terça-feira, 3 de abril de 2018

Os Supremos


É ampla a legislação em vigor, mas cresce a percepção sobre a ausência de organização e de garantia da ordem social. Sobram leis e cresce a instabilidade, com a ajuda do STF. Artigo de José Casado, via jornal O Globo:
Sobram leis. Por exemplo, foram editadas 23 legislações federais a cada dia útil dos últimos 29 anos, contados a partir da promulgação da Constituição de 1988 — informa em estudo o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação.

A coletânea federal beira seis milhões, com média de três mil palavras cada uma. Essa conta inclui 103 emendas constitucionais, 103 leis complementares, 5.731 ordinárias, 6.903 Medidas Provisórias e 12.292 decretos com 139.506 anexos (de portarias a pareceres).

Tal avalanche produz efeitos paradoxais. Um deles: pessoas e empresas já não têm certeza sobre qual lei está em vigor. Mudou-se o teor de 95,87% de toda legislação produzida, demonstra a pesquisa.

Avança-se para o extremo da excentricidade. Leis não faltam, mas cresce a percepção sobre a ausência de organização e de garantia da ordem social, numa forma de anomia, ou anarquia.

Seria natural o protagonismo do Judiciário nesse oceano de incertezas. O problema, hoje, é a incapacidade dos juízes de explicar ao público as suas decisões. Tem-se no Supremo Tribunal Federal um exemplo. Passou a ser identificado como o rei da confusão porque os juízes, políticos vestidos de toga, resolveram contribuir para o aumento do risco do improvável, inclusive na campanha eleitoral.

É reveladora a pauta do julgamento previsto para amanhã. Na essência, decide-se o destino da Operação Lava-Jato. Na prática, essa resolução começou meses atrás, quando os Supremos — definição bem-humorada de um dos 11 integrantes — decidiram lustrar seu poder sobre a validade dos acordos de delação premiada realizados pelo Ministério Público com réus confessos e no exercício do direito de defesa.

Amanhã, Lula é o nome na capa do processo que pode levar à reversão da Lava-Jato, modificando-se orientação do tribunal há pouco estabelecida sobre a execução provisória da pena imposta em segunda instância judicial. O resultado está visível no horizonte: isso pode aumentar a instabilidade política e institucional.

O problema é como explicar à sociedade que a decisão tomada pelo STF dois anos atrás era constitucional, mas neste abril deixaria de ser. E, sendo assim, é preciso invertê-la para que se torne compatível com a Constituição. Ou ainda, como explicar que a nova orientação, se adotada, não seria passível de outra mudança dentro de 24 meses ou nas 24 horas seguintes, por decisões individuais dos Supremos.

Na tarde do Sábado de Aleluia, o clima de feriado no Supremo foi interrompido por “medida urgente” da Procuradoria-Geral da República, “em nome da segurança jurídica que exige o pleito eleitoral de 2018 e em defesa da ordem jurídica.”

Com elegância, a procuradora-geral Raquel Dodge pediu imediata revogação de sentença provisória do juiz Dias Toffoli. Pouco antes, ele anulara uma decisão soberana do Senado — a cassação do mandato e dos direitos políticos do ex-senador goiano Demóstenes Torres por conduta antiética, crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.

Toffoli submeteu o Senado à sua toga, cassando-lhe a autonomia constitucional. Ampliou a margem de insegurança na disputa eleitoral, em benefício de um político expulso do Congresso segundo as regras da Constituição.

No país onde sobram leis, multiplica-se a instabilidade.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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