quarta-feira, 29 de dezembro de 2021

Festas Felizes (um guia de obediência, perdão, segurança)

 

BLOG  ORLANDO  TAMBOSI


A crônica semanal de Alberto Gonçalves, publicada pelo Observador (o blogueiro lembra que Portugal vive ainda sob governo socialista e aqui acontece o contrário, um governo que lembra Lula às avessas, valha-nos Deus):


Posso festejar o Natal?

É evidente que pode. Mas se, após cumprir todas as regras que se seguem, continuar a achar que sobra alguma coisa parecida com uma festa, você tem um problema grave.

Posso festejar a Passagem de Ano?

Poder, pode. Mas pense melhor: em princípio, você vive em Portugal, o país do dr. Costa, do prof. Marcelo, da dra. Graça e do vice-almirante. É accionista compulsivo da TAP, da RTP e de portentos similares. Partilha uma dívida pública de luxo. Paga impostos de rico. Prepara-se para discutir com a Bulgária o primeiro lugar em nível de vida na UE, dependendo da orientação do gráfico. De brinde, é regularmente homenageado pelos senhores que mandam, que o obrigam a esconder a cara e o fecham em casa quando lhes apetece. Você tem razões para festejar todos os anos, todos os meses e todos os dias. Mas com cautela, claro.

Posso passar as festividades com a família?

Depende da interpretação da “lei”. E depende da família. O dr. Costa, que é quem decide, informou que passará o Natal com os parentes dele. Na falta de melhores esclarecimentos, o mais seguro é seguir o exemplo e comer com os parentes do dr. Costa. Afinal, você já pagou e repagou os repastos deles.

Posso participar em ajuntamentos na via pública?

Pode, desde que sejam de carácter político. O dr. Costa proíbe tudo excepto arruaças de campanha. Não há qualquer problema em se aglomerarem 10 ou 100 alminhas se, à aproximação da polícia, esconderem as cervejas e desatarem a gritar “vivas!” ao PS.

Posso participar em ajuntamentos na via privada?

Pode, embora dê jeito residir no Convento de Mafra ou similar, já que a DGS exige “espaços amplos”, característica incompatível com a sala de estar do T3 médio. Também se limita o convívio a pessoas da mesma “bolha familiar ou social”, pelo que encher a casa com desconhecidos está fora de questão. Questão de bolhas.

Posso ir a restaurantes?

Naturalmente. Contanto que exiba ao virologista de serviço ou ao ajudante de cozinha o certificado com duas ou três doses de vacinação, e desempenhe na presença do homem testes de despistagem da Covid, da tuberculose e do HIV. Também se aconselham também análises rápidas à urina, de carácter facultativo.

Posso ir a discotecas e a bares?

Pode ir. Não pode é entrar porque estarão fechados. As pessoas que seguem a “ciência” descobriram anteontem que, em contexto de pândega, as vacinas, os certificados, os testes, as máscaras e os escafandros não protegem do contágio, logo do internamento, do ventilador e da morte certa.

Posso vacinar-me no período das festas?

Deve. Mas não pode: os centros de vacinação estarão fechados para descanso do pessoal, o qual tem direito aos festejos da época – isso se os festejos estivessem autorizados. O fundamental é perceber que a vacina, leia-se sempre a dose da vacina que a pessoa ainda não levou, é determinante para se regressar à normalidade e deixar para trás medidas tão cretinas quanto as medidas importantíssimas que aqui se enumeram.

Posso duvidar da eficácia da vacina e dos testes e das máscaras sem ser chamado de “negacionista”?

Não pode, seu chalupa. O negacionismo é um exclusivo das “autoridades”, que ridicularizam a vacina pedindo testes a vacinados, que ridicularizam os testes fechando os locais que os exigiam e que ridicularizam as máscaras ao forçar imposições que desprezam a sua sacrossanta relevância. A diferença é que ao negacionismo das autoridades chama-se “ciência”.

Posso testar-me?

Pode, e à bruta. Testar-se é, aliás, das raras actividades que não estão interditas ao cidadão comum. Caso este deseje mostrar-se virtuoso, é livre de passar a semana inteira a escarafunchar cotonetes nas narinas a fim de demolir “as cadeias de transmissão” e a nasofaringe.

Posso exigir teste negativo e certificado de vacinação aos meus familiares?

Então não pode? A medida até tem um efeito higiénico: os que aceitarem tamanha vergonha provam que são tão idiotas quanto você; os que recusarem vêem-se livres de vez de frequentar a casa de um idiota.

Posso exigir que os meus convidados tirem os sapatos à entrada?

Sim, ora essa! É o seu nariz que sentirá o cheiro – ou sentiria, caso não estivesse estrafegado à conta de sucessivos testes.

Posso vestir-me como quiser?

Isso é que era bom. A dra. Graça impôs na DGS o “novo código de vestimenta” (sic), que derrama para as habitações comuns. Surpreendentemente, não é a camisa de forças. Consta de sobretudo e cachecol, a que acresce gorro, peúgas grossas e manta nas perninhas. Isto por causa da necessidade de ventilação: há que abrir as janelas e assegurar correntes de ar incompatíveis com a Covid e compatíveis com a pneumonia.

Posso comer e beber?

Se insistir muito. O ideal seria não o fazer nunca, e por dois motivos. O primeiro é a tendência para o vírus se alojar no tecido adiposo e, em jargão clínico, lixar os gordos. O segundo motivo é a ingestão de alimentos ser um exercício complicado de realizar com máscara, já que exige rapidez (levante a máscara apenas por um instante e baixe-a de repente, a tempo de a sujar com aletria) e distância (a DGS recomenda mesas separadas, presumivelmente uma por comensal).

Posso ir trabalhar?

Pode, mas apenas em teletrabalho, ou seja, trabalhe a ver televisão. Se não integrar a administração pública, aproveite os reclames e reze para um dia destes não receber um telesalário.

Posso andar sem máscara na rua?

Para já, sim. Os “especialistas” aguardam a eventual mudança de opinião do dr. Costa para emitir um parecer.

Posso ir a concertos, jogos da bola, casamentos ou funerais?

Desde que pague ou o convidem, sim. Leve certificado, teste negativo, resultado da colonoscopia e, sendo um enterro, o testamento vital.

Posso trocar prendas depois do Natal?

Pode, lá para o fim de Janeiro. Ou, preferencialmente, nos inícios de Junho. Segundo diversos especialistas televisivos, incluindo o dr. Portas, a Ómicron aproveita-se dos saldos para se infiltrar no intervalo entre o preço anterior e o preço com desconto.

Posso recear a Ómicron?

É imperativo que a receie, ouviu? Se, de acordo com recentes estudos, a nova variante do vírus raramente provoca mais que uma constipação, é fundamental que pelo menos provoque medo. Esqueça os estudos, realizados por choninhas que passam o tempo em laboratórios, e atente nos “especialistas” que não saem das televisões. Eles não falham.

Posso aguardar por mais restrições?

Pode, e com entusiasmo se faz favor. A dra. Graça explica com uma espécie de analogia: “Estamos a fazer uma maratona numa cordilheira, mais do que uma maratona são várias maratonas que não sabemos quando acaba. Temos de estar muito atentos aos sinais, às novas variantes e ao aumento de novos casos.” Embora a direcção da DGS não se distinga nos domínios do português e da saúde pública, é exímia a negociar alucinogénios de categoria. Além disso, há eleições daqui a um mês, e o eleitorado agradece enxovalhos.

Posso invocar a Constituição para ignorar esta palhaçada e viver dignamente?

Você é parvo ou faz-se? A Constituição servia para atacar o governo do Passos Coelho sempre que este perturbava os funcionários públicos e outras ofensas assim vitais. Hoje, se é que ainda não faleceu, a Constituição não serve para nada, muito menos para garantir a liberdade dos cidadãos e picuinhices do género.

Posso esperar que, conforme previsto, a palhaçada acabe a 10 de Janeiro?

Você é de facto ignorante. Há dois anos que sabemos que isto são só duas ou três semanas.

Posso achar que nenhuma das “regras” acima é susceptível de ser respeitada por um adulto que não sofra de perturbações mentais?

Não pode, sua anta negacionista. As “regras”, a “lei” ou a “ciência”, conforme o que quiserem chamar às eructações do dr. Costa, são para se cumprir, apreciar e, manda a cortesia, agradecer. Não faltava mais nada do que questionarmos uma sumidade que diz “eurossóis”.

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