Com
uma área de 881.704 mil hectares e, pelo menos, seis comunidades, a
Floresta Estadual (FES) Tapauá, na calha do rio Purus, abriga populações
indígenas e extrativistas que enfrentam diversos desafios, os maiores
são ligados ao saneamento básico e ao acesso a políticas públicas.
Lideranças locais apontam a falta de um gestor específico para a área
protegida como a raiz da situação. Além disso, desde 2018, a floresta
vem registrando índices crescentes de desmatamento, que atingiu recordes
em 2021.
O
tema é um dos destaques do informativo mensal do Observatório BR-319
(OBR-319), que traz notícias importantes sobre acontecimentos na área de
influência da BR-319, além de um boletim completo com números do
desmatamento e focos de calor na região. O material pode ser acessado no
site www.observatoriobr319.org.br.
O
OBR-319 esteve em Tapauá, a 449 quilômetros da capital, Manaus (AM), em
novembro. Na ocasião, a equipe, liderada pela pesquisadora Paula
Guarido, conversou com lideranças comunitárias e indígenas, além de
autoridades municipais. Foram diversos os relatos de invasões,
atividades ilegais e problemas relacionados à ausência do Estado em
Áreas Protegidas do município.
A
reivindicação mais presente na fala dos moradores da FES Tapauá foi
sobre a presença de um gestor na Unidade de Conservação (UC). Segundo o
líder da comunidade Paiol, Edilson Santana, a presença de um gestor
facilitaria o acesso a todos os tipos de direitos para os moradores do
local. “Não temos comunicação, nossa comunidade fica há duas horas de
lancha [da sede] de Tapauá e, para se comunicar, a gente tinha rádios
comunicadores que eram da reserva, mas está tudo desativado e não
recebemos nenhum técnico para consertar. A falta do gestor contribuiu
para esses problemas, com certeza”, disse Santana.
Raimundo
Firmiano, líder das comunidades Baturité e Jatuarana e, também,
representante da Associação Agroextrativista dos Moradores da Floresta
Estadual Tapauá (Ammfet), diz que um dos maiores problemas vividos pelas
comunidades é o acesso precário ao fornecimento de energia elétrica.
“Temos um gerador de energia que dura cinco horas, mas, às vezes, falta o
diesel por uns 30 dias e, durante esse tempo, a gente fica sem
energia”, diz. O acesso à educação, à saúde e à água potável também são
escassos, segundo o líder. “Na comunidade de Baturité temos uma escola
para alunos até a 4ª série, um poço e um agente de saúde, mas, na
comunidade Jatuarana não tem poço, nem escola e lá não existe agente de
saúde desde o ano passado [2020]”, disse Firmiano.
A Floresta Estadual de Tapauá foi criada em 2009
antevendo pressões provocadas pela repavimentação da BR-319. No
entanto, o crescente desmatamento e a falta de gestão têm colocado em
risco o papel da UC, localizada entre os municípios de Tapauá e
Canutama. Durante a visita ao local, o OBR-319 aplicou questionários
socioambientais para mapeamento das cadeias de valor existentes e em
potencial, além de atividades ligadas à bioeconomia.
“Ouvimos
relatos, principalmente, sobre invasões para a prática de atividades
ilegais dentro da UC e casos de pesca ilegal”, conta a pesquisadora
Paula Guarido. Ela acrescenta que os moradores consideram o ramal Belo Monte, que vem de Canutama,
um dos pontos vulneráveis da FES. “Eles dizem que esse ramal é bastante
recente, que surgiu do começo da pandemia para cá. O rio Ipixuna também
é protagonista de diversos relatos, inclusive, de que moradores desta
região já são ameaçados por invasores que praticam atividades ilegais na
área”, acrescenta.
“Algumas
pessoas relataram que as atividades ilegais começaram depois da saída
do gestor da FES Tapauá. Mas que, há mais ou menos dois anos, essas
atividades estão aumentando em proporção. Checando as imagens e os dados
de desmatamento, é perceptível que os relatos dos comunitários fazem
sentido e que esse processo, realmente, teve início neste intervalo”,
acrescenta Paula Guarido.
Não
é de hoje que os problemas de gestão ambiental do Amazonas chamam a
atenção de órgãos fiscalizadores. Em 2020, o procurador do Ministério
Público de Contas do Amazonas (MPC-AM), Ruy Marcelo Alencar de Mendonça,
alertou ao governo do Estado sobre a necessidade de reavaliar medidas e
orçamento voltados ao meio ambiente. O procurador acredita que se a
situação persistir, “o risco é de devastação. Sem exagero”. Obras como a
BR-319 e a frágil governança na área de influência da rodovia são
agravantes para o cenário. “No contexto regional de aumento populacional
por fluxo migratório crescente e de grandes obras e empreendimentos sem
a devida sustentabilidade, a falta de adequada gestão das UCs ameaça a
integridade e frustra a própria razão de ser desses espaços
juridicamente protegidos”.
O
procurador também chama a atenção para o colapso climático, agravado
pela perda de cobertura florestal nestas áreas. “Sem a equipe e os
instrumentos para eficiência de gestão no local, não há como garantir
governança territorial nem o desenvolvimento de políticas públicas de
conservação e proteção. As unidades florestais ficam vulneráveis a
invasões e a usos nocivos que causam severa degradação ambiental, com a
conseguinte exclusão e opressão das populações tradicionais e a perda
dos atributos naturais da biodiversidade amazônica e de seus serviços
ecossistêmicos em benefício à sadia qualidade de vida e ao equilíbrio
climático”, avaliou o Ruy Marcelo.
Por
meio de nota, a Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sema) disse que a
gestão das 42 UCs do Amazonas é feita por meio do Departamento de
Mudanças Climáticas e Gestão de Unidades de Conservação (Demuc) e que a
FES Tapauá não possui um gestor fixo no município. “A gestão é realizada
de acordo com as demandas (identificadas por esta Sema ou apresentadas
pelos moradores da UC) e disponibilidade de recursos, sendo executadas
pela Sema e demais instituições governamentais quando se trata de ações
de fiscalização a ilícitos ambientais”, diz a nota enviada ao OBR-319.
Sobre o OBR-319
O
Observatório BR-319 é formado pela Casa do Rio, Conselho Nacional das
Populações Extrativistas (CNS), Coordenação das Organizações Indígenas
da Amazônia Brasileira (Coiab), Fundação Amazônia Sustentável (FAS),
Fundação Vitória Amazônica (FVA), Instituto de Conservação e
Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (Idesam), Instituto
Internacional de Educação do Brasil (IEB), Transparência Internacional
Brasil, WCS-Brasil e WWF-Brasil.
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