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A
propósito do centenário das aparições de Nossa Senhora em
Fátima
Gregorio Vivanco
Lopes
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Conhecido conto medieval
apresenta-nos um cavaleiro passando junto ao local onde três operários
afincadamente trabalhavam com grandes pedras — hoje se diria um canteiro de
obras. Chamou-lhe a atenção aquele esforço pelo qual tais homens pareciam lançar
os fundamentos de algum futuro edifício.
Espicaçado pela curiosidade, ao mais
próximo perguntou o que fazia. Este prontamente lhe respondeu: “Estou
cortando pedras”. Não satisfeito com a resposta, tocou um pouco o cavalo, e
aproximando-se do segundo, repetiu-lhe a pergunta. “Estou preparando os
fundamentos de um muro” –– foi a resposta. Por fim, indagado o terceiro
sobre sua atividade, este respondeu: “Estou construindo uma
catedral!”
Ora, os
três faziam exatamente o mesmo trabalho, se considerado o aspecto material de
sua atividade. Mas cada um deles se dedicava ao labor com um estado de alma
peculiar. O primeiro só era capaz de enxergar as pedras que tinha diante de si;
o segundo elevava mais as vistas, e já via o muro que iria subir; o terceiro,
por fim, alçava-se ainda mais, e dali contemplava a bela catedral que surgiria.
Não é descabido supor que antevisse os maravilhosos vitrais a iluminá-la, o
incenso a impregnar-lhe as paredes, o cântico do Kyrie a ecoar nas abóbadas, a
glória a Deus manifestada nos santos ritos ali celebrados.
*
* *
Trata-se evidentemente de uma
alegoria sobre a condição humana. Todos nós vivemos juntos nessas cidades
modernas, nos encontramos nas mesmas ruas e praças, vamos aos mesmos locais de
trabalho, aos mesmos supermercados, vemos as mesmas cenas da vida. No entanto,
se sondarmos as almas, quantas diferenças no modo de julgar cada
coisa...
Fica
aqui um convite ao leitor para julgar o mundo que nos cerca de um patamar muito
elevado, do alto da torre de uma catedral. Não se trata de perder o contato com
a realidade. Longe disso. Nada pior do que sonhos quiméricos que só servem para
transviar os espíritos que correm atrás deles. Trata-se de ver a realidade de um
patamar mais alto, que ilumina e condiciona o cotidiano, como também a História.
O homem que construía a catedral não estava fora da realidade, ele a contemplava
de seu pico mais alto. Por assim dizer, é olhando como que através dos olhos de
Deus que se alcança o suco da realidade.
Estamos
nos aproximando do centenário das aparições de Nossa Senhora em Fátima, em 1917.
A Mensagem então comunicada aos pastorinhos pela Virgem Santíssima nos mostra o
mundo contemporâneo sob uma luz mais elevada e mais reveladora.
De
fato, a realidade presente pode ser visualizada de patamares sucessivamente mais
altos. Primeiramente, podemos ver as dificuldades que a sociedade atual,
permissiva e igualitária, acarreta para cada indivíduo (para os interessados,
seus problemas pessoais parecem enormes, mas vistos sob a ótica do conjunto da
humanidade são pequenos). Numa visão mais ampla, topamos com o processo em curso
de dissolução das famílias e do esgarçamento do princípio da propriedade.
Podemos ver, em escala regional, os terremotos, os maremotos, as guerras e
revoluções, os desvarios dos movimentos pacifistas.
A
Mensagem de Fátima, sem negar a autenticidade da visão obtida a partir de cada
um desses patamares, mostra-nos, entretanto, como Deus vê o mundo atual no seu
conjunto: carregado de pecados, partícipe de um processo revolucionário que leva
tudo de roldão –– simbolizado pelos erros da Rússia, ou seja, os princípios
socialo-comunistas em suas várias formas e diluições –– provocando a ira de
Deus, cuja manifestação acarretará guerras e revoluções, perseguições à Igreja e
tudo o mais.
Manifestação grandiosa, ao mesmo
tempo justiceira e misericordiosa, porquanto pune o mal mas repõe as coisas no
seu lugar, criando novamente condições para a prática da virtude e do amor de
Deus.
Assim,
a alegoria medieval a que nos referimos no início, ajuda-nos a compreender quão
elevado é o patamar em que se situa a Mensagem de Nossa Senhora de Fátima, ao
mesmo tempo justiceira e misericordiosa, ao analisar o mundo
atual.
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Gregorio Vivanco Lopes é advogado e colaborador da ABIM
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