Ninguém esperaria que
Trump fosse sóbrio ao anunciar a morte do líder do ISIS; felizmente, ele
correspondeu a todas as expectativas. Vilma Gryzinski:
Um teste simples e
imediato para descobrir quem acha mais importante a fritura de Donald
Trump do que a implosão de Abu Bakr al-Baghdadi: quem escrever que a
morte do criador do Estado Islâmico “não muda nada”, está no primeiro
time.
É claro que que o chefe de todos os terrorismos contemporâneos, acossado e escondido, já estava praticamente fora do jogo.
Com as grandes
derrotas infligidas ao ISIS no território que, espantosamente,
conquistou, da Síria ao Iraque, e o monitoramento constante que impediu
qualquer tipo de comunicação não pessoal, o iraquiano barbudo tinha
pouca margem de ação.
Mas como não
considerar que um dia dificilmente pode começar de forma melhor do que
saber que ele foi localizado, bombardeado e autoexplodido no fundo de um
túnel, “como um cachorro”, na definição de Trump?
Se alguém acha que
Trump faria a expressão compungida e sóbria de Barack Obama ao anunciar
que Osama Bin Laden tinha sido morto numa operação de forças especiais
no Paquistão, provavelmente passou os últimos três anos em outro
planeta.
Trump deitou e rolou. Baghdadi estava “chorando e gritando” ao se enfiar no túnel sem saída.
“Arrastou três de seus filhos pequenos com ele. Foram arrastados para a morte certa.”
“Foi acuado por cães. Acionou o colete (explosivo), matando a si mesmo e os três filhos.”
“Era um homem
repulsivo e depravado e agora se foi. Era perverso e violento, e morreu
de forma perversa e violenta, como um covarde fugindo e chorando.”
Algo a acrescentar?
Ah, sim. Só um cão da equipe americana sofreu ferimentos.
Até Donald Trump deve
saber que, para um muçulmano radical, morrer caçado por um cachorro,
animal considerado impuro, acrescenta uma humilhação adicional.
Baghdadi, nome de
guerra indicando sua procedência, Bagdá, como ficou comum entre os
adeptos dos ISIS, tinha apenas 48 anos, apesar da barba branca tingida
com hena, uma imitação do profeta Maomé.
Como Bin Laden,
conseguiu escapar de seus inimigos – todos os países ocidentais, o
regime sírio, o Irã, o Iraque, o Hezbollah, a Rússia e mais um punhado
de grupos locais, para ficar nos mais importantes – durante quase uma
década.
Não tinha a estatura
do mentor do Onze de Setembro e foi ridicularizado por se proclamar o
califa, ou líder de todos os muçulmanos, indo além das suas capacidades,
e ainda por cima com um relógio de luxo no pulso.
Mas com certeza teve
uma influência enorme, primeiro sobre iraquianos sunitas perseguidos
depois da intervenção americana que derrubou Saddam Hussein, e depois
sobre desajustados, fanáticos, bandidos e assassinos de praticamente
todos os países onde existem comunicadas muçulmanas.
Seu grito de guerra,
em muitos sentidos similar ao de Bin Laden, com a diferença de que
conquistou um “califado” do tamanho da Inglaterra, ecoou pelo mundo.
Não só a ralé
radicalizada em prisões do Oriente Médio e da Europa, mas jovens e
adultos com alto nível de instrução, engenheiros eletrônicos, médicos e
outros profissionais qualificados, largaram tudo e foram combater em
nome da instauração de um reinado perfeito, onde política e religião
eram uma coisa só.
E. claro, podiam
praticar as maiores atrocidades. Degolar jornalistas americanos e
europeus, decapitar soldados sírios e iraquianos, massacrar cristãos dos
dois países, destruir antiguidades pré-islâmicas, lançar homossexuais
do alto de prédios, incinerar pessoas vivas, raptar e estuprar meninas e
mulheres da minoria religiosa yazidi, a lista de horrores é
interminável.
Baghdadi teve um
privilégio extra. Ganhou como “prêmio” a jovem americana Kayla Mueller,
que tinha ido para a Síria na louca ilusão de ajudar vítimas da guerra.
Instalou Kayla na casa de um capanga, Abu Sayyad. Cada vez que passava por lá, estuprava-a.
A história foi
contada pela mulher de Sayyad, capturada no conflito. Kayla morreu num
bombardeio americano contra bases do ISIS. Tinha 26 anos.
A marca maldita de
Baghdadi se estendeu pela Europa, onde todos os atentados terroristas
praticados por muçulmanos radicais nos últimos anos tiveram origem na
sua ideologia religiosa extremista.
É uma ideologia recorrente, que não vai desaparecer por causa da morte de um líder.
Da mesma maneira,
seria tolice imaginar que Trump, por mais que deseje, vá ser beneficiado
a longo prazo pela operação que levou Baghdadi ao encontro das 72
virgens prometidas aos mártires.
Se houver motivos comprovados para um impeachment, Trump vai ser impichado, com ou sem Baghdadi.
Mas é um tipo de
castigo perfeito ver uma praga das dimensões do pai do ISIS morto num
túnel sem saída, com cachorros no encalço. E ainda por cima trolado por
Trump.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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