China,
União Soviética e comunistas coreanos provocaram a guerra que matou
quatro milhões de pessoas e produziu alguns dos mais abomináveis tiranos
vermelhos. Texto de Vilma Gryzinski, via Veja.com:
Jovial,
simpático e sereno, o Kim Jong-Un que cruzou a linha do armistício para
trocar amabilidades de importância histórica e se comprometer a acabar
com uma guerra que começou há 65 anos parecia, literalmente, outra
pessoa.
Onde
estava o tirano rubicundo, com comportamento de adolescente problema,
que mandou fuzilar o tio e envenenar com gás tóxico o irmão, entre
inúmeras atrocidades que continuaram a manter a população norte-coreana
em situação equivalente à de escravidão, tal como fizeram seu pai e seu
avô?
As forças que conspiraram para o avanço de tirar o fôlego ainda serão estudadas por muito tempo.
Por
enquanto, é possível dizer que pesaram a pressão americana, a disposição
positiva da China e sabe-se lá mais que ideias passaram pela cabeça do
jovem ditador hereditário – incluindo o desmoronamento do Monte Mantap, o
maciço de mais de dois mil metros de altura onde a Coreia do Norte
fazia testes nucleares.
Os
testes do tipo eram feitos em túneis escavados no coração rochoso da
montanha e revestidos de concreto. O último deles foi em setembro
passado, com uma carga de 250 quilotons, 17 vezes mais que a bomba de
Hiroshima.
Desde o
tratado de 1996 que acabou com todos os tipos de testes subterrâneos, de
superfície ou marítimos, só a Coreia do Norte continuou a testar armas
nucleares, mais como instrumento de chantagem geopolítica do que por
necessidade.
Ao todo,
desde a primeira comprovação prática do apocalítico poder de destruição
dos átomos partidos de urânio ou plutônio, em 16 de julho de 1945, no
segredo do projeto Manhattan em Los Alamos, foram feitos 2056 testes
nucleares pelos países detentores da mãe de todas as bombas.
Quando a
guerra da Coreia começou, em junho de 1950, a União Soviética e a China
recém- conquistada pelos maoístas tinham exatamente zero bombas
atômicas.
Mesmo
assim, desafiaram a única potência nuclear, os Estados Unidos, que
haviam usado a vantagem estratégica para antecipar o fim da guerra com o
Japão, ao arquitetar, armar e desfechar os invasores norte-coreanos na
tentativa de unificar na marra o país, já dividido na prática, mas até
então sem conflito.
“Está
claro que os Estados Unidos da América desviaram a atenção da Europa
porque estão ocupados demais do Extremo Oriente”, escreveu Stálin numa
carta a Klement Gottwald, presidente da Checoslováquia e assíduo nos
jantares em que o czar vermelho submetia a cúpula comunista a debates e
humilhações.
“Isso nos dá uma vantagem no equilíbrio global de poder? Indubitavelmente, dá.”
O
telegrama escrito dois meses depois de desfechada a invasão e revelado
publicamente em 2005, colabora para a teoria de que Stálin provocou
deliberadamente o envolvimento dos Estados Unidos.
Gottwald,
golpista e rematado assassino de comunistas, como seu ídolo (tão sabujo
que morreu na volta do enterro de Stálin), havia perguntado por que a
União Soviética tinha escolhido não participar da reunião do Conselho de
Segurança da nascente ONU que aprovou o envio de tropas à Coreia para
enfrentar a invasão.
Como o
passado é constantemente reescrito, por bem ou mal intencionados, a
maquinação de Stálin pode ser apresentada como uma manobra habilíssima –
os Estados Unidos realmente se enrolaram na guerra da Coreia – ou como
uma burrice fenomenal.
Em qualquer das duas opções, quatro milhões de vidas foram tragadas pelo conflito, uma ninharia para os padrões stalinistas.
E só não
houve outro holocausto nuclear por causa de Harry Truman. Juiz de
primeira instância criado na roça e catapultado à presidência nos
momentos finais da II Guerra Mundial com a morte de Franklin Roosevelt,
ele não quis repetir a gravíssima decisão que tomou, para evitar um
morticínio maior ainda no Japão, de mandar jogar as duas primeiras e
únicas bombas atômicas jamais usadas.
Truman
chegou a aprovar o deslocamento de bombas atômicas para o Extremo
Oriente, mas não aprovou seu uso. Por causa disso, demitiu um dos
maiores generais da história americana, Douglas MacArthur, com todas as
medalhas conquistadas em campo de batalha.
O plano
do general, de desmantelar completamente as forças chinesas que
reforçavam a invasão norte-coreana, foi descrito por ele mesmo: “Eu
teria jogado 30 ou 50 bombas atômicas táticas. Elas destruiriam a força
aérea do inimigo em solo.”
O plano
de MacArthur incluía uma invasão por terra do exército nacionalista
chinês, recém-derrotado, sob orientação dos marines. E para evitar
futuras invasões, “um cinturão de cobalto” radiativo.
“Eu poderia ter ganhado a guerra em no máximo dez dias, com muito menos baixas que sofremos.”
Como o
general, herói de guerra, começou a ir além do que as cinco estrelas no
ombro autorizavam, Truman o demitiu. Depois, famosamente, declarou: “Eu o
demiti porque não respeitava a autoridade do presidente. Não o demiti
por ser um cretino filho da ****, embora ele seja.”
Mas Truman não “ganhou” a guerra, tecnicamente, interrompida por um armistício
Enquanto
um gênio da guerra, e da paz também, como se viu no Japão, era mandado
para o pijama, a União Soviética e a China instauraram a rede de
proteção que permitiu a permanência e sobrevivência de Kim Il Sung, avó
do baby Kim, criação de Laurenti Beria, o perverso e maquiavélico chefe
da polícia política stalinista.
Muito
tempo depois de um derrame cerebral levar Stalin e um tiro na testa
acabar com Beria, Kim Il Sung continuou reinando como uma espécie de
ditador-sol.
Pegou
todas as piores características do comunismo soviético e do maoísmo,
acrescentando muita coisa de criação própria. O culto à personalidade
virou uma espécie de religião onde Kim Il Sung era venerado como
divindade.
O
grotesco seria de dar risada (entre outras coisas, ele inventou o metrô,
a universidade e o jornalismo, dizia a incessante lavagem cerebral ) se
não fosse pela miséria que instaurou, num país já destruído pela guerra
que havia ajudado a provocar – a economia da Coreia do Sul, por
exemplo, é 40 vezes maior do que a do Norte.
As
palhaçadas tétricas prosseguiram com o filho, Kim Jong-Il, que começou a
andar com três semanas de vida e a andar com oito, escreveu mais de 1
500 livros e inventou o hambúrguer.
Kim
Jong-Un, o neto, é o melhor jogador de golfe do mundo, pilota avião sem
nunca ter feito curso, compôs músicas aplaudidas no mundo inteiro e sabe
onde vivem os unicórnios, um segredo descoberto por cientistas
norte-coreanos.
Se o
preço a pagar por um acordo de paz que interrompa o programa nuclear
bélico for dizer “Sim, meu garoto, você é tudo isso e muito mais”, que
tragam os unicórnios.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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