terça-feira, 24 de novembro de 2015

Para colorir a cidade


Grupo de grafiteiros faz quatro painéis em construções de Goiânia para dar vida às ruas
JORNAL O HOJE - GO

José Abrão
Galeria a céu aberto. O conceito não é novo: desde os anos 1980, a arte urbana foi crescendo de algo visto como vandalismo para uma forma de expressão legítima e de altíssima qualidade. A maior delas fica em Berlim, em um trecho conservado do antigo Muro de Berlim, antes um símbolo da opressão, hoje um símbolo fraternal entre os povos. Goiânia é terra de grandes artistas de rua e grafiteiros, alguns até já com fama internacional, como Santhiago Selon, atualmente estudando em Harvard, e Kboco, conhecido por seus murais. Não é à toa que a arte das ruas começa a se espalhar pela cidade cujas ruas se tornam, de fato, galerias, como as famosas vielas e becos do Setor Sul.

Aos poucos, mais e mais adeptos são conquistados pela arte, inclusive em tapumes de construções, como durante a reforma da Praça Cívica. Esse é o coração do projeto Galeria Aberta – Arte em Tapumes, da Ademaldo Construções. A construtora convidou quatro grafiteiros renomados para fazer murais nos tapumes de suas construções. Três deles já foram concluídos e mais um deve ficar pronto nesta semana. Os artistas Decy, Rubin, André Amorim e Wes Gama compõem a exposição. “O pessoal da construtora foi atrás do Decy e ele falou sobre o Wes e a gente, e nós quatro fomos afinando as ideias. Era inicialmente para pintar os tapumes menores, mais simples, e tivemos a ideia dele maior, com mais impacto”.
A ideia é romper com a frieza do dia a dia e com o cinza constante da cidade e do canteiro de obras. E é um efeito facilmente atingido. Durante a entrevista, carros e populares a pé ou de bicicleta constantemente reduziam para olhar, apontar e comentar entre si sobre o mural feito por André no Jardim América que traz o rosto de Nelson Mandela em meio a um mar de cores. Para eles, o prazer está nisso: todo mundo pode ver a arte e não precisa pagar por ela: “A mágica da arte urbana está no acesso. Na rua, todo mundo vai ver, da mais humilde a mais rica dentro do carro importado. Não está dentro do museu, não precisa pagar bilhete, ela está ali. Quem pagou para fazer isso, ou independente mesmo, por nossa própria conta, é um investimento, a tinta é cara, mas depois de pronto, está ali para todo mundo, é bem democrática”.
Os artistas são autodidatas e foram se aprimorando por meio da repetição e experimentação com novas técnicas que acumularam ao longo do tempo. “A gente trabalha com arte urbana, é adepto do spray há um bom tempo, já, e viemos mesclando nossas técnicas com outros estilos, pincel, tinta acrílica, estamos explorando outras técnicas e buscando estudo, evolução, sempre desenhando; a gente tenta evoluir o nosso trampo com desenho. É a melhor forma de chegar em um nível melhor, é sentar e rabiscar mesmo”, orienta André.
Ele começou com o grafite, em 2004, e foi crescendo: “Via nas revistas. A gente não tinha muito acesso. Via o que a galera estava fazendo fora, em outros países. Com o tempo, foi mesclando, desenhando rosto, incorporando um estilo oriental; abri muito meu leque de desenho”.
Rubin, que já passou pela Inglaterra e pelos EUA, conta que começou a desenhar desde criança: “É coisa de criança, mesmo, ter interesse por desenho e cores. A gente trabalha com cores, e é gratificante dar um aspecto visual novo para a cidade. A evolução foi essa, desenhando desde criança e percebendo que é isso que eu queria fazer da vida. A arte está em ascensão, sempre teve valor na sociedade. Nossa arte, que é urbana, está em ascensão, está sendo usada pela televisão, por marcas e produtos e estamos investindo nisso, ganhamos a vida com isso”.
O tema da exposição é de união entre os povos, falar de coisas boas. Por isso André escolheu fazer Mandela: “Nesse projeto, a gente propôs o tema valores humanos, o pessoal está perdendo estes valores. Resolvi fazer a figura do Mandela, porque ele foi um ícone, uma grande personalidade que lutou pelos direitos humanos. Decidi fazer seu rosto, nunca tinha pintado ele, achei uma grande oportunidade. Talvez de alguma forma isso possa trazer algo de bom para as pessoas”. Já Rubin grafitou duas mãos se cumprimentando: “Fiz isso por justamente por ser um símbolo, duas mãos se cumprimentando representa a paz, boas vibrações, você está em uma situação de respeito com a outra pessoa. Passar uma coisa que é básica, o respeito cabe em qualquer lugar e, com ele, é possível grandes conquistas e quis representar isso”.
André acredita que a melhor coisa do projeto é transmitir uma mensagem positiva: “O legal é que transmite uma mensagem, passa alguma coisa para a pessoa que está passando ali na rua e vê o desenho, as cores vivas, e isso gera um sentimento para a pessoa que está passando na rua: ela vai observar e vai absorver alguma coisa desse desenho, passar uma alegria. No momento em que a gente vive, tem tanta coisa ruim acontecendo, e isso é para botar um pouco de cor no mundo”.
Além disso, os quatro tapumes estarão disponíveis para votação no site www.arteemtapumes.com.br para escolher qual tapume mais agradou as pessoas. Dos quatro artistas, o autor da obra mais votada receberá um prêmio

Nenhum comentário:

Postar um comentário