No período noturno, em ao menos dois dias da semana não há clínico geral.
Nesta quarta, pronto-socorro adulto tinha mais seguranças do que médicos.
Três seguranças escoltam a porta de entrada do pronto-socorro do Jaçanã (Foto: Lívia Machado/G1)
Na noite desta quarta-feira (30), à porta do Hospital São Luiz Gonzaga,
no Jaçanã, na Zona Norte de São Paulo, um segurança avisava os
pacientes: “não tem médico”. No pronto-socorro adulto, apenas um
ortopedista e um ginecologista estavam de plantão. No balcão de
atendimento, um novo informe. “Hoje, só SAMU, viatura e ambulância.”,
repetia a funcionária. O hospital trabalhava com equipe reduzida e
direcionada somente para casos emergenciais. Pacientes eram orientados a
procurar outro hospital da região.Em 2013, o centro médico fez, em média, 241 mil atendimentos de urgência, 2250 partos e 69 mil consultas ambulatoriais.
O hospital foi fundado em 1904 como um leprosário. Em 1940, era um dos principais centros de tratamento de tuberculose. Ficou cerca de nove anos fechado, e foi reativado com a inauguração do pronto-socorro em 1994, e a maternidade e centro obstétrico dois anos depois.
Desde 2008, o centro médico é uma Organização Social de Saúde (OSS) municipal administrada pela Santa Casa de Misericórdia. Na semana passada, a irmandade fez eclodir sua crise financeira interrompendo o serviço no pronto-socorro do Hospital Central, em Santa Cecília.
Os problemas econômicos já respingaram em um dos oito hospitais gerenciados pela irmandade. Nesta terça-feira, o G1 adiantou que a Santa Casa tinha pedido ao governo para deixar a administração do Hospital Estadual de Franco da Rocha, uma das quatro Organizaçoes Sociais de Saúde Estaduais. Após reunião na Secretaria de Estado da Saúde, entretanto, a instituição decidiu continuar à frente do Hospital.
No Jaçanã, após as 19h, segundo funcionários e pacientes entrevistados pela reportagem, as portas estão fechadas às segundas, quartas e finais de semana quinzenais. O problema ocorre há cerca de três meses. Nesta quarta, havia mais seguranças do que médicos no Luiz Gonzaga.
Questionada sobre a situação, Secretaria Municipal de Saúde disse que repassa mensalmente à Santa Casa R$ 7.916 milhões para a gestão do Hospital Municipal São Luiz Gonzaga.
A gestão municipal alega que nesta quarta, a equipe médica estava composta por 12 profissionais, "entre ortopedistas, cirurgiões e ginecologistas/obstetras. Na falta do clínico, um dos cirurgiões foi deslocado para atendimento exclusivo aos pacientes que estavam em observação."
Quanto à falta de médicos, a secretaria revela que além do processo seletivo para a contratação de clínicos, desde julho publica no site as vagas disponíveis nas Organizações Sociais de Saúde que atuam na cidade. E afirma ter aderido ao Programa Mais Médicos para a contratação de profissionais para a Rede Básica e hospitalar. A Santa Casa não respondeu aos questionamentos do G1 até a publicação desta reportagem.
Pacientes aguardam atendimento de ortopedista
no PS do Jaçanã (Foto: Lívia Machado/G1)
A dona de casa Zilá Rodrigues da Silva, de 55 anos, foi ao hospital
acompanhar a amiga Cristina Dias, de 54 anos, que estava com fortes
dores nas mãos.no PS do Jaçanã (Foto: Lívia Machado/G1)
“Viemos à tarde, mas não tinha ortopedista. Mandaram voltar às 19h, que ele estaria aqui. Mas é o único médico que tem agora à noite”, disse Zilá. Cristina teme perder o emprego já que não consegue trabalhar há nove dias por conta dos sintomas.
Ela é auxiliar de cozinha de um restaurante na Avenida Paulista. Já buscou ajuda em dois postos de Atendimento Médico Ambulatorial (AMA) e ao menos um hospital. Ao deixar o São Luiz Gonzaga, não achava que seu problema seria resolvido. "Não fiz exame nenhum, a consulta durou menos de cinco minutos. Ele deu um remédio e mandou embora", lamentou.
Enquanto aguardava a amiga sair da consulta, Zilá revela ter visto um rapaz de 22 anos, com diversos ferimentos pelo corpo, ser barrado de entrar no centro médico. “Ele estava todo ensanguentado, com machucados na cabeça, nos braços. Tudo em carne viva. Nunca vi isso na minha vida, um hospital que não tem um médico pra fazer curativo. O garoto morrendo de dor, nervoso.”
A falta de profissionais, de acordo com Doroteia Lemos, de 44 anos, é uma constante. Ela aguardava atendimento para o filho de 13 anos, com dores no peito. O menino tinha se machucado durante uma brincadeira na escola.
“Viemos à tarde e não tinha médico, só pediatra. A situação está bem critica mesmo, o hospital está sem médico há uns dois meses. A gente fica revoltado, né? Mas não pode fazer nada. Vai brigar com quem?”.
Aline Oliveira Leal, de 25 anos, estava com enjoos, tontura e dor de estômago. Chegou ao Luiz Gonzaga por volta das 20h30. Com a negativa no atendimento, disse que tentaria a sorte no Hospital Geral de Guarulhos. A equipe de reportagem ainda conversou com ao menos 10 pessoas não conseguiram atendimento no hospital no período noturno. "Atendimento público de saúde é isso, peregrinação e rezar para ter a sorte de encontrar profissional", alegavam os pacientes ao deixar o local.
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