terça-feira, 1 de junho de 2021

Valor de venda da RLAM é questionado em audiência na Câmara

 


Representante do TCU diz que Tribunal pode impedir o negócio em decisão de mérito

Rio de Janeiro, 1º de junho de 2021 – Em audiência pública realizada nesta terça-feira, 1°, pela Comissão de Fiscalização Financeira e Controle (CFFC) da Câmara dos Deputados sobre a venda da Refinaria Landulpho Alves (RLAM), pela metade do preço, o secretário de Fiscalização da área de Petróleo e Gás do Tribunal de Contas da União (TCU), Alexandre Carlos Leite de Figueiredo, disse que o Tribunal ainda pode impedir a venda da refinaria da Bahia em seu processo de decisão. Isso porque o mérito da operação ainda não foi julgado.


O Tribunal precisará aprofundar sua avaliação sobre a venda e o preço do ativo. A conclusão do negócio está prevista para novembro de 2021, conforme contrato firmado entre a Petrobrás as e o fundo árabe Mubadala, comprador da refinara por US$ 1,65 bilhão, abaixo do valor de mercado, segundo avaliações de bancos de investimentos e da própria Petrobrás, além do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo , Gás Natural e Biocombustível (Ineep).


“O órgão ainda não decidiu o mérito sobre a venda da RLAM; houve uma decisão do Ministro do Tribunal de não acatar a cautelar suportada por opinião técnica da unidade responsável que avaliou a não pertinência da suspensão da venda naquele momento”, disse Figueiredo, citando que até o "closing", em novembro, a equipe técnica do tribunal terá mais tempo para aprofundar sua avaliação sobre a venda da RLAM.


A audiência pública para discutir os impactos da venda da RLAM para a Petrobrás e para a sociedade brasileira foi proposta pelo deputado Jorge Solla (PT-BA). A reunião foi conduzida pelo deputado Leo de Brito (PT-AC).


O pesquisador do Ineep, Eduardo Costa Pinto, disse que a questão vai além do preço pelo qual a refinaria foi vendida, uma vez que a alteração do controle da refinaria traz alterações específicas ao mercado de combustíveis nacional. Costa Pinto destacou que junto com a refinaria estão sendo vendidos também 669 km de oleodutos e 4 terminais da região. A RLAM tem capacidade de produção de 333 mil barris por dia, o que representa 14% da capacidade de refino da Petrobrás. Para Costa Pinto, não faz sentido as projeções futuras baseadas em momento de baixa demanda de combustíveis, uma vez que não há, a médio prazo, alternativa de substituição da matriz energética mundial com base na pandemia. Disse que importante também é o quanto a RLAM vai render de receita para o proprietário. Pelos seus cálculos, o Mubadala terá uma taxa de retorno fantástica de 20% do valor da compra ao ano. Isso tem que ser considerado nas análises do TCU que, segundo ele, está trabalhando com variáveis equivocadas em projeções sobre preço justo da refinaria.


O diretor jurídico da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (Aepet), Ricardo Maranhão, ressaltou transações recentes onde refinarias foram vendidas por valores muito mais altos do que a RLAM, apesar de terem capacidades de refino sensivelmente menores. “Na Refinaria de Port Arthur, Texas, maior refinaria norte-americana, a Shell vendeu, em 2018, à sócia Saudi Aramco sua metade, equivalente à produção de 300 mil barris por dia (bpd), por US$ 2,8 bilhões. A planta brasileira tem uma capacidade ligeiramente superior, de 310 mil bpd. Em outro caso, a Adnoc (estatal de Abu Dhabi) vendeu parte da refinaria de Ruwais às petrolíferas ENI (italiana) e OMV (austríaca)”. Maranhão fez um cálculo levando em conta o valor pago por cada uma e a fatia na companhia. A OMV pagou o equivalente a US$ 18.076,60 por barril. A ENI, um pouco menos: US$ 17.895,90 por barril.


Na negociação da RLAM, o Mubadala pagou aproximadamente US$ 5 mil por barril, valor bastante abaixo dos demais. “A subavaliação é patente. Não tratamos apenas da venda de uma refinaria com todos seus ativos de logísticas, mas também a venda de 14% do mercado brasileiro de combustíveis para um fundo de investimentos estrangeiro, em desrespeito ao art. 219 da Constituição Federal, que versa sobre o status de patrimônio nacional do mercado interno, e compromisso da constituição com o incentivo do mesmo”, ressaltou Maranhão.


Para o presidente da Anapetro (que representa acionistas minoritários da Petrobrás), Mario Alberto Dal Zot, estas comparações de preços têm que ser observadas pelo TCU no julgamento do mérito da transação.


O coordenador geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Deyvid Bacelar, destacou que a venda da Rlam, a “preço de banana”, foi feita à revelia da sociedade brasileira, pois não tem autorização do Congresso Nacional. Ele lembrou que a Câmara e o Senado entraram com reclamação no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a privatização, em defesa das prerrogativas parlamentares e está aguardando julgamento do mérito.


Durante a audiência, Bacelar rebateu argumentos do gerente-executivo de estratégia da Petrobrás, Rafael Chaves Santos, sobre investimentos da empresa: “Petrobras está transformando recursos em riquezas, para quem? Não é para o povo brasileiro, mas, sim, para o capital internacional”, disse ele, citando dados. No período entre 2003 e 2013, os investimentos da empresa ficaram no patamar de US$ 40 bilhões, atingindo US$ 48 bilhões em 2010 e 2011. Em 2020, na administração de Roberto Castello Branco, demitido da presidência da empresa, os investimentos não passaram de US$ 8 bilhões.


Bacelar destacou ainda que, somente no refino, os investimentos realizados em 2010 somaram US$ 16,2 bilhões. Eles caíram para US$ 600 milhões em 2020. Para ele, o argumento de que a venda da Refinaria Landulpho Alves (RLAM), na Bahia, vai aumentar a rentabilidade da Petrobrás é equivocado, assim como as premissas utilizadas para sustentá-lo. “Teremos, sim, a criação de monopólios privados regionais, que irá controlar os preços dos derivados de petróleo nas regiões Norte, Nordeste e Sul do país. A população brasileira, que já paga muito caro pelos derivados de petróleo, ficará refém desses investidores. Haverá aumento ainda maior dos preços dos combustíveis e não redução”, afirmou. “Além disso, haverá risco de desabastecimento, porque a região ficará vulnerável às decisões do Mubadala, que pode optar por maximizar sua rentabilidade reduzindo a produção de determinados combustíveis”, acrescentou. “É inadmissível que 29 pessoas decidam por milhões de brasileiros”, disse ele, referindo-se à participação de 10 gerentes-executivos, 8 diretores e o presidente da Petrobras, além do Conselho de Administração da empresa, no processo de venda da RLAM.


O coordenador geral da FUP condenou também a política de Preço Paridade de Importação (PPI), com reajustes sucessivos dos combustíveis. Por conta da PPI, a gestão da Petrobrás autorizou aumentos na gasolina em torno de 73%, no diesel em 54% e o botijão do gás de cozinha. "Essa política visa principalmente à maximização dos lucros e geração de dividendos para os acionistas. Além disso, facilita o processo de privatização das nossas refinarias, tirando a possibilidade do Estado brasileiro pensar uma política de preço que seja justa para os brasileiros", afirmou Bacelar.


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