– “O mundo está repleto da cólera dos imbecis”
“O
mundo está repleto da cólera dos imbecis. Em sua cólera, a ideia da
redenção os corrói, pois constitui o fundo de toda esperança humana.” A
frase é do escritor francês Georges Bernanos, de um impressionante livro
chamado “Os Grandes Cemitérios sob a Lua”, que acaba de ser editado no
Brasil pela editora “É Realizações”. Bernanos retrata na obra os
horrores morais da guerra civil espanhola e, católico militante que era,
o papel detestável da Igreja Católica da Espanha, que foi da omissão à
colaboração com as brutalidades do franquismo.
O pensamento
é grande, é profundo. Todos somos atingidos, de algum modo, pela ideia
de redenção, ainda que ela assuma a forma de uma crença profunda na
razão humana, que nos livraria de todos os males. Se a busca dessa
redenção se torna o valor único de um indivíduo e se alguns psicopatas
oferecem instrumentos simples e errados para atingi-la, eis que surgem
os fanáticos — religiosos ou não.
Refleti
sobre a frase de Bernanos ao me dar conta dos atentados terroristas
havidos na França, na Tunísia e no Kuwait. Cada país vive sua realidade
específica e, de fato, não creio que eles tenham um nexo, vamos dizer,
funcional entre si ou que obedeçam a um único comando hierárquico.
É improvável
que o Estado Islâmico, por exemplo, atue no Kuwait, onde, desde sempre,
a tensão se dá entre xiitas e sunitas. Na Tunísia, antes mesmo de o
mundo se dar conta da existência dos celerados, havia a tensão entre o
laicismo e o fundamentalismo, com, como tem sido assim até agora, o
triunfo do primeiro. Na França, não se descarte a atuação do Estado
Islâmico, que, por razões várias e complexas, encontra ecos no Ocidente.
Na raiz de
tudo, sempre!, está a cólera dos imbecis como resposta brutalmente
errada à ideia de redenção; à tentação de impor a todos os homens uma
ordem salvadora, que os coloque no caminho. Estaria eu aqui negando
mesmo a redenção cristã? Não! Porque essa se dá no coração de cada
indivíduo. Ainda que as pessoas se reúnam numa igreja, a crença é no
resgate de cada alma. E cada um dos convencidos, então, da salvação pode
fazer a Cidade de Deus. Sem imposição nem violência. Mas volto ao
ponto.
Ainda que os
atentados não tenham, entre si, um nexo funcional, causal ou
hierárquico, eles são fruto da mesma popularização do terror. O Estado
Islâmico, em certa medida, está, sim, na raiz, vamos dizer, espiritual
de todos os ataques. Essa gente é a expressão moderna do mal absoluto, e
me parece claro, a esta altura, que o mundo está a negligenciar o
perigo que representa essa força demencial.
O maior
risco que corre o homem é ser apresentado à ausência de limites. Quando
tiverem tempo, assistam ao perturbador “Salò ou Os 120 Dias de Sodoma”,
de Pasolini. O genial cineasta italiano, odiado por bons motivos por
comunistas (e ele era um deles) e fascistas, investiga a alma fastidiosa
dos que vivem em um regime sem regras, onde tudo é permitido. Essa é a
lógica do terror.
O Estado
Islâmico oferece ao homem essa fronteira que o joga no terreno do
vale-tudo, tendo como promessa a redenção. À diferença do que sugeriu
Dilma na ONU, não há diálogo possível. Eles têm de ser esmagados para
que possamos preservar, inclusive, o homem dos horrores de que ele é
capaz de perpetrar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário