacerdotes”. Nas primeiras décadas do século, o marxismo era irrelevante no Brasil. Quando surge, é logo dominado pela figura de Luís Carlos Prestes, cuja formação intelectual era rasa. Então, a rigor, o marxismo de grande vulto é só depois da Segunda Guerra, trafegando sobre o “sucesso” da União Soviética e o importante papel que ela teve na vitória sobre a Alemanha.

Por isso, no Brasil, o marxismo intelectualizado surge já acoplado e, por vezes, indistinguível do nacional-desenvolvimentismo, pela mística da industrialização etc. Observe-se que, nessa época, a ciência social não-marxista ou antimarxista era muito fraca tanto na Europa, sobretudo na França, como nos Estados Unidos. Eis porque, no Brasil, mesmo tendo poucos intelectuais de grande influência, o marxismo alastrou-se facilmente pelas universidades.

- Qual é sua crítica, por exemplo, à análise do patrimonialismo e do “estamento burocrático” feita por Raymundo Faoro, sobretudo em “Os donos do poder”?

BOLÍVAR: Mestre Raymundo Faoro teve um importante papel na desmistificação da tese, típica de Oliveira Vianna, de um país ganglionar, assentado quase exclusivamente sobre a família patriarcal. Mas passou para o outro extremo. Imaginou uma máquina de Estado consubstanciada no patronato político – expressão concreta de nossa patrimonialismo – transplantada de galho de Portugal para cá e dominando completamente a Colônia. Ele transformou o patrimonialismo em uma “enteléquia”, quero dizer, uma substância que sobrevive imutável através dos séculos. Tese insustentável.

O patrimonialismo originário, provindo de um país de escassa população, Portugal, tinha expressão localizada – no Nordeste, principalmente. Cresceu e foi sendo revificado à medida que os diferentes ciclos econômicos fracassavam. Com o colapso do açúcar, a oligarquia nordestina largou grande parte de seus engenhos – superados de longe pelos holandeses que, expulsos, foram para a América Central – e açambarcaram posições no Estado.

O mesmo se deu, em muito menor escala, no ciclo da mineração. Mas deu-se escancaradamente com o colapso do café em São Paulo. O Convênio de Taubaté (1906) foi uma clara expressão política do que venho de afirmar: a aristocracia cafeeira desistia de sua inviável autonomia em troca da proteção do Estado. O próprio getulismo seguiu essa lógica: o ditador agraciou amigos próximos com empreendimentos privilegiados.

- Qual seria, então, a sua explicação para a persistência do patrimonialismo na sociedade brasileira – patrimonialismo que em governos recentes chegou próximo da perfeição?

BOLÍVAR: A lógica exposta na resposta anterior prosseguiu e se revigorou, mesmo nos governos militares. Os momentos sucessórios do regime militar permitem viabilizar tal continuidade. O esboço de liberalismo iniciado no governo Castelo Branco, com Otávio Gouveia de Bulhões e Roberto Campos, foi liquidado pelo general Costa e Silva, que se impôs como candidato à sucessão. Morto Costa e Silva, a cúpula militar dá um golpe dentro do golpe, impedindo a posse do vice legitimamente eleito, o deputado mineiro Pedro Aleixo, e entronizando Garrastazú Médici no lugar dele. O general Geisel, além de estatizante, levou o endividamento externo às raias do delírio – origem da chamada “década perdida”.

- Qual dos chamados “pais fundadores” (Sérgio Buarque, Caio Prado Jr e Gilberto Freyre) da moderna historiografia brasileira é hoje mais relevante para explicar o Brasil? Por quê?

BOLÍVAR: Eu tenderia a dizer Caio Prado, mas a obra dele é muito desigual, além do que, naturalmente, ele não se propôs pensar a democracia. Sérgio Buarque – refiro-me a “Raízes do Brasil” – foi brilhante, mas excessivamente amarrado a um culturalismo weberiano não muito bem digerido, que não o deixou se livrar da antiga tese dos “grilhões do passado”.

No que me diz respeito, quem mais me ensinou foi Victor Nunes Leal, autor de “Coronelismo, enxada e voto”. É um livro que todo mundo leu ao contrário, como uma lamúria ligada ao latifúndio, quando ele quis dizer exatamente o contrário: que, apesar do latifúndio, o Brasil estava evoluindo no sentido de uma democracia representativa razoável. Isso em 1948.

Mas, depois, infelizmente, veio a guerra-fria, a contraposição getulismo x lacerdismo, os delírios reformistas de Jango etc, e fomos para o brejo.

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Jornalismo x jornalixo: a eterna batalha (2).

Segunda parte do estudo de Fernão Lara Mesquita, publicada no blog Vespeiro:


No capítulo anterior fomos da “Guerra das Gazettes” (Thomas Jefferson x Alexander Hamilton) à primeira grande remissão por conta de Joseph Pulitzer e Sam McClure, duas das “sequências genéticas” que vão compor para todo o sempre o DNA do jornalismo e do jornalixo, os dois canais – da vertente sã e da vertente doente – da disputa pelo poder nas democracias.

Vale, no entanto, recuar um passo antes de seguir adiante, para identificar claramente o “gen recessivo” que faz do jornalismo, antes de tudo, para o bem e para o mal, um parteiro de reformas.

Mais de mil e quinhentos anos se tinham passado, rios de lágrimas e de sangue tinham corrido quando a invenção de Gutemberg finalmente permitiu que Lutero desmascarasse o esquema de poder que, apoiado na censura e no controle estrito da informação, se tinha estruturado por cima da Igreja e transformado a mensagem de Cristo num instrumento de terror. O primeiro ramal do tronco bi-partido da semente que ele plantou medraria na Inglaterra com a “Revolução Gloriosa” de 1688 que dá ao Parlamento, eleito pelo povo, o lugar que era do rei. O segundo fincaria raízes na América do Norte.


A imprensa americana nasceu antes da democracia americana. Os Estados Unidos eram apenas um conglomerado de 13 colônias independentes com características genéticas bastante diferentes entre si até que Alexander Hamilton, James Madison e John Jay as convencessem a se unir numa federação apoiada numa Constituição democrática com a publicação de uma série de 85 artigos entre outubro de 1787 e agosto de 1788 no The Independent Journal de Nova York.

Foi a imprensa, portanto, o veículo dos Federalist Papers mediante os quais discutiu-se à exaustão e estabeleceu-se para sempre a receita do primeiro sistema político inteiramente baseado no debate de ideias e no livre consentimento de seus aderentes. Hamilton, autor da maioria dos artigos, escreveu-os dois por semana em intervalos de três dias, sob a pressão dos acontecimentos, enquanto rolava a Convenção de Filadélfia e, portanto, num ritmo essencialmente jornalístico. Mas então ainda não estava em cena a disputa de poder com data marcada que a democracia institui, e que é a mãe do jornalixo…


Feito o parêntese, voltamos a McClure e Pulitzer e à exitosa operação de ressuscitação da jovem democracia americana defeituosa promovida pelo jornalismo deles. Afastado da luta pela cegueira prematura, Pulitzer reserva uma parte de sua fortuna para perpetuar o jornalismo de qualidade em cujas mãos acreditava estar o futuro da democracia. Morre em 1911 e em 1912 é lançada a pedra fundamental da Columbia University Graduate School of Journalism. Só em 1927 dá-se a primeira distribuição do Prêmio Pulitzer em 21 categorias encomendado por ele e até hoje tido como o mais importante da profissão.

Mas “o poder corrompe, e o poder absoluto corrompe absolutamente”. É Walter Duranty, editor e correspondente do NYTimes na Moscou de Joseph Stalin, um dos primeiros e mais festejados ganhadores do Pulitzer (1932), quem vai se tornar o grande paradigma histórico da volta triunfal do jornalixo ao primeiro plano.

A semente do mal, que viera prosperando desde a “Guerra das Gazettes”, é a constatação de que, se o jornalixo não comanda os fatos, ele pode comandar a reação da massa dos eleitores aos fatos. É ele que instiga e alimenta a indignação que se levanta ou a anestesia que se instala na opinião pública. Lênin nunca negou a que veio e como veio. Só o poder lhe interessava. O terror elevado ao estado da arte era, declaradamente, o seu instrumento de ação. Quanto mais sagrado fosse o valor universal violentado e mais gratuita e injustificada a violência praticada contra ele, maior e “mais eficiente” seria o efeito do terror provocado e mais perto estaria a conquista do poder. E diante da indignação que essa violência inevitavelmente provocaria, dizia Vladimir Ilitch com todas as letras, “acuse o atacado daquilo que você é; ponha nele a culpa pelo que você faz”.


Foi o jornalixo protegido pela marca do NYTimes, e não Lênin, que transformou essa receita sinistra na “salvação moral” da humanidade. Corrompido por Stalin, que “fez-lhe o nome” dando-lhe entrevistas exclusivas em momentos cruciais (e certamente não apenas isso), Duranty transformou-se no protótipo do Fausto, “dono” incontestável do assunto mais quente do jornalismo de seu tempo, e foi cortejado e festejado no mundo inteiro por isso.

Segundo ele, “tudo era cor-de-rosa na revolução russa”. “Ia às mil maravilhas a Nova Política Econômica” (NEP). “Moscou era uma festa”. “Stalin era amado pelo povo”…

Mas nenhum jornalista estrangeiro, senão ele, podia sair da capital. Até que em 1934 Gareth Jones, viajando incógnito, registra o horror da fome na Ucrânia. Stalin estava resolvendo dois problemas matando de fome, pelo confisco de toda comida existente, a população que resistira à sua revolução (e até hoje ainda não se livrou da Russia), e escondendo da população de Moscou, inundada com essa mesma comida, a debacle da economia soviética.


Aproximadamente 4 milhões de ucranianos foram deliberada e sistematicamente assassinados pela fome para sustentar a mentira socialista. Foram os primeiros de uma vasta montanha de cadáveres…

Expulso da Russia, também Gareth Jones foi assassinado um ano depois, aos 29 anos, quando fazia uma reportagem na Mongólia. Jurado de morte, os “guias” que contratara estavam a soldo da polícia política soviética…

O NYTimes, diante do escândalo da publicação das matérias de Jones no Ocidente, tirou Duranty de Moscou mas logo o devolveu para lá. Foi ele quem “cobriu”, com as lentes cor-de-rosa de sempre, os famosos “processos-farsa” (1936-38), sempre justificando-os, com que Stalin assassinou todos os seus companheiros revolucionários.

Duranty morreu em paz em 1957 na Florida, aos 73 anos, e seu Prêmio Pulitzer, apesar de repetidos movimentos para que fosse revogado, nunca o foi, nem o NYTimes, em resposta a “investigações” sobre seu desempenho exigidas a partir dos anos 90 (pós queda do muro), “descobriu” qualquer coisa de muito grave sobre ele e todas as mentiras que escreveu e dormem em seus arquivos.


O socialismo real nunca pretendeu ser diferente do modelo que Lênin lhe conferiu. Da versão maoista dos anos 50-60, passando pelas “repúblicas democráticas” da Cortina de Ferro, pela cubana dos paredón, pela vietnamita dos boat people, pela cambodjana que matou 1/4 de população do país, pela coreana dos Kim até chegar à ciber-ditadura de Xi Jinping, todas impõem-se pela violência e pelo terror; todas afirmam sem meias palavras que o poder totalitário do partido único, extensão do chefe único, está acima de tudo e de todos, sob pena de morte. Foi sempre o modelo de jornalixo relançado pelo até hoje premiado Walter Duranty e refinado ao estado da arte por Antonio Gramsci, que fez dele o que nunca foi, ensejando que continuasse matando como mata até hoje “em nome do bem da humanidade”.

Agora mesmo, em plena fervura planetária da patacoada das fake news nascida e criada pelo jornalixo, um docudrama muito bem feito – na Polônia, jamais em Hollywood, é claro – contando essa história está ofertado na Netflix. Mas vem sob o título genérico “À sombra de Stalin”, um “filme sobre questões sociais”, e escondido sob a legenda que se lê abaixo que não menciona o NYTimes, o nome do seu tristemente famoso agente stalinista ou a palpitante questão das fake news.

Ou seja, quase 100 anos depois dos acontecimentos, o jornalixo é uma instituição cada vez mais firme, mais forte e, como se verá no capítulo de amanhã, mais generalizada.

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