Fraqueza do mercado de trabalho, baixa taxa de poupança e produtividade estagnada podem encerrar o fenômeno que conduziu o crescimento econômico do país nas últimas décadas
Segundo o demógrafo José Eustáquio Diniz Alves, da Escola Nacional de Ciências Estatísticas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil não fez bom uso de seu bônus porque não investiu suficientemente em educação de ponta e inovação, a exemplo de países como China e Coreia do Sul. Soma-se a esse déficit as sucessivas crises econômicas que se abateram sobre o país nas últimas três décadas e tem-se o cenário perfeito para o desperdício da vantagem. "Surfar nesse fenômeno significa aproveitar a população ativa e torná-la cada vez mais produtiva. Hoje, temos 10 milhões de jovens que não estudam, nem trabalham: os 'nem-nem'. Isso é potencial desperdiçado. Esse seria o momento de melhorar as condições de vida da população, enriquecer antes de envelhecer. O que está acontecendo é que o país está envelhecendo sem enriquecer, sem conseguir equacionar os problemas básicos da população", afirma. Segundo Alves, a crise econômica atual encerra com chave de ouro um ciclo de mau uso do bônus. "O que vemos hoje na economia é resultado de decisões erradas e falta de investimento. O que foi feito na última década corroeu pelo menos quinze anos de bônus demográfico", diz.
Além de permitir um aumento da renda per capita, o bônus também pode propiciar a reforma da estrutura do Estado - sobretudo da previdência - graças ao apoio de toda uma geração de contribuintes. Com o envelhecimento da população, a poupança tenderia a aumentar, já que pessoas entre os 40 e 65 anos, em tese, já acumularam conquistas e pouparam ao longo da vida. Mas não é bem isso que ocorre. Segundo o economista Samuel Pessôa, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), o efeito do bônus no país foi neutralizado pela baixa propensão a poupar do brasileiro. Prova disso é que, em média, o governo gasta 5% do PIB com educação básica e 13% com idosos. "Temos uma previdência relativamente generosa. Não estimulamos a poupança quando deveríamos e não conseguimos equacionar o déficit da previdência com as vantagens do bônus demográfico", afirma Pessôa.
Reverter essa tendência, na opinião dos especialistas, requer uma mudança profunda em políticas públicas, sobretudo aquelas que versam sobre a educação. O professor Eduardo Rios Neto, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), alerta ser essencial ampliar a eficácia dos investimentos - e não, necessariamente, os valores em si. "Não há outra saída para gerar riqueza capaz de sustentar a previdência que não uma população mais preparada, com mão de obra mais qualificada. Não se trata de despejar dinheiro, e sim de gastá-lo melhor", afirma.
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