Coligação de Macri vence
as eleições na Argentina. Ao que tudo indica, é o fim do kirchnerismo,
embora a praga peronista sobreviva. Dá, mesmo, para sentir uma ponta de
inveja, escreve Vilma Gryzinski:
O passado recomenda
cautela. Unidos em todas as semelhanças que nos separam, brasileiros e
argentinos sabem disso. Mas como impedir que o otimismo escape por todas
as barreiras da razão num momento como a Argentina viveu ontem?
A vitória de ponta a
ponta da coalizão de Mauricio Macri nas eleições para o Congresso pode
significar uma virada maior ainda do que a própria e improvável eleição
dele como presidente.
Ganhar como “cara
nova”, em 2015, já foi um espanto. Ganhar no meio do mandato, com o
fôlego já apertado por reformas que ainda patinam, é um fenômeno maior
ainda. E ganhar de Cristina Kirchner por quatro pontos de diferença, com
um candidato sem carisma ao Senado, não tem preço.
Dessa vez, nem a
mulher de Macri, Juliana Awada, reclamou com os passos desajeitados do
marido na dancinha da vitória, como aconteceu na eleição presidencial. A
maré está a favor.
“Não voltam mais”,
cantavam os macristas, com o exagero dos momentos de euforia. “Eles”, os
que não voltam, são os peronistas, divididos em facções, como tantas
vezes já aconteceu e loucos para se livrar de Cristina, que agora fundou
seu próprio partido. Na Argentina, os peronistas sempre voltam. E,
mesmo com menos votos, a ex-presidente foi eleita senadora
Mais uma vez, os
argentinos resolveram depositar esperanças numa figura política fora do
peronismo. Aconteceu com Raúl Alfonsín e com Fernando De La Rúa, com
resultados desastrosos.
A era Kirchner, que
começou cheia de esperança e medidas econômicas positivas, terminou com a
figura crispada e hiperpolitizada de Cristina, corrupção que só não é
espantosa pelos padrões brasileiros e até acusação de traição à pátria,
entre outras mais tradicionais como lavagem de dinheiro e enriquecimento
ilícito.
Macri é um político
totalmente fora do espectro, um filho de milionário em quem nem o pai
fazia fé, um bonitão que só pensava em bola no pé, como presidente do
Boca, e mulheres deslumbrantes no braço. “Tente ler um livro, não vai
fazer mal”, provocou Daniel Scioli, o candidato peronista derrotado na
eleição presidencial.
Apesar da origem
social, não tem uma relação perfeita com o mundo empresarial, que apoiou
Scioli. Entre grandes empresários, na maioria de origem italiana como
Macri, o presidente vem sendo chamado, em tom algo pejorativo, de
Calabrês.
Macri deve ser lido
dentro do fenômeno geral de rejeição aos políticos tradicionais, mas com
as especificidades da Argentina, um país que, de forma mais aguda ainda
que o Brasil, se movimenta entre ondas de depressão e euforia.
Está tentando, com
erros e acertos, um malabarismo próprio aos tempos atuais: manter os
benefícios sociais que explodiram durante o período do populismo de
esquerda, trazer tarifas de luz e gasolina para patamares compatíveis
com a realidade, turbinar o crescimento econômico, controlar a inflação –
menor do que na época da “maquiagem”, mas ainda em 17%.
Horácio González,
intelectual kirchnerista – ah, Argentina -, tentou definir o macrismo,
evidentemente com má vontade, como “um tipo de populismo que incorpora
vetores do peronismo”.
Eufórico com a
vitória maior do que a antecipada pelas pesquisas mais otimistas, Macri
usou palavras fora de seu vocabulário habitual: “Hoje quem ganhou foi a
certeza de que podemos mudar a história para sempre. Queremos alcançar
algo grande, um país decidido a fazer as coisas direito.”
São expressões
grandiosas, muito provavelmente incompatíveis com a realidade. Mas não
dá para deixar de sentir uma inveja positiva, nesse momento, dos
argentinos. Além de ter um papa (Francisco), uma rainha (Máxima da
Holanda), uma primeira-dama linda que pode andar em público, eles têm um
artigo desaparecido no Brasil: uma opção.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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