Foto: Reprodução/YouTube
A deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP)
Se 2019 é o ano em que tudo pode acontecer, por que não uma
aliança entre uma das mais aguerridas bolsonaristas na Câmara, Carla
Zambelli (PSL-SP), e um dos muques da esquerda por lá, Marcelo Freixo
(PSOL-RJ)? E para tomar uma posição, aliás, que bate de frente com a do
governo Jair Bolsonaro sobre o tema: o cultivo de maconha para uso
medicinal no Brasil. O presidente já deixou bem claro que é contra.
Disse na quinta-feira (1) que se alinha a seu ministro da Cidadania,
Osmar Terra, no assunto. “Estou na linha dele nessa questão da maconha.
Ele diz que abre as portas para o plantio de maconha em casa. Então
seria bom conversar com ele. Ele é médico”. O tema há anos é cruzada
pessoal de Terra. Em 2014, o então deputado escreveu artigo em que
dizia: “Uma coisa é usar determinada molécula de uma planta para fins
medicinais, outra coisa é usar isso como desculpa para se drogar. Usar
drogas nunca foi nem será tratamento para qualquer doença, muito pelo
contrário”. A discussão esquentou após a Anvisa (Agência Nacional de
Vigilância Sanitária) –que é da alçada de outra pasta, a da Saúde–
colocar em debate a proposta de liberar o plantio de Cannabis,
matéria-prima para remédios que ajudam no tratamento de males como
epilepsia e Parkinson. Zambelli diz entender a desconfiança de Bolsonaro
e Terra. Afinal de contas, ela já esteve no lugar deles. A percepção
sobre o tabu entre conservadores como ela mudou após entrar em contato
com famílias que enfrentavam doenças raras e precisavam de medicina à
base de canabidiol, um derivado da Cannabis que não dá “barato” por não
ser psicoativo. Estudou o tema, pois “tinha um pouco de preconceito em
relação a isso”, afirma Zambelli, que ri ao perguntar se já experimentou
maconha (“foi engraçada essa pergunta”). Ela é contra o uso recreativo
da planta. “Estudando o caso, descobri que a gente tem legislações super
interessantes no mundo todo”. O exemplo de Israel, um país pelo qual
bolsonaristas nutrem particular afeto, pareceu-lhe bom. O governo local
tem inclusive uma lei que permite a exportação da Cannabis para fins
terapêuticos. A última eleição geral israelense teve até um candidato de
extrema-direita que pregava a legalização da erva, Moshe Feiglin.
Zambelli vive às turras com o partido de Freixo. Já tuitou que, se o
PSOL “não sabe brincar, não deve descer pro play”, após desavença com o
presidente da sigla, Juliano Medeiros. Também já foi alvo de psolistas
por comentários como uma reação sua ao fim das curtidas no Instagram:
“Tudo para a gorda feminista peluda do cabelo roxo não ficar deprimida
ao ver o desempenho da coleguinha na rede”. Mas levantou a bandeira
branca pela causa verde. “Nesse meio do caminho, vendo que existem
muitos preconceitos com relação a isso [maconha na medicina], pensei em
juntar esquerda e direita numa coisa que poderia ser algo comum pra todo
mundo, independentemente de ideologias, enfim”. Foi ela que procurou
Freixo. A ideia inicial era unir forças para assinarem juntos um projeto
de lei que autorizasse a plantação da Cannabis para pesquisa científica
e elaboração de remédios. A esquerda que depois corresse atrás de outra
proposta legislativa que abordasse o consumo recreativo, diz. Como já
havia um projeto similar, do colega Fábio Mitidieri (PSD-SE),
tramitando, Zambelli e Freixo deixaram de lado a ideia de protocolar um
texto novo. Mas estarão do mesmo lado numa comissão que discutirá o
tema. “Desde o início o foco do projeto era permitir o uso medicinal, o
que já ocorre em vários lugares do mundo. Apesar das nossas diferenças
ideológicas, é possível ter acordo sobre isso, porque é uma medida
sensata que vai melhorar a vida de milhares de pessoas”, afirma Freixo.
“Hoje, só é possível usar a substância por meio de ação judicial, o que é
caro e burocrático. O uso recreativo nunca esteve no horizonte dessa
proposta”. O deputado do PSOL lembra que ele e Zambelli integram o mesmo
Grupo de Trabalho que analisa as propostas do ministro da Justiça,
Sérgio Moro, para Segurança Pública e combate à corrupção. Viu que um
diálogo era possível. “Nos aproximamos aos poucos, depois que eu prestei
solidariedade e manifestei minha preocupação após ameaças ao filho
dela”. A parlamentar já recebeu, em seu email oficial, uma ameaça de
estupro endereçada a seu filho menor de idade. “Sabemos que você anda
com escolta, mas o G., não.” Em anexo, uma foto dela com o garoto. Para
Zambelli, descobrir que várias mães dependiam de importação ou produção
caseira de maconha para zelar por filhos doentes foi o ponto de virada.
“Acho que é uma questão de saúde. Tem que estar acima de tudo: religião,
política, tudo mais”.
Folhapress
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