domingo, 28 de agosto de 2016

Goiás: governo impõe ideologia de gênero por decreto


marconiO governador Marconi Perillo (PSDB, foto), no dia 4 deste mês, tomou a decisão de assinar o Decreto nº 8.716/2016 que autoriza a utilização do nome social por pessoas travestis e transexuais em quaisquer serviços públicos ofertados pela administração direta e indireta do Poder Executivo, que inclui os serviços conveniados. Sim, um decreto. Nada de encaminhar a matéria para ser discutida e votada pela Assembleia Legislativa.

Esta seria a maneira democrática de tratar de um tema que embora tenha aparência de simples, é complexo e não consensual porque insere uma cunha na estrutura da cultura tradicional da sociedade. Além do mais, essa medida menor tem a função estratégica de abrir fendas por onde outras demandas que fazem parte do elenco de propostas da revolução cultural empreendida pelos estudos de gênero líquido venham a ser, finalmente, implementadas na sociedade por através de políticas públicas.
O decreto do governo goiano é similar ao Decreto Presidencial nº 8.727/2016, assinado no dia 28 de abril pela presidente Dilma Rousseff, num de seus últimos atos na Presidência da República. A própria presidente, que nos dois mandatos teve como uma de suas principais bandeiras justamente a implementação das políticas do gênero múltiplo, guardou enquanto pôde esse decreto na gaveta para não minar ainda mais sua frágil sustentação política.

Depois de publicado, o decreto de Dilma causou muita contrariedade nas lideranças católicas e evangélicas do país e motivou o pedido de revogação do mesmo através da Câmara dos Deputados. Para atender a esse interesse, o deputado João Campos (PRB-GO) encabeçou a assinatura do decreto legislativo (PDC 395/2016), subscrito por 28 deputados católicos e evangélicos de 10 partidos políticos. Resta saber se há deputados estaduais goianos, com a mesma motivação, dispostos a tomarem a mesma iniciativa de revogação do decreto do governador.

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Propostas similares de decreto, patrocinadas pelo fortíssimo lobby dos movimentos de militância em gênero, têm sido oferecidas aos estados e às prefeituras, principalmente capitais e cidades de grande e médio porte. Mas a adesão é baixíssima porque governadores e prefeitos se recusam a interferir, por decreto, nos majoritários interesses do substrato cultural cristão. Marconi Perillo (PSDB) é apenas o terceiro governador do país que decidiu adotar essa mesma política de gênero, depois de Tarso Genro (PT), em 2012, no Rio Grande do Sul e Simão Jatene (PSDB), em 2013, no Pará.

A estratégia da militância de gênero de fazer com que o Executivo decrete suas pautas políticas, visa fugir do trâmite regimental das casas legislativas onde suas demandas nunca prosperam. Isto porque os parlamentares tendem a reproduzir o conservadorismo predominante na sociedade. Essas políticas somente avançam com o favor das estruturas de governo que as beneficiam por meio de decretos, portarias, resoluções e pareceres. Contam também com o favorecimento de decisões judiciais.

O fato de ter conseguido emplacar esse decreto num estado conservador como é o caso de Goiás, representa além de vitória simbólica, uma extraordinária arma de propaganda para a militância de gênero. Justamente porque Goiás é reconhecido como um dos estados do país com maior percentual de evangélicos e também de católicos praticantes, conforme atesta o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No estado, estão sediadas algumas das principais igrejas e missões brasileiras que estendem suas congregações pelo país e pelo mundo. Em Trindade, inclusive, acontece anualmente a segunda maior festa religiosa católica do país e uma das maiores do mundo.
De posse desse importante trunfo propagandístico, o lobby de gênero certamente potencializará seus argumentos para convencer prefeitos do interior de Goiás a replicarem nos municípios a decisão do governo estadual, além de usar o exemplo daqui para quebrar a resistência dos outros governadores. Cada vez mais será defendida a tese segundo a qual o que não se consegue em votação num legislativo conservador, impõe-se pela canetada do executivo.

Mas Goiás tem já uma tradição de pioneirismo no apoio às demandas de gênero. Em 2008 o governador Alcides Rodrigues assinou o decreto 6.855/2008, que fez de Goiás o primeiro estado a criar um Conselho Estadual LGBTTT. Tanto o decreto de 2008 quanto o de 2016 tiveram o protagonismo da Secretaria Estadual da Mulher, do Desenvolvimento Social, da Igualdade Racial, dos Direitos Humanos e do Trabalho (Secretaria Cidadã).

Esta é a mais importante secretaria estadual para o desenvolvimento das políticas sociais do governo. Por outro lado, a Secretaria Cidadã cumpre a função política de apaziguar, beneficiar e aproximar o governo estadual de sindicatos, grupos LGBTTT, Feminista, Afro, e organizações afins. Para tanto, esses grupos influenciam diretamente em boa parte das políticas sociais da pasta. Também, durante os governos Lula e Dilma, a secretaria serviu para Goiás estabelecer parcerias com o Governo Federal que aproveitou para financiar e aprofundar as políticas culturais e sociais do seu interesse.

Um dos efeitos dessa parceria é a quase regular realização de cursos gratuitos de capacitação nas teorias de gênero para servidores públicos do estado e dos municípios. Esses cursos, além de quebrar a resistência social sobre o assunto, têm a finalidade de fazer multiplicadores e treinar os servidores para o atendimento à população de acordo com a perspectiva da ideologia de gênero e dos movimentos sociais.

Um dos cursos teve a duração de 180 horas e foi realizado em 15 encontros aos sábados, de 8:00h às 17:00h, entre os dias 22 de agosto e 28 de novembro de 2015. Foram treinadas em gênero somente nesta etapa 2.500 pessoas (enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais, advogados, professores, administradores, políticos, policiais, além de conselheiros tutelares) em 10 cidades polo: Campos Belos, Catalão, Goiânia, Goiás, Itumbiara, Jataí, Luziânia, Posse, Porangatu e Uruaçú.

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(perspectiva de gênero adotada em curso da Secretaria Cidadã de Goiás)
O avanço da aplicação na sociedade das ideologias relativas ao gênero não binário encontra oposição na resistência cristã não somente no Brasil mas em outras partes do mundo. Nesse embate, a manipulação da linguagem e do discurso constitui-se em importante estratégia de (re)formação do imaginário coletivo. É nesse contexto que os cristãos têm sido acusados de parciais e preconceituosos ao supostamente servirem de entrave para a emancipação das minorias sexuais e familiares. No entanto, somente compreende os motivos para esse discurso de resistência quem acompanha a emergência e o protagonismo dessa política cultural no mundo.

A ressignificação do termo gênero (descolando-o do conceito de sexo masculino e feminino e mudando discriminação sexual para discriminação de gênero) foi acatada pela Organização das Nações Unidas (ONU) como política de direitos humanos para as nações a partir das conferências para as mulheres, em Pequim (1995) e Yogyakarta (2006). Desde então, a política de gênero tem sido imposta aos países por meio das agências da ONU para a saúde, cultura, educação e direitos humanos, além de clausulas impositivas em contratos dos bancos de fomento e desenvolvimento para as nações.

A intenção da ONU não é humanitária, no sentido de atender as particularidades das minorias familiares e sexuais. E é lamentável que pessoas sofram e sejam enganadas com políticas que supostamente as beneficiem. Como pode ser constatado nos documentos da própria ONU e também nos depoimentos, entrevistas, livros e teses dos principais defensores dessa causa no mundo, a atual política de gênero constitui-se em importante ferramenta para a premeditada corrosão, por dentro, da sociedade ocidental. A existência de um modelo de sociedade fundamentado na moral judaica e cristã não interessa ao propósito de construção da Nova Ordem Mundial que está em curso.

O Brasil foi um dos primeiros países a adotar essa política de gênero da ONU. O decreto presidencial 7.037 assinado por Lula em 21 de dezembro de 2009, criou o Plano Nacional de Direitos Humanos 3 (PNDH-3). Na seção de Ações Programáticas, no Objetivo Estratégico 5, o documento apresenta a seguinte prioridade: “Reconhecer e incluir nos sistemas de informação do serviço público todas as configurações familiares constituídas por lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, com base na desconstrução da heteronormatividade.

O reconhecimento social das famílias alternativas certamente não seria questionado pelo conjunto dos cristãos, caso a recomendação da ONU e também do PNDH3 não exigisse a desconstrução da normalidade do sexo masculino e feminino e também do casamento heterossexual. Esse é o ponto de discórdia.

Estamos diante da imposição de uma ação ideológica de gênero que se dá em cadeia hierárquica: a ONU e algumas outras instituições e organismos interdependentes promovem a difusão e o financiamento dessa política às nações; as nações, pela vez delas, veem-se obrigadas a fazem o mesmo com suas unidades administrativas. Portanto, não há como dissociar o decreto do governador e as políticas da Secretaria Cidadã, bem como da Secretaria Estadual de Educação, desse contexto.

Em se tratando da promoção da ideologia de gênero em Goiás, não se pode ignorar a participação ainda mais dedicada e efetiva da Prefeitura de Goiânia, particularidade que esse artigo não se propôs a tratar.
Para concluir, ofereço aos leitores dois apêndices para reflexão: o primeiro, para dizer que os eleitores são reféns da desorganização partidária brasileira. Diferente do modelo predominante nas democracias mais amadurecidas, a maioria dos partidos políticos daqui não têm linha ideológica e/ou doutrinária definida. Em vista disso, os eleitores ficam à mercê do estelionato eleitoral porque nunca têm a garantia de que os políticos não os trairão mudando seus discursos depois de eleitos.

O segundo, é para opinar que o ministro cristão não deveria oferecer apoio irrestrito aos governantes, nem se associar a eles em negócios políticos, ainda mais quando o faz em nome da Igreja. A própria Igreja tem consistentes motivos históricos para desaconselhar essa prática. Além da oração e do aconselhamento sincero e imparcial, sua postura política deveria ser de fiel da balança em favor da justiça social, da austeridade e correção das práticas de governo. Sobretudo, na defesa intransigente e inegociável dos valores éticos e morais da fé cristã. Estes são cuidados necessários para que a Igreja não seja forçada pela conveniência política a relativizar seus valores, abandonar ou negligenciar as prioridades do Reino de Deus, selecionar a mensagem da pregação e silenciar a voz profética que denuncia o erro.

Orley José da Silva, professor em Goiânia, é mestre em Letras e Linguística (UFG) e mestrando em estudos teológicos (SPRBC).

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