quinta-feira, 29 de agosto de 2019

Supremo pode limitar efeitos da decisão da 2ª Turma para conter corrida por pedidos de anulação


Charge do Cazo (blogdoaftm.com.br)
Carolina Brígido
O Globo
Para evitar anulações em massa em processos da Lava-Jato, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) estudam restringir a aplicação do entendimento firmado no caso Aldemir Bendine. Na última terça-feira, dia 27, a Segunda Turma anulou a condenação ao ex-presidente da Petrobras e do Banco do Brasil porque o então juiz Sergio Moro abriu um único prazo para todos os réus apresentarem alegações finais. Para os ministros da Segunda Turma, o correto é primeiro a manifestação de réus delatores e, depois, dos delatados. A solução seria, no julgamento de novos recursos, restringir esse entendimento apenas aos réus que apresentaram recurso à primeira instância contra a ordem de alegações finais. Para os demais réus, a interpretação seria de que, se não recorreu na fase anterior, é sinal de que estava satisfeito com a ordem processual aplicada.
A discussão sobre alegações finais será levada a Plenário. Na quarta-feira, dia 28, o ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato, enviou para a análise dos 11 ministros o pedido de anulação da sentença do ex-gerente de Empreendimentos da Petrobras Márcio de Almeida Ferreira, condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Ferreira pede a anulação de sua sentença pelo mesmo motivo que levou à suspensão da condenação de Bendine. No caso de Luiz Inácio Lula da Silva, apenas no processo relativo ao Instituto Lula, a defesa apresentou esse recurso específico à primeira instância, ao Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região e ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).
RECURSO – Ainda nesta quarta-feira, os advogados do ex-presidente apresentaram novo recurso ao STF sobre o tema. Nos processos sobre o sítio em Atibaia e o triplex do Guarujá, este argumento não foi apresentado em instâncias inferiores, apenas ao STF. O entendimento favorável a Bendine detonou uma corrida de advogados de réus e condenados na operação para se beneficiar da decisão. Somente nos casos julgados pela Justiça Federal em Curitiba, pelo menos 32 sentenças poderão ser anuladas. Elas envolvem 143 réus, ou 88% dos 162 condenados até hoje pela operação no Paraná.
“A força-tarefa confia que o Supremo reverá essa questão, inclusive para restringir a sua aplicação para casos futuros ou quando demonstrado prejuízo concreto, de modo a preservar os trabalhos feitos por diferentes instâncias em inúmeros casos de acordo com a lei e entendimento dos Tribunais até então vigente”, escreveram os procuradores da Lava-Jato em nota divulgada nesta quarta. Surpresa, a Procuradoria-Geral da República (PGR) analisa apresentar um recurso para tentar minimizar um possível efeito cascata. Raquel Dodge solicitou que o grupo de trabalho da Lava-Jato no STF discuta as alternativas jurídicas para um eventual recurso. Uma das estratégias é levantar precedentes de outros julgamentos do STF para ver como os ministros se posicionaram contra esse mesmo argumento utilizado pela defesa de Bendine.
DIVERGÊNCIAS – Juristas ouvidos pelo o Globo analisaram a decisão. O ex-presidente do STF Carlos Velloso discordou do entendimento, lembrando que a Lei de Organizações Criminosas, que regulamenta a delação premiada, não exige períodos distintos para as alegações finais de delatores e delatados. “Nem o Código Penal, nem a lei da colaboração premiada fazem esta distinção que o Supremo adotou. Penso que não é possível o tribunal, invocando o direito de defesa, ampliar norma processual”, afirmou.
Ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Gilson Dipp explicou que, com a decisão, o Supremo entendeu que delação é prova — e não meio para a obtenção delas —, e por isso réus delatores deveriam entregar as alegações finais antes. “A decisão deve servir de precedente e vai ser sim utilizada pelas defesas nos processos que guardarem semelhança fática e jurídica. Mas isso vai ser analisado caso a caso”, declarou. O professor de processo penal na UFRJ Francisco Ortigão concordou com a decisão, que, para ele, privilegia o direito da ampla defesa: “O que os ministros fazem é aplicar o princípio do contraditório, que é assegurado a todos os acusados em geral. Tem que se oportunizar ao réu delatado fazer a desconstrução da imputação feita”. 

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