Danielle Brant e Julia Chaib
Folha
O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), encerra em fevereiro de 2021 o último de três mandatos seguidos à frente da Casa. Nos últimos dias, Maia anunciou a formação de um um bloco para a disputa da sua sucessão, que reúne 280 deputados de partidos de centro-direita e direita (DEM, MDB, PSDB e PSL) e de oposição, como PT, PC do B, PDT e PSB.
O candidato é Baleia Rossi (MDB-SP), que vai disputar o cargo com Arthur Lira (PP-AL), líder do chamado bloco do Centrão e apoiado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
O seu grupo na disputa, avalia Maia, é um ensaio para a eleição presidencial de 2022 e “um grande passo” para diminuir as radicalizações no país.
O sr. teve uma trégua no relacionamento com o Paulo Guedes, mas depois desandou. O sr. conversou com ele no último mês?
Não estou rompido com ele não. Mas eu não preciso [dialogar com ele]. Votamos tudo sem a gente precisar ter um diálogo.
Algumas votações defendidas pelo sr. não ocorreram. Por
exemplo, a PEC Emergencial, que poderia abrir espaço para ampliar o
Bolsa Família.
Do meu ponto de vista, foi um erro [deixar para 2021]. A gente
deveria ter avançado, com toda polêmica. Porque era um desgaste menor
abrir espaço no Orçamento e garantir a ampliação do Bolsa Família do que
deixar milhões de brasileiros sem nenhum tipo de proteção, mesmo que a
proteção fosse um valor menor que o valor do auxílio emergencial. Por
isso que eu sempre defendi que a reforma mais importante naqueles
últimos meses era a PEC Emergencial. Por isso defendi a não entrada em
recesso por parte do Congresso, mas o governo interpretou isso como uma
tentativa de usar o plenário da Câmara na minha sucessão.
O sr. chegou a dizer que havia maioria para aprovar a reforma tributária. Por que não pautou?
Não votar a reforma tributária foi, do meu ponto de vista, um
erro grave do governo. A gente não está aqui só para dizer que aprovou
coisa, estamos aqui para aprovar com diálogo, e a tributária precisa do
diálogo com o governo. Mexer nos tributos sem estar organizado com a
Receita, com os técnicos do governo… seria um capricho meu tentar
avançar sem isso estar bem organizado. Voto tem, e tenho certeza de que
no início do ano vai ser votado, mas a questão política prevaleceu em
detrimento da sociedade brasileira.
Nessas semanas foram muitos projetos obstruídos pelos
partidos da base do governo. O senhor viu uma tentativa do governo de
tentar minar o final de sua gestão?
Eu acho que sim, mas acho que erraram, né? A última semana de trabalho
mostrou que a Câmara tem uma maioria que quer aprovar projetos. A equipe
política, no final, fez política populista. Deixou a pauta em aberto
para eu pautar. Mas tenho responsabilidade. E de nenhuma forma tento
aprovar projetos que não sejam dialogados com os quadros técnicos de
cada uma das áreas das matérias.
Ter conseguido vencer a obstrução pode ser encarado como um fator positivo?
Acho que é uma sinalização forte que a base que o governo
construiu na Câmara não é majoritária. Mostra que o que foi vendido ao
presidente, que teria uma base majoritária na Câmara, não é um dado da
realidade. Não significa que ele não tenha apoio para aprovar reformas
que modernizem o Estado brasileiro, isso ele tem. Agora, ele não tem uma
maioria política no plenário da Câmara dos Deputados.
Supondo que o Baleia Rossi vença as eleições, o senhor acha que ele pode enfrentar obstrução no início dos trabalhos?
Não, porque a base do governo acabou sendo usada pelo interesse
do candidato do presidente Bolsonaro. Acabada a eleição, acabou essa
disputa.
Mas o seu grupo construiu uma candidatura de oposição ao
governo. O que faz o senhor acreditar que esse diálogo com o Executivo
vai se dar de forma harmônica?
Não estamos em oposição a ninguém, estamos a favor da
democracia, da liberdade, do meio ambiente. O nosso campo vota
majoritariamente a favor da agenda econômica do governo. Após a
sucessão, é óbvio que a agenda econômica vai continuar sendo liberal. Eu
sempre disse que o perfil que eu acredito vencedor da Câmara vai ser
alguém que seja independente.
O senhor acha que o Arthur Lira não é um candidato que garante independência à Câmara?
Eu não vou tratar do candidato do Bolsonaro. Eu trato da
candidatura que nós defendemos. O governo muitas vezes defende pautas
que geram o conflito, o ódio na sociedade, como na pauta ambiental e de
costumes. Quando você transfere para o Congresso essas pautas, você
transfere, primeiro para a Câmara, essa polarização que não tem sido boa
para a sociedade. Temos convicção que esse bloco que nós representamos
afirma a importância e defende a independência da Câmara.
O PT fez uma reunião no dia do anúncio em que colocou
ressalvas a Baleia. Por que o Baleia, se o maior partido de oposição tem
resistência a ele?
Esse é um processo de construção política. E temos um bloco que
representa 280 parlamentares. E a representação dos 280 de forma
majoritária compreendeu que o melhor caminho seria pelo Baleia, que
começaria unificando o MDB e, dali para frente, unificaria toda a base. E
ele tem toda a condição, como o Aguinaldo [Ribeiro, do PP] tinha, de
construir uma relação com o PT, com o PSB, PDT e PC do B para que a
gente tenha todos os votos unidos da esquerda.
Há o compromisso com a oposição de não pautar privatizações?
Não. Não há compromisso de deixar de pautar matéria alguma.
Esse bloco que o senhor formou pode ser um ensaio para 2022?
A nossa demonstração é que a gente pode dialogar, que a
gente pode sentar numa mesa, divergir, mas construir consensos,
construir projetos que, de fato, caminhem no interesse da sociedade
brasileira. Acho que isso é o que esse bloco mostra, que a gente é
capaz, mesmo tendo muitas diferenças em muitos temas, de sentar numa
mesa e discutir a nossa democracia e o interesse do Brasil. Eu acho que é
um sinal forte de que parte desse bloco pode estar junto em 2022. Nós
demos o grande passo para reduzir de vez a radicalização da política
brasileira. O Winston Churchill tem uma frase muito interessante:
‘Aqueles que nunca mudam de ideia nunca mudam nada’.
E, nesse sentido, o senhor acha que é difícil ter uma chapa com a oposição…
Olha, nós temos uma grande dificuldade na pauta econômica,
mas nada que não possa ser pactuado para uma eleição em 2022 e parte
desse bloco possa estar junto.
E quem se encaixa melhor nesse perfil pensando em 2022? O Luciano Huck ou o João Doria?
Acho que são dois ótimos nomes. Tem o próprio ACM Neto
[presidente do DEM] que é um ótimo nome, tem o Ciro Gomes [PDT] que é um
ótimo nome, o Paulo Câmara [PSB] está terminando o governo [de
Pernambuco], quem sabe ele também queira participar. Então acho que a
gente tem que dialogar.
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