terça-feira, 24 de novembro de 2015

Com o fim do Ciclo do Ouro, as jabuticabas se tornaram as joias de Sabará


Hoje Em Dia


Divulgação
Com o fim do Ciclo do Ouro, as jabuticabas se tornaram as joias de Sabará

O Ciclo do Ouro deixou em Sabará os casarões do século XVIII com seus amplos quintais repletos de jabuticabeiras. A tradição se espalhou e as árvores frutificam até hoje nos mais simples terreiros da cidade.
A partir da criação do Festival da Jabuticaba que, neste ano faz sua 29ª edição entre os dias 4, 5 e 6 de dezembro, os produtores organizaram-se e hoje moradores encontraram diversas formas de tirar da fruta seu sustento.
“Com o festival, comecei a me interessar. Há dez anos fiz um curso e aprendi a fazer geleia doce e licor. Produzia tudo em casa”, lembra a produtora Meire Ribeiro. De lá para cá, os negócios não pararam de crescer. “A cada ano, eu aumentava a produção um ‘tiquinho’. Fiquei emocionada no dia em que consegui ter 15 caixas de geleia na despensa e agora, em 2015, minha meta é processar 15 toneladas de jabuticaba”.
Aliando tradição e criatividade, 30 produtoras locais fazem hoje cerca de 15 produtos derivados da jabuticaba. Meire explica que “nenhuma das meninas usa agrotóxico, produto químico, nada disso. É tudo natural. Nosso único conservante é o açúcar”.

O olhar atento de quem passou a vida testando receitas e fazendo verdadeiras mágicas culinárias com a jabuticaba deu à atividade um caráter sustentável. Cada parte da fruta é aproveitada.
O processo de fervura para fazer casca cristalizada, por exemplo, rende o caldo para fazer molho de jabuticaba para carnes. Já o líquido que sai da polpa quando a fruta é descascada vira insumo para compotas.
Um projeto que tem impulsionado o resgate da identidade gastronômica da cidade é o Jabuticaba Gourmet. Desenvolvida pela Agência de Desenvolvimento de Sabará, a ideia é capacitar as produtoras, melhorar as marcas e a divulgação dos produtos.
“A parte mais técnica, como a elaboração dos rótulos, foi feita por nós. Mas a gente procurou respeitar a história e a identidade de cada uma das produtoras na elaboração das peças. Foi muito prazeroso de se fazer porque elas se abriram, falaram sobre a vida e as expectativas”, conta a coordenadora técnica do projeto, Fernanda Caetano.
Outro viés do Jabuticaba Gourmet é aproximar produtoras e chefs de cozinha. “Fizemos um workshop e desafiamos as produtoras a fazer um prato usando os próprios produtos na receita. Saíram coisas deliciosas. Só aí elas perceberam o potencial do que tinham nas mãos”, afirma Milsane de Paula, coordenadora de marketing do Jabuticaba Gourmet.
O projeto representou uma guinada na vida de Meire. Ela criou um CNPJ, mudou o nome da empresa, a marca e ainda aprendeu a congelar jabuticaba - a fruta é altamente perecível. “Antes, o turista que vinha a Sabará encontrava jabuticaba uma vez por ano, durante o festival. Hoje, temos produtos o ano inteiro”, explica.
A produtora ainda fez contato com vários chefs e passou a vender novos produtos como vinagre, mostarda e molho de pimenta de jabuticaba. “Para marcar todas essas mudanças, resolvi fazer uma receita especial, que tivesse a ver com a história de Sabará. Acabei inventando a Geleia Gold, feita com o nosso ouro negro, a jabuticaba, e ouro mineral, comestível”, conta Meire.
O luxo jamais imaginado pelos colonizadores portugueses está hoje disponível em um elegante potinho de vidro. O processo artesanal de produção desvenda técnicas tradicionais da gastronomia regional.
Primeiro, Meire estoura cinco litros de jabuticaba. A polpa é colocada para ferver em um tacho de cobre no fogão a lenha por 30 minutos. O suco que se forma no fundo da panela é retirado e colocado para descansar. A produtora então coa o suco para retirar as sementes e dá a dica: “é bobagem tirar as sementes antes porque elas soltam na fervura”.
O líquido volta para o tacho. São dois litros e seis colheres de açúcar cristal. Meire vai misturando com a paciência de quem entende do assunto. “São uns 30 minutos até que as bolhas fiquem mais grossas e comecem a estourar como pequenos vulcões. Aí, pode tirar do fogo”, revela.
Chega a hora do toque especial. Ela coloca a lâmina de ouro na panela e mistura com delicadeza. “Meu marido trabalha em uma mineradora que, até hoje, extrai ouro em Sabará. Eu vivo em função das jabuticabas. Do mesmo jeito que deu certo aqui em casa, sabia que os dois ingredientes iam casar bem na receita”, brinca.
A maior satisfação da produtora é ver as jabuticabeiras da região frutificando e gerando renda. “Um dos meus fornecedores trabalha como motorista de ônibus e colhe a fruta no sítio do pai. Na última safra, em duas semanas ele recebeu R$ 5 mil. Faz toda a diferença para a família”, diz a produtora que faz planos ousados para o futuro: “quero crescer, ajudar a impulsionar a região e ter minha própria agroindústria”.

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