segunda-feira, 3 de outubro de 2016

Eleição: votação no Rio reflete mudanças após crise política, dizem analistas

Jornal do BrasilRebeca Letieri *

A presença dos candidatos Marcelo Freixo (Psol) e Marcelo Crivella (PRB) no segundo turno da eleição para prefeito do Rio de Janeiro reflete, para cientistas políticos, que a cidade é uma expressão positiva da crise política que se instaurou no Brasil hoje, com a baixa popularidade do PT e do PMDB.
Com 100% dos votos apurados neste domingo (2), Crivella teve 842 mil votos, o que corresponde a 27% dos votos válidos e Freixo recebeu 553 mil votos, o equivalente a 18%. Houve 24% de abstenções.
“O voto no Marcelo Freixo é o voto numa política em termos do que se acreditou na década de 80 no fim da ditadura. Uma política que mobiliza alternativas em face ao que está dado”, disse a cientista política e professora da Unirio, Clarisse Gurgel, para quem o voto em Marcelo Freixo “reflete um retorno da crença na política”, comparando o PSOL ao PT dos anos 80, como um partido de esperança para a esquerda.
“Se o PSOL tentou ocupar o lugar do PT em 2002 e não conseguiu, talvez na experiência do Freixo a gente possa vislumbrar um PSOL ocupando o vazio que o PT deixou depois do impeachment”, disse. “O nome do PMDB nacional é um nome que ninguém reivindica. O Michel Temer não é candidato de ninguém. Eu acho que o Pedro Paulo serviu de termômetro para esse desgaste”, completou.
O candidato do PRB tem 27,7% dos votos, e o do Psol, 18,2%. Houve 24,28% de abstenções
O candidato do PRB tem 27,7% dos votos, e o do Psol, 18,2%. Houve 24,28% de abstenções
A geografia das votações revela ainda os eleitores dos candidatos. Na zona oeste do Rio, Crivella e Bolsonaro dominaram a maioria das zonas eleitorais. Na zona norte, Crivella liderou a porcentagem, com exceção da Vila da Penha, onde Marcelo Freixo teve maioria. Pedro Paulo não teve protagonismo regional, mas levou o terceiro lugar do geral, numa avaliação que Clarisse leva em conta o poder e tradição da máquina do PMDB.
“O PMDB conseguiu construir uma estrutura que faz dele um partido enraizado pela via de compra de votos e de troca de favores. O fato de ele ter se desgastado nacionalmente ajudou, mas ainda assim não é fácil de vencê-lo com essa tradição. Essa passada do Freixo para o segundo turno representa uma recuperação de ânimos para aqueles que achavam que a juventude, e as gerações que viriam, viriam descrentes”, finalizou.
Para a professora, o Crivella teve um índice já previsto de acordo com as pesquisas e o perfil do candidato. “É um apelo paternal muito forte e uma entrada via igreja e com apoios populares muito grandes, como o Wagner Montes, Romário e Garotinho”, disse.
Já o PSOL, na visão de Clarisse, ainda não alcançou os setores mais populares no Rio, e que ao contrário de Crivella, não tem o apelo da massa cristã.
“O PSOL é um partido diferente dos partidos de esquerda da década de 80, a exemplo do PT. É um partido de classe media. Já o Crivella tem o apelo da entidade mais forte do Rio que é a igreja evangélica”, completou.
Para o cientista político e professor no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ, Jairo Nicolau, as pesquisas recentes do Ibope e Datafolha captavam a ascensão do Freixo, mas mantinham a dúvida de quem iria para o segundo turno com Crivella.
“É um resultado impressionante, porque pela primeira vez a gente está tendo uma eleição sem as forças políticas nacionais no segundo turno. Depois de 22 anos, a esquerda chega a uma disputa na prefeitura do Rio, é uma novidade que a gente vai ver”, disse.
Para Jairo, o segundo turno será bem disputado, e o fato de Marcelo Freixo não ter alcançado os setores populares no Rio não impede um possível sucesso do candidato.
“Imagino que será uma eleição dura. Essa vitória se deve, principalmente, ao voto útil da esquerda, que viu no Freixo uma grande possibilidade”, disse. “Na eleição de 2008, o Gabeira só entrou nas áreas populares no segundo turno [por menos de 2%, Fernando Gabeira não derrotou Eduardo Paes]. Isso não é um impeditivo para que o Freixo cresça, ele ainda pode reverter essa situação”, completou.
* do projeto de estágio do JB

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