sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Ibama no PA multa índio que fazia artesanato em R$ 3 milhões


MPF/PA é contra a decisão do Ibama. Parecer enviado à Justiça defende que a multa deve ser anulada por ser desproporcional.

Do G1 PA
Indígena fazia o artesanato para se sustentar longe da aldeia onde vivia.  (Foto: Divulgação/MPF)Indígena fazia o artesanato para se sustentar longe
da aldeia onde vivia. (Foto: Divulgação/MPF)
Um índio da etnia Wai-Wai foi multado em quase R$ 3 milhões pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), em 2009. Nesta sexta-feira (26), o Ministério Público Federal (MPF/PA) se manifestou em parecer enviado à Justiça Federal pedindo que a multa seja anulada por ser desproporcional.
O indígena confeccionava e transportava artesanato feito com penas de aves e foi autuado pelo Ibama em Oriximiná, no oeste do Pará, em 2009, com 132 peças de artesanato. A Defensoria Pública da União (DPU) entrou com ação pedindo anulação da multa e o MPF foi chamado a dar parecer, como fiscal da lei.
"A título de comparação, a Norte Energia, pessoa jurídica responsável pela mais cara obra pública em andamento no Brasil, orçada atualmente em R$ 32 bilhões, foi atuada pelo Ibama em apenas R$ 8 milhões, por crime ambiental inegavelmente mais grave que a conduta praticada pelo indígena”
procurador Camões Boaventura
O procurador Camões Boaventura, de Santarém, chamou a atenção pela desproporcionalidade da multa aplicada. "A título de comparação, a empresa Norte Energia S.A, concessionária da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, foi multada pelo Ibama no valor de R$ 8 milhões por ter provocado a morte de 16 toneladas de peixe. A Norte Energia, pessoa jurídica responsável pela mais cara obra pública em andamento no Brasil, orçada atualmente em R$ 32 bilhões, foi atuada pelo Ibama em apenas R$ 8 milhões, por crime ambiental inegavelmente mais grave - e de mais severa repercussão socioeconômica - que a conduta praticada pelo indígena”, defendeu.
Funai
A Fundação Nacional do Índio (Funai), também se manifestou no processo e informou à Justiça que o índio multado pelo Ibama não trabalha com produção em larga escala, nem mesmo com recursos ou tecnologias que causem impacto ambiental sobre a população local de papagaios.

“Ademais, a fabricação de adornos não impacta o meio ambiente nem afeta o modo de vida tradicional da etnia Wai Wai. Ao contrário, fortalece as estratégia de sustentabilidade cultura, ambiental e econômica desse povo”, opinou a Funai.
Diversidade cultural
Para o MPF, a atuação do Ibama na aplicação da lei deve considerar obrigatoriamente a diversidade cultural dos povos que habitam o país, em obediência também à Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho.

“A autarquia federal (Ibama) deveria ter considerado que o artesanato constitui uma forma de expressar a identidade étnica, que é o conjunto de aspectos socioculturais identitários, cosmológicos e valores que compõem cada etnia. O artesanato também é uma importante fonte de renda para centenas de povos indígenas no Brasil, especialmente aqueles indígenas que residem em centros urbanos”, diz o parecer.
O índio Timóteo Taytasi Wai-Wai estuda no núcleo urbano de Oriximiná e usava a venda de artesanato para se sustentar longe da aldeia. Depois da autuação e da multa do Ibama, além da dívida, encontra dificuldade para continuar os estudos.
O MPF destaca no parecer que os povos indígenas, com técnicas reconhecidamente sofisticadas de manejo da agrobiodiversidade e tecnologias de baixo impacto ambiental, protegem o meio ambiente em seus territórios, o que se traduz no índice de desmatamento de terras indígenas, que na média não passa de 1%.

“Bastante inferior ao índice encontrado em unidades de conservação gerenciadas pelo ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, órgão do governo brasileiro), por exemplo”.

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