Vamos ser claros, conclama o professor João Carlos Espada no jornal Observador:
"a ideia de substituir a aliança euro-atlântica por uma aliança
euro-chinesa não é apenas uma completa loucura — seria uma submissão":
A semana passada começou com uma chocante primeira página do Telegraph de Londres, logo na segunda-feira de manhã: ‘Army can’t keep up with Russia’.
Não se tratava da opinião de um comentador avulso. Era a declaração do
chefe das Forças Armadas britânicas, General Sir Nick Carter,
denunciando o gigantesco investimento militar russo e a actual
incapacidade britânica de lhe fazer frente.
Na semana anterior, o
Pentágono acabara de publicar uma nova ‘Estratégia de Defesa Nacional’.
O documento define a Rússia e a China como as ameaças mais sérias para
os EUA e o mundo ocidental — mais do que o terrorismo islâmico.
E a semana passada
terminou com uma capa surpreendente de uma revista britânica: ‘The Next
War’ era o título em letras garrafais de The Economist. No editorial de
abertura, a revista alerta:
‘Se a América permitir que a China e a Rússia estabeleçam hegemonias regionais — quer inconscientemente, quer porque a política americana se tornou demasiado disfuncional para conseguir gerar uma resposta — então [a América] estará a dar-lhes [à China e à Rússia] luz verde para prosseguirem os seus interesses pela força bruta.’
Entretanto, nestas
mesmas duas últimas semanas, nas capitais europeias — incluindo
parcialmente em Davos — estes temas eram superiormente ignorados. As
capitais europeias continuam magnamente ocupadas com a campanha contra o
chamado ‘nacionalismo’.
O termo
‘nacionalismo’ tornou-se elástico: inclui justamente a condenação de
atitudes xenófobas, racistas e proteccionistas; mas também inclui a
gratuita condenação da inofensiva oposição patriótica de inúmeros
eleitorados de nações europeias (sobretudo da Europa central e de Leste)
contra maior integração supranacional da União Europeia —
designadamente, contra a definição supranacional das políticas de
imigração de cada país, que sempre foram matéria dos Parlamentos
nacionais.
Precisamente a este
propósito, também esta semana uma outra revista britânica alertou para a
dissonância cognitiva que ameaça o debate europeu. John O’Sullivan
(antigo conselheiro da Sra. Thatcher, que estará de novo entre nós no próximo dia 10 de Fevereiro), escreveu o artigo que deu a capa da Spectator.
Chama-se ‘The fight
for Europe’. Ainda que eu não subscreva inteiramente as opiniões de John
O’Sullivan (um frequente participante nas sessões do Estoril Political
Forum do IEP-UCP, sempre obviamente ignorados pelos ‘media’
politicamente correctos nacionais), creio que os alertas dele devem pelo
menos ser tidos em conta. Por exemplo:
‘Estes europeus do centro e do leste entendem-se a si próprios como a verdadeira Europa. Uma Europa que valoriza o estado-nação, a família, políticas prudentes, a religião cristã, e a democracia maioritária — e vêem estes padrões como ecos mais autênticos da tradição europeia. Por isso, os seus conflitos com Bruxelas não são acerca de eles serem anti-europeus, mas acerca do que significa ser europeu.’
Concordemos ou não
com O’Sullivan, creio que o seu olhar recomenda pelo menos prudência. E a
prudência recomenda que o projecto europeu não deve ambicionar desenhos
utópicos supranacionais — sob pena de podermos ficar com ‘mais Europa
e… com menos europeus’.
Mas receio que este
nem sequer seja agora o problema principal. O problema principal é que a
obsessão de alguns sectores euro-federalistas contra o chamado
‘nacionalismo’ pode estar a gerar uma tentação fatal: a tentação de
substituir a aliança entre a Europa e os EUA pela aliança euro-asiática…
se preciso for com a China comunista!
O argumento começa a
surgir em várias vozes. Ouvi recentemente um alto funcionário europeu
citar positivamente a China três vezes numa intervenção pública de 20
minutos — em que insistentemente condenou o ‘nacionalismo’ dentro da
Europa e na América de Trump. Inúmeros jornais europeus citam
frequentemente a China como um parceiro desejável, ou pelo menos
possível — sobretudo contra o que designam por ‘nacionalismo’ da América
de Trump.
Vamos ser claros: a
ideia de substituir a aliança euro-atlântica por uma aliança
euro-chinesa não é apenas uma completa loucura — seria uma submissão.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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