Marcelo Prates/Hoje em Dia
DJs animam as noites às quintas e sextas, sem a cobrança da entrada
A inflação em alta corroeu o bolso do consumidor e jogou água no chope
do setor de bares e restaurantes de Belo Horizonte. Sem dinheiro, é cada
vez mais comum que as pessoas encontrem alternativas para se divertir
gastando menos.
Uma delas é se reunir com os amigos em casa. Como consequência, no
primeiro trimestre do ano, 57% dos estabelecimentos registraram queda no
faturamento, quando comparado com o dos últimos três meses de 2014,
segundo pesquisa realizada pela Associação Brasileira de Bares e
Restaurantes (Abrasel) em parceria com a Fispal.
É o caso do Barbazul, tradicional bar localizado no bairro
Funcionários, na região Centro-Sul de BH. De acordo com o proprietário,
José Márcio Ferreira, a redução na frequência dos consumidores é nítida.
“Se antes a pessoa vinha ao bar quatro vezes por semana, hoje ela
aparece duas. E ainda consome menos”, afirma.
A cerveja foi o produto mais cortado. Como reflexo, em alguns meses a
queda no faturamento chegou a 20%, na comparação com igual período do
ano passado. Atualmente está 10% inferior.
Demissões
Para enfrentar a situação, foi necessário cortar pessoal. Antes, 28
pessoas trabalhavam no Barbazul. Hoje, o quadro é composto por 22
funcionários. O cardápio também mudou. Percebendo que as pessoas estavam
preocupadas em consumir menos, o empresário decidiu reduzir as porções e
os preços. O espetinho de 160 gramas de carne que custava R$ 10,90 foi
reduzido para 120 gramas e hoje sai por R$ 7.
Na Panelinha
No outro estabelecimento do empresário, chamado Na Panelinha, também
localizado no Funcionários, o problema foi maior. Inaugurado em março de
2014, o restaurante tinha a proposta de funcionar no período da manhã
como restaurante e à noite como bar. Devido à crise, a ideia não
decolou.
“Tivemos que encerrar as operações da noite e fechar a área de
churrasco. O cardápio também muda de acordo com a inflação. Se hoje o
peixe está em promoção, o destaque é o peixe. Se amanhã o preço do
frango cai, oferecemos mais frango”, afirma o empresário. Com a queda no
faturamento, não foi possível manter os funcionários. Dos 12 empregados
que trabalhavam no local, restaram quatro.
Casa de comida japonesa no Buritis chegou a cortar nos preços para minimizar o impacto
Cássio Arantes Lira, proprietário do Kinoko, famoso restaurante japonês
localizado no Buritis, região Oeste de Belo Horizonte, precisou se
desdobrar para atrair a clientela. Voltado para as classes A e B, o
Kinoko registrou queda de 40% no faturamento desde dezembro.
Além da redução no movimento, Lira explica que o tíquete médio
despencou. “As pessoas estão consumindo menos. Hoje elas não tomam
bebida alcoólica, não pedem sobremesa e optam pelos rodízios mais
baratos”.
A solução foi baixar os preços. No Kinoko, os pratos são servidos em
uma esteira localizada no centro do restaurante. O cliente serve-se
daqueles que mais gostar e paga pela quantidade. É o único de Minas
nesse estilo. Cinco pratos custavam R$ 35. Hoje custam R$ 30. Quinze
pratos custavam R$ 75. Agora, saem por R$ 70. O rodízio completo, sem
limite de peças, custa R$ 130.
Alta dos custos
Embora o preço tenha sido reduzido, a quantidade de peças mais nobres
agora é limitada. O motivo é simples. Além de o faturamento dos bares e
restaurantes estar em queda livre, os custos têm aumentado
progressivamente. “Nos rodízios completos, a pessoa pode consumir cinco
pratos nobres, como os de sashimis”, explica o empresário.
Para atrair o cliente, ele desenvolveu uma verdadeira força-tarefa.
Distribuiu nas 13 academias do bairro cerca de 7 mil cartões de
descontos progressivos, visitou as empresas da região para informar que
aniversariantes acompanhados não pagam o rodízio, distribuiu folders nas
portas dos colégios da região com prêmios que vão desde descontos e
rodízios grátis no restaurante até brindes nas escolas e academias
parceiras.
“Envolvi toda a comunidade em uma espécie de clube de vantagens”, diz
Lira. Parcerias com sites de compras também foram realizadas. Segundo
ele, a ação tem dado certo. “Começamos em maio e agora estamos colhendo
os frutos”, afirma.
Para economizar, casal optou por reunir amigos em casa
Casados há 12 anos, a engenheira de Segurança do Trabalho Marcelle
Hermann e o técnico em Segurança do Trabalho Gustavo Souza adoram o
ambiente boêmio e sempre frequentaram os bares. No entanto, a alta dos
preços mudou a rotina do casal.
“Tudo está caríssimo. Por isso, preferimos nos reunir com os amigos em
casa. Além de ficar mais barato, é mais confortável e agradável. Sem
contar que temos criança, que sempre consome alguma coisa”, afirma
Marcelle. De acordo com ela, a conta fica pelo menos 60% mais barata.
Quando eles decidem frequentar algum estabelecimento, o tempo de
permanência é reduzido. “Se vamos a algum bar para assistir a um jogo,
por exemplo, saímos assim que a partida termina”, diz Marcelle.
O comportamento do casal é repetido por outras milhares de pessoas em
Belo Horizonte. Entre elas, a engenheira civil Juliana Costa. Assustada
com os preços da alimentação fora do lar, ela, o noivo e um grupo de
amigos montaram um grupo em uma rede social chamado Encontro Gourmet. O
nome já diz tudo. Por meio da ferramenta, eles marcam encontros
gastronômicos.
De acordo com Juliana, enquanto uma conta em um bar chega a R$ 60 por
pessoa, um jantar com entrada, prato principal e sobremesa sai por R$ 25
em casa. Isso, sem a bebida.
“Eu gosto de vinho, que custa muito caro no restaurante. No
supermercado, posso comprar um mais em conta e fico bem. Meu noivo gosta
de cerveja, que custa cerca de R$ 9 no bar. Gastamos muito menos e nos
divertimos mais”, comemora.
Estabelecimento com tíquete inferior a R$ 15 amplia clientela
O diretor-executivo da Abrasel em Minas Gerais, Lucas Pêgo, é taxativo.
Enquanto as casas com tíquete médio acima de R$ 30 perderam clientela e
precisaram se reinventar para sobreviver no mercado, as que oferecem
produtos mais baratos e possuem tíquete inferior a R$ 15 ganharam
público. Neste meio, as casas especializadas em espetinhos, que não
cobram entrada, 10% e muitas vezes oferecem shows ao vivo, ganham
mercado.
“Sem contar que esse tipo de estabelecimento precisa de menos mão de
obra especializada. E a mão de obra chega a representar até 35% dos
custos de uma casa”, afirma Pêgo. Os insumos representam 30% dos custos,
enquanto a aquisição e manutenção de maquinário e uniformes consomem 8%
do faturamento. O aluguel, 12%, os impostos, 10%, água, luz e gás
representam 5%.
Por semana, pelo menos 4 mil pessoas passam por cada uma das unidades
do O Rei dos Espetinhos, localizadas no Prado, região Oeste, Floresta,
região Leste e no Anchieta, na região Centro-Sul, de acordo com o
proprietário, Alisson Andrade Godinho.
Em todas unidades, o valor dos produtos (cerveja, espetinhos comuns e
refrigerante) é o mesmo: R$ 6. “A pessoa pode tomar quatro long necks e
comer dois espetinhos com R$ 36. Ou comer dois espetinhos e tomar dois
refrigerantes com R$ 24. Isso, sem pagar para entrar, sem pagar 10%. É
um valor muito em conta”, diz o empresário.
De acordo com ele, o faturamento da unidade do Anchieta, inaugurada há
pouco tempo, tem crescido a passos largos. O das demais casas, no
entanto, tem andado mais devagar.
Mix
Embora o movimento do Rock Esporte Clube, no Funcionários, tenha se
mantido muito alto, o faturamento da casa registrou leve queda. De
acordo com o proprietário, Daniel Ballesteros, as pessoas têm segurado a
mão na hora de gastar.
A casa serve espetinhos e long necks, mas também oferece porções e
chopes. Para atrair a clientela, Djs animam a noite às quintas e sextas,
sempre sem cobrança de entrada. “Também fazemos muitas promoções de
chopes, que saem por até R$ 4, mais barato do que a long neck”, diz
Ballesteros.
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