Capaz de fazer promessas grandiosas e incapaz de cumpri-las, Paulo Guedes agora aposta no novo comando do Congresso para destravar sua agenda, afirma editorial do Estadão. De fato, se a carroça das reformas não andar agora, o país vai para o brejo - e não há ninguém para culpar além do próprio governo:
Já
entrou para o anedotário da política nacional a capacidade do ministro
da Economia, Paulo Guedes, de fazer promessas grandiosas e também sua
incapacidade de cumpri-las. A “revolução liberal” anunciada por Guedes
desde a campanha eleitoral de 2018 não chegou nem ao ensaio geral – a
ponto de alguns dos expoentes da vanguarda revolucionária do ministro
terem deixado o governo, frustrados com a prevalência da parolagem sobre
a ação. Nada disso parece desanimar o ministro, que agora aposta suas
fichas no novo comando do Congresso para destravar sua agenda.
O
governo, seja por meio de Paulo Guedes, seja pela voz do próprio
presidente Jair Bolsonaro, atribuía ao deputado Rodrigo Maia, até ontem
presidente da Câmara, o atraso na tramitação das reformas. Removido esse
alegado obstáculo, a expectativa da equipe econômica, segundo noticiou o
Estado, é que os projetos deslanchem.
Nada
mais falso. A Câmara sob a presidência de Rodrigo Maia apresentou uma
notável feição liberal. Havia genuína disposição para tocar adiante não
somente as propostas de reformas espinhosas, como a tributária e a
administrativa, mas também a privatização de estatais importantes, como a
Eletrobrás. Pode-se dizer que, para um governo que se dizia liberal,
era uma chance de ouro.
Como
se sabe, a chance foi desperdiçada, e nada garante que a nova direção
da Câmara terá a mesma disposição demonstrada por Rodrigo Maia. Ainda
que o sucessor de Maia se apresente disposto a tocar a agenda liberal,
contudo, o problema principal permanece: é Jair Bolsonaro quem não quer
nem reformas nem privatizações.
Por
mais habilidoso que o ministro da Economia seja – e ainda esperamos que
ele revele ter essa qualidade –, reformas constitucionais não
deslancham se o presidente da República não se envolve pessoalmente na
articulação para aprová-las. Jair Bolsonaro, ao contrário, muitas vezes
age como oposição, e nisso é mais competente do que a maioria de seus
opositores jamais será.
Antes
da eleição para o comando da Câmara, o presidente dizia apostar que a
nova direção, se alinhada ao governo, ajudaria a “destravar a pauta” de
interesse do Palácio do Planalto. Para os que acreditam nas promessas de
Paulo Guedes, isso significa o avanço dos projetos que, ao modernizar o
Estado e o sistema tributário, farão o País superar a profunda crise
que já se avizinhava mesmo antes da pandemia de covid-19; para quem tem
um pouco de bom senso e jamais se deixou enfeitiçar pelas falsas juras
liberais bolsonaristas, no entanto, isso significa dar impulso à agenda
“conservadora” que Bolsonaro prometeu a seus devotos.
Ou
seja, Bolsonaro, como sempre, só se interessa por aquilo que tem
potencial eleitoral e que nem de longe deveria ser prioridade neste
momento tão grave da história nacional. O presidente se anima quando
fala em facilitar a compra de armas pela população, em acabar com o
“comunismo” nas escolas e em combater a “ideologia de gênero” na
cultura. Mas, quando é chamado a liderar o País no enfrentamento da
pandemia e da crise econômica e social, Bolsonaro lava as mãos e repele a
responsabilidade intrínseca ao exercício da chefia do governo.
Milhões
de compatriotas estão à míngua, sem renda, mas Bolsonaro desestimula a
discussão sobre um novo auxílio emergencial, porque, segundo diz, vai
“quebrar o Brasil”. Nada oferece no lugar, pois nada tem a oferecer, a
não ser bravatas e palavrões que excitam seus camisas pardas. Os
brasileiros que se virem – para conter o coronavírus, para comer e para
respirar.
Assim,
mesmo que conte com a boa vontade da nova direção da Câmara, o ministro
Paulo Guedes terá que demonstrar qualidades políticas até agora
inéditas para conciliar a emergência nacional em razão da pandemia, a
conta a pagar pelos votos nos candidatos governistas ao comando do
Congresso e os impasses sobre o Orçamento, tudo isso em meio às
sabotagens de Bolsonaro. Salvo um milagre, que, de uma hora para outra,
ponha Bolsonaro e o Centrão a trabalhar pelo bem do País, restará à
Nação continuar ouvindo promessas que não serão cumpridas.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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