segunda-feira, 23 de outubro de 2017

Enterrando la Bruja: de ponta a ponta, mais uma vitória para Macri.


Coligação de Macri vence as eleições na Argentina. Ao que tudo indica, é o fim do kirchnerismo, embora a praga peronista sobreviva. Dá, mesmo, para sentir uma ponta de inveja, escreve Vilma Gryzinski:


O passado recomenda cautela. Unidos em todas as semelhanças que nos separam, brasileiros e argentinos sabem disso. Mas como impedir que o otimismo escape por todas as barreiras da razão num momento como a Argentina viveu ontem?

A vitória de ponta a ponta da coalizão de Mauricio Macri nas eleições para o Congresso pode significar uma virada maior ainda do que a própria e improvável eleição dele como presidente.

Ganhar como “cara nova”, em 2015, já foi um espanto. Ganhar no meio do mandato, com o fôlego já apertado por reformas que ainda patinam, é um fenômeno maior ainda. E ganhar de Cristina Kirchner por quatro pontos de diferença, com um candidato sem carisma ao Senado, não tem preço.

Dessa vez, nem a mulher de Macri, Juliana Awada, reclamou com os passos desajeitados do marido na dancinha da vitória, como aconteceu na eleição presidencial. A maré está a favor.

“Não voltam mais”, cantavam os macristas, com o exagero dos momentos de euforia. “Eles”, os que não voltam, são os peronistas, divididos em facções, como tantas vezes já aconteceu e loucos para se livrar de Cristina, que agora fundou seu próprio partido. Na Argentina, os peronistas sempre voltam. E, mesmo com menos votos, a ex-presidente foi eleita senadora

Mais uma vez, os argentinos resolveram depositar esperanças numa figura política fora do peronismo. Aconteceu com Raúl Alfonsín e com Fernando De La Rúa, com resultados desastrosos.

A era Kirchner, que começou cheia de esperança e medidas econômicas positivas, terminou com a figura crispada e hiperpolitizada de Cristina, corrupção que só não é espantosa pelos padrões brasileiros e até acusação de traição à pátria, entre outras mais tradicionais como lavagem de dinheiro e enriquecimento ilícito.

Macri é um político totalmente fora do espectro, um filho de milionário em quem nem o pai fazia fé, um bonitão que só pensava em bola no pé, como presidente do Boca, e mulheres deslumbrantes no braço. “Tente ler um livro, não vai fazer mal”, provocou Daniel Scioli, o candidato peronista derrotado na eleição presidencial.

Apesar da origem social, não tem uma relação perfeita com o mundo empresarial, que apoiou Scioli. Entre grandes empresários, na maioria de origem italiana como Macri, o presidente vem sendo chamado, em tom algo pejorativo, de Calabrês.

Macri deve ser lido dentro do fenômeno geral de rejeição aos políticos tradicionais, mas com as especificidades da Argentina, um país que, de forma mais aguda ainda que o Brasil, se movimenta entre ondas de depressão e euforia.

Está tentando, com erros e acertos, um malabarismo próprio aos tempos atuais: manter os benefícios sociais que explodiram durante o período do populismo de esquerda, trazer tarifas de luz e gasolina para patamares compatíveis com a realidade, turbinar o crescimento econômico, controlar a inflação – menor do que na época da “maquiagem”, mas ainda em 17%.

Horácio González, intelectual kirchnerista – ah, Argentina -, tentou definir o macrismo, evidentemente com má vontade, como “um tipo de populismo que incorpora vetores do peronismo”.

Eufórico com a vitória maior do que a antecipada pelas pesquisas mais otimistas, Macri usou palavras fora de seu vocabulário habitual: “Hoje quem ganhou foi a certeza de que podemos mudar a história para sempre. Queremos alcançar algo grande, um país decidido a fazer as coisas direito.”

São expressões grandiosas, muito provavelmente incompatíveis com a realidade. Mas não dá para deixar de sentir uma inveja positiva, nesse momento, dos argentinos. Além de ter um papa (Francisco), uma rainha (Máxima da Holanda), uma primeira-dama linda que pode andar em público, eles têm um artigo desaparecido no Brasil: uma opção.
BLOG ORLANDO TAMBOSI

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