Coluna de Carlos Brickmann, publicada hoje em diversos jornais do país - e, aqui, via Chumbo Gordo:
Um grande artista,
Vicente Leporace (de Franca, como este colunista), assinava seu programa
na Rádio Bandeirantes como “Vicente Leporace Furtado”. Achava com razão
que todo brasileiro deveria usar o sobrenome.
Uma queixa comum
contra as tímidas tentativas de reformas é que, se gastássemos menos com
os políticos, haveria dinheiro para aposentadorias, saúde, educação,
segurança. Não é bem assim: o rombo é mais em cima. Mas dói saber que,
enquanto Estados atrasam o salário dos funcionários, enquanto não há
dinheiro para manter os hospitais em boas condições de uso, enquanto
faltam verbas para equipar direito a Polícia, há juízes – que têm
vencimentos próximos de R$ 30 mil mensais – que dão um jeito de receber
até mais de R$ 100 mil, fora carro e motoristas; que todos os
parlamentares federais multiplicam seus salários com penduricalhos
vários, incluindo assessores que lhes prestam serviços privados; que o
presidente da República tem um palácio para trabalhar, o Planalto, dois
para morar, o Alvorada e a Granja do Torto, e habita um terceiro, o
Jaburu. Cortar essas despesas inúteis não resolve os problemas
nacionais. Mas dá o exemplo: que sente um cidadão ao ver que um juiz, já
bem pago, com vencimentos superiores ao teto constitucional, briga para
ganhar auxílio-moradia em dobro, considerando que sua mulher já o
recebe? Com que moral vai ficar?
Assinado, Carlos Brickmann Furtado
Gastando em anúncios
O Governo não dá o
exemplo, os parlamentares não dão o exemplo, o Judiciário não dá o
exemplo, e a solução encontrada para convencer a população a apoiar
reformas é gastar mais dinheiro em propaganda. Como esta, baseada na
excelente campanha publicitária dos postos Ipiranga:
Mulher: “Amigo, sabe onde eu encontro gente se aposentando com salário de 30 mil reais?
Homem: Uai, é lá no Posto da Previdência.
Mulher: E onde eu encontro aposentado com 50 anos?
Homem: Posto da Previdência.
Mulher: E onde eu encontro muita gente trabalhando muito para pagar esses privilégios de poucos?
Homem: Posto da Previdência.
Mulher: E onde eu encontro uma Previdência justa, com todos trabalhando igual e recebendo igual?
Homem: Ah, aí é só com a reforma da Previdência, uai!”
O caro leitor se
convence com este anúncio? Mesmo tendo lido na coluna anterior, do dia
31 de janeiro, que um técnico em Administração do Tribunal de Justiça da
Bahia se aposentou com quase R$ 50 mil mensais?
O gato comeu
Quando Brasília foi
construída, não havia muitas moradias disponíveis. A Câmara e o Senado
resolveram, então, criar as moradias funcionais, para parlamentares.
Isso aconteceu no início da década de 1960. Hoje, 58 anos depois,
Brasília tem residências para todos, tem hotéis de todas as categorias,
mas as moradias funcionais não só continuam existindo como se espalharam
pela estrutura administrativa, apesar da despesa que geram, em custos
diretos e manutenção.
É daquelas pragas que sempre sobrevivem, como dar aos parlamentares uma cota de selos. Hoje, quem precisa disso?
Onde está o dinheiro
O auxílio-moradia
para juízes surgiu para os que são transferidos de cidade e ficam sem
ter onde morar. Aí surgiram as reivindicações, houve as liminares, e
hoje o juiz que trabalha na sua comarca, mesmo que tenha uma bela casa
ao lado do Fórum, recebe R$ 4.253,00 (se o cônjuge for juiz, a ajuda vem
em dobro, embora morem na mesma casa). Segundo a ONG Contas Abertas,
essas liminares já custaram ao país uns R$ 4,5 bilhões.
Dois destinos
Outro lugar-comum: se
os ladrões devolvessem o que roubaram, sobraria dinheiro. Talvez não
sobrasse, mas ajudaria. Só que a Lava Jato conseguiu a condenação, em
Curitiba, de 140 réus. Já no Supremo nenhum julgamento foi concluído. A
turma do foro privilegiado deve ter mais a devolver. Até agora todos
escaparam e seu dinheiro também. Aí fazem anúncios para convencer o
cidadão honesto a aceitar aposentadoria menor.
Um caminho
Nem juízes nem
parlamentares são obrigados a receber ajudas. Mas dos 513 deputados, só
26 renunciaram aos penduricalhos. Os juízes lutam pela ajuda,
organizadamente: a Ajufe, Associação dos Juízes Federais, está
mobilizada. É provável que a questão seja julgada no STF em março.
Fato é fato
A feroz artilharia da
falsificação de notícias não admite que não havia reunião da FAO
marcada para janeiro, em Adis Abeba, Etiópia, e à qual Lula teria sido
convidado. É só conferir o site oficial da FAO: http://www.fao.org/brasil/noticias/detail-events/en/c/1099176/
O que aconteceu foi uma reunião entre a ONU e a União Africana, na qual
havia também funcionários ligados à FAO. O tema era o combate à
corrupção. Convidar Lula citando a FAO era mais palatável.
Dúvida
Amanhã, atenção em
Curitiba: o juiz Sérgio Moro interroga os empreiteiros que pagaram a
reforma do sítio de Atibaia que não é de Lula.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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