sábado, 4 de janeiro de 2020

É preciso lembrar que juros baixos não são permanentes, é tudo uma questão de momento


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Charge do Alves (Folha de S. Paulo)
Mathias Erdtmann
Tem me preocupado essa confiança do governo nos juros baixos eternos  e na crença exagerada de que esse patamar é produto do esforço governamental. Também é evidente a especulação que está ocorrendo, fruto do excesso de capital não produtivo e fictício produzido pelo juros baixos.
É conhecido o fato de uma relevante parcela do progresso brasileiro durante o governo Lula-Alencar tenha acontecido por conta do país surfar na onda de valorização de produtos minerais, de energia e alimentação (commodities).
OPORTUNIDADE PERDIDA – Também é lugar comum o entendimento de que o mesmo governo falhou em não aproveitar estes excedentes para construir mudanças mais profundas na sociedade brasileira, como o investimento em educação técnica e na modernização e agilização do ambiente de negócios.
Pensando sobre o ano de 2019, sobretudo no mês de dezembro, vimos uma euforia na Bolsa de Valores, com todas as classes de ativos inflando, com um único catalisador: juros baixos.
No entanto, esses juros baixos são muito menos efeito de ações de governo, e muito mais efeito das ondas internacionais. Estamos agora surfando nas ondas dos juros baixos, e sem isso a  economia não teria crescido o pouco que cresceu (de pouco mais de 1% em números absolutos e praticamente 0% em renda per capita).
DÍVIDA GLOBAL – Metade da dívida global já opera nos juros reais negativos (Estados Unidos, União Europeia, Japão…). Não me entendam mal, sou fã do juros zero, sendo admirador do visionário alemão Silvio Gesell, idealizador da Economia Livre, que seria constituída de três elementos: (1) Dinheiro Livre: que “apodreceria” por definição, e teria validade igual à comida; (2) Terra Livre: bens de produção não poderiam ser comprados, só alugados; (3) Troca Livre: imposto zero no comércio e liberação do comercio internacional.
Porém, o que acontece é que sou mais fã ainda da precaução, a nos indicar que talvez precisemos nos preparar para o caso de juros baixo não serem para sempre.
Basta lembrar o choque dos anos 80, quando os EUA aumentaram paulatinamente os juros para além dos 15% ao ano, congelando o Brasil por 20 anos, e tudo culminou na espiral hiperinflacionária insana nos governos Sarney e Collor.
SURFANDO DE NOVO – Enfim, estaria o governo Bolsonaro meramente surfando no juros baixo? Não deveria aproveitar para se preparar como José do Egito nos ensinou? Outros países têm se preparado, ao longo dos últimos dois anos, fazendo estoques inimagináveis de ouro (vide Rússia, China, Alemanha, Polônia), enquanto Brasil mantém suas reservas no menor patamar per capita do mundo (possivelmente perde somente para o Canadá).
Ao mesmo tempo, o discurso é que o dinheiro de investimento estrangeiro vai fazer o Brasil melhorar. A preparação que vemos no mundo todo, mesmo nos EUA, é a antítese destes movimentos de globalização (“Economia globalizada moderna: fora o ouro, viva o Comex!”).
O resto do mundo, em seu feudalismo pós-moderno, preparando catapultas e guardando o Tesouro Nacional, e nós como ovelhinhas esperando o pastor, que está lá dentro, no burgo.
ESPECULAÇÃO – Não sugiro estas medidas de recrudescimento de forma específica ou absoluta (na verdade, não faço ideia da solução para o problema), mas, no geral, acho que não estamos preparados.
Temos 60 milhões de cidadãos que estão operando na dívida, junto com municípios, estados, empresas (das MEIs às gigantes). Quem tem algum recurso, está botando na máquina especulativa, ao invés de alimentar a máquina produtiva.
Já dizem até que 2019 foi bom, porque a Bolsa bateu recorde, entre o Natal e o Ano Novo. Como é verão, nada melhor que uma praia e um pouco de surfe. De preferência, com juros baixos.

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