Não há verdade porque não se diz nada além da quantidade de casos e de
mortes. Não se informa ao público quantas pessoas, entre as milhares que
contraem a covid-19, se recuperam com o tratamento. J. R. Guzzo:
Nada mais fácil para governos e para a mídia, controlada ou aliada a
eles, do que jogar um número, ou quantos números quiserem, em cima da
população – e tentar fazer as pessoas acreditarem, por causa da montanha
de algarismos acenados diante de seus olhos, exatamente naquilo que
governos e mídia querem que elas acreditem. A ideia, aí, é a seguinte:
aritmética é aritmética, não é mesmo? Contra números não há discussão –
naturalmente, se eles forem os nossos números. Quantas pessoas realmente
acreditam? O quanto estão mesmo acreditando? Durante quanto tempo vão
acreditar? – bem, isso já são outros 500. Mas quem manda na divulgação
dos números vai sempre apostar na lavagem cerebral do público através da
aritmética. Distorça os fatos agora. Depois se vê como é que fica.
É o que está acontecendo no Brasil nestes tempos de covid-19. Ao
contrário do que em geral se pretende, há discussão, sim, contra
números. Eles podem ser moldados de forma a poderem significar qualquer
coisa, e por isso mesmo só podem ser levados a sério se forem expostos
com real honestidade – ou seja, com o objetivo de apresentar fatos, e
não de defender crenças, convicções ou interesses. No caso da epidemia, a
intenção predominante é convencer a população de que a situação é
sempre muito pior do que se pode imaginar, e tende a ficar pior ainda
para o futuro. Resultado: “fique em casa”, dê apoio à paralisação do
país e não pergunte, jamais, se as coisas têm de ser assim mesmo.
São Paulo é um dos melhores exemplos desse terrorismo aritmético,
onde autoridades e a maioria dos meios de comunicação se recusam a
relacionar os números da doença com quaisquer outros – e números
isolados, apresentados sem nenhuma comparação com nada, podem se tornar
ilusórios. Os paulistas, nos últimos dias têm recebido mensagens do
governo em seus celulares, dizendo que há “558 mortos” no Estado (até o
momento em que a mensagem foi enviada) e que nenhum outro lugar do
Brasil registra números piores. Não há mentira nesses dados. Mas também
não há verdade.
Não há verdade porque não se diz nada além da quantidade de casos e
de mortes. Não se informa ao público quantas pessoas, entre as milhares
que contraem a covid-19, se recuperam com o tratamento. Não se diz que
em 2018 morreram quase 300.000 pessoas no Estado de São Paulo, por todas
as causas, o que dá 25.000 mortes a cada mês. Não se diz que morreram
em todo o Brasil, só de doenças cardíacas, os mesmos 300.000 seres
humanos, ou que os acidentes de trânsito chegam a matar cerca de 500
paulistas num único mês. Não se diz que 75% dos municípios do Estado não
tiveram, até agora, um único morto pelo vírus. Não se diz que a
proporção de mortos pela epidemia na população de São Paulo é de
0,000013%. Não se diz que até ontem, domingo, a Bélgica, com menos de 12
milhões de habitantes, contava quase 4.000 mortes contra as 1.220 do
Brasil – mais do que o triplo, para uma população 18 vezes menor.
Números podem ter intenções. No caso do Brasil de hoje é certo que
têm. Talvez não haja demonstração tão clara disso quanto a atitude de
acusar quem faz as comparações acima de “amigo da morte”, e coisas ainda
piores. Apresentar a realidade, só isso, virou crime político neste
país.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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