Sobram leis. Por
exemplo, foram editadas 23 legislações federais a cada dia útil dos
últimos 29 anos, contados a partir da promulgação da Constituição de
1988 — informa em estudo o Instituto Brasileiro de Planejamento e
Tributação.
A coletânea federal
beira seis milhões, com média de três mil palavras cada uma. Essa conta
inclui 103 emendas constitucionais, 103 leis complementares, 5.731
ordinárias, 6.903 Medidas Provisórias e 12.292 decretos com 139.506
anexos (de portarias a pareceres).
Tal avalanche produz
efeitos paradoxais. Um deles: pessoas e empresas já não têm certeza
sobre qual lei está em vigor. Mudou-se o teor de 95,87% de toda
legislação produzida, demonstra a pesquisa.
Avança-se para o
extremo da excentricidade. Leis não faltam, mas cresce a percepção sobre
a ausência de organização e de garantia da ordem social, numa forma de
anomia, ou anarquia.
Seria natural o
protagonismo do Judiciário nesse oceano de incertezas. O problema, hoje,
é a incapacidade dos juízes de explicar ao público as suas decisões.
Tem-se no Supremo Tribunal Federal um exemplo. Passou a ser identificado
como o rei da confusão porque os juízes, políticos vestidos de toga,
resolveram contribuir para o aumento do risco do improvável, inclusive
na campanha eleitoral.
É reveladora a pauta
do julgamento previsto para amanhã. Na essência, decide-se o destino da
Operação Lava-Jato. Na prática, essa resolução começou meses atrás,
quando os Supremos — definição bem-humorada de um dos 11 integrantes —
decidiram lustrar seu poder sobre a validade dos acordos de delação
premiada realizados pelo Ministério Público com réus confessos e no
exercício do direito de defesa.
Amanhã, Lula é o nome
na capa do processo que pode levar à reversão da Lava-Jato,
modificando-se orientação do tribunal há pouco estabelecida sobre a
execução provisória da pena imposta em segunda instância judicial. O
resultado está visível no horizonte: isso pode aumentar a instabilidade
política e institucional.
O problema é como
explicar à sociedade que a decisão tomada pelo STF dois anos atrás era
constitucional, mas neste abril deixaria de ser. E, sendo assim, é
preciso invertê-la para que se torne compatível com a Constituição. Ou
ainda, como explicar que a nova orientação, se adotada, não seria
passível de outra mudança dentro de 24 meses ou nas 24 horas seguintes,
por decisões individuais dos Supremos.
Na tarde do Sábado de
Aleluia, o clima de feriado no Supremo foi interrompido por “medida
urgente” da Procuradoria-Geral da República, “em nome da segurança
jurídica que exige o pleito eleitoral de 2018 e em defesa da ordem
jurídica.”
Com elegância, a
procuradora-geral Raquel Dodge pediu imediata revogação de sentença
provisória do juiz Dias Toffoli. Pouco antes, ele anulara uma decisão
soberana do Senado — a cassação do mandato e dos direitos políticos do
ex-senador goiano Demóstenes Torres por conduta antiética, crimes de
corrupção e lavagem de dinheiro.
Toffoli submeteu o
Senado à sua toga, cassando-lhe a autonomia constitucional. Ampliou a
margem de insegurança na disputa eleitoral, em benefício de um político
expulso do Congresso segundo as regras da Constituição.
No país onde sobram leis, multiplica-se a instabilidade.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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