Um debate sobre drásticas alterações nas regras dos planos de saúde pode entrar na pauta do Congresso em breve. Em uma minuta de projeto de lei enviada ao presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), as operadoras propõem mudanças como redução das coberturas, flexibilização para reajustes de mensalidades mais de uma vez por ano, peso maior na cobrança aos idosos e critérios menos rígidos para os ressarcimentos ao SUS, além de retirar da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) a regulação do setor.
Preocupado com a proposta, o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) publicou a minuta do projeto com uma análise crítica dos 89 artigos que as empresas querem alterar na Lei dos Planos de Saúde (Lei 9.656/1998). Segundo especialistas da área, as mudanças podem prejudicar 47,2 milhões de clientes no país, sendo 10,8% deles concentrados em Minas.
Em nota técnica, o Idec considera o projeto como “danoso ao SUS que, já subfinanciado, passaria a arcar com os custos da desassistência promovida pela nova legislação e perderia recursos com o fim do ressarcimento”.
O professor Mário Sheffer, do departamento de Medicina da USP e da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), argumenta que a perda de cerca de três milhões de clientes das operadoras, que migraram para o SUS de 2014 a 2018, segundo a ANS, motivou as empresas a batalhar por um projeto de lei mais draconiano.
“É uma ideia de apagar o papel da ANS e criar um mercado hiper-fragmentado, no qual o cliente irá ter menor cobertura e gastará mais”, diz Sheffer.
Uma das críticas do Idec é a liberação para as operadoras oferecerem pacotes avulsos, como de atendimento básico, consultas médicas e diagnóstico. Hoje, a ANS obriga os planos a atenderem ao Cadastro Internacional de Doenças (CID), emergências ambulatoriais, hospitalares e ações de tratamento e reabilitação.
Prazo para consultas
Outro ponto delicado é a retirada do prazo máximo de sete dias para marcar consultas de especialidades básicas, como pediatria e cirurgia geral, sem qualquer sanção às operadoras.
Para a presidente do Conselho Diretor do Idec, Marilena Lazzarini, as mudanças também restringem os direitos dos idosos e afetam os gastos do SUS, que deverá continuar atendendo pacientes que tenham planos privados, mas só receberá o ressarcimento nos casos em que o paciente for efetivamente transferido da rede pública para a particular.
“As operadoras querem proibir idosos de aderirem a planos coletivos, até seis vezes mais baratos do que os individuais. O SUS também seria prejudicado porque teria que atender à rede privada, mas sem necessariamente receber por isso”, avalia Lazzarini.
Procurado, o Ministério da Saúde informou que não comenta projetos de lei. A Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) não se posicionou. Já a ANS informou que “reconhece apenas projetos que estão em tramitação no Congresso, não cabendo comentar suposta proposta advinda do setor regulado”. O órgão destacou ainda que “a legislação do setor e a regulamentação promovida pela ANS trouxeram importantes conquistas para o consumidor”.
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Lucros
Enquanto as operadoras de planos de saúde reclamam a perda de clientes nos últimos anos, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) publicou, em julho, um estudo evidenciando um aumento na média de consultas realizadas por indivíduo no ano passado e um crescimento de 55,6% no lucro dessas empresas nos últimos seis anos.
Em 2018, foram 1,4 bilhão de procedimentos como consultas, exames e internações, expansão de 5,4% em relação a 2017. Enquanto isso, o número de beneficiários de planos de saúde privados permaneceu praticamente estável — de 47,15 milhões para 47,26 milhões neste período.
Segundo o Idec, o aumento de procedimentos por indivíduo está refletido diretamente no lucro líquido das operadoras, saltando de R$ 109 bilhões em 2013 para R$ 196 bilhões em 2018, de acordo com dados da ANS