sexta-feira, 27 de junho de 2014

Homicida versus suicida


Uma avaliação das limitações humanas não está presente em lugar algum nas ações ou teorias neoconservadoras. Deste modo, é improvável que eles evitem aventuras estrangeiras, déficits de orçamento ou aquele tipo de conservadorismo compassivo (que significa o derradeiro colapso da própria civilização).

Parece que estamos a testemunhar uma operação de distração que alveja a fronteira dos EUA com o México (que por sinal está abarrotada de pessoas). Qualquer pessoa com faro estratégico deveria estar alarmada com o rumo que esse caso está tomando. É um fato objetivo, queiram ou não, que alguém investiu muito para bagunçar nossa fronteira. Agora, inclusive, a patrulha de fronteira enviou pessoas do Arizona para o Texas. Entretanto, as principais rotas do tráfico de drogas que chegam aos EUA passam pelo Arizona. E como bem sabemos, esses são os mesmos caminhos usados por Moscou no passado para contrabandear armas de destruição em massa (ADM) sem que fossem detectados pelos nossos serviços de segurança. Sendo assim, há razão para nos preocuparmos, especialmente se considerarmos que a Rússia voltou ao seu elevado estado de alerta e à consequente mobilização e exercício de tropas. Ao mesmo tempo, o Iraque está sendo perdido para um tipo de blitzkrieg terrorista. Tudo isso é muito desconcertante, embora Washington continue com sua costumeira estupidez. Enquanto o inimigo se movimenta em todos os fronts, nossos líderes em Washington estão como gatinhos cegos: perdidos e condenados. Eles não sabem o que estão fazendo e não conseguem vislumbrar a ameaça letal que se forma no horizonte.
Em termos de política externa, a interação fatal entre elementos marxistas, esquerdistas (1) e neoconservadores não pode ser negada. Eis uma combinação de matar qualquer nação.  Em termos da exploração da esquerda, os mais proeminentes políticos marxistas nunca foram seguidores doutrinários de uma doutrina fixa, dado que eles acreditam em flexibilidade tática. Eles usam o nazismo se for preciso mobilizar a Europa rumo a um ambiente de loucura xenofóbica após um suposto uso “islâmico” de ADMs contra a América ou contra cidades da Europa Ocidental. Lênin uma vez disse: “Não existe dogma marxista”. Mao também jamais acreditou num marxismo estrito e Stálin o ajustou para suas necessidades estratégicas. Com algum humor, pode se dizer que todas essas figuras foram neoconservadoras, exceto pelo fato de que eles aderiram a um princípio que os neoconservadores aderem apenas esporadicamente. Os verdadeiros comunistas acreditam no auto-engrandecimento homicida. Os neocons empreendem assassinatos em massa apenas em nome da democracia (o que faz com que fique por isso mesmo). E quanto ao interesse nacional americano? E quanto a defender nossas costas contra a Rússia e China? Mesmo George W. Bush não pôde fazer muito por isso. Ele tinha de lutar pela democracia no Oriente Médio enquanto nos deixava sem defesa em casa. Foi uma ação sem resultados favoravelmente práticos em que milhares morreram, para que enfim, o Iraque se tornasse um satélite do Irã; e nós pagamos bilhões por isso.
Não sei da história toda acerca do neoconservadorismo da administração Bush, portanto o que for dito em seguida deve ser lido com algum ceticismo. Sendo assim, se a ideologia pode ser considerada como fator justificante para certos instintos ou predisposições políticas, qual instinto justifica o neoconservadorismo? Suicídio político? Karl Marx era evidentemente um narcisista pernicioso, senão um sociopata (ou talvez até um psicopata). Esses neoconservadores que outrora foram marxistas são mais bem descritos se forem considerados ex-crentes desiludidos, que são flexíveis em vários sentidos. Após terem sido peças descartáveis do marxismo (e se percebido como tais), eles deixaram essa atmosfera. Entretanto, esse abandono do marxismo e a conversão a um outro modelo aconteceu porque eles pretendiam acreditar em alguma forma de verdade ideológica. Essencialmente dizendo, eles queriam acreditar na fada dos dentes, apesar de a fada “vermelha” tê-los desapontado profundamente. E aqui estamos... O marxista Obama está na Casa Branca e os neoconservadores pavimentaram o caminho dele em nome da democracia.
O marxismo real é um crime na mais alta escala, e sua teoria é apenas o Primeiro Crime de uma série de crimes contra a decência e a verdade. É um embuste intelectual que abre um caminho rumo ao poder absoluto. O crente neoconservador não é do mesmo grau de periculosidade que o líder marxista. O neocon é perigoso porque ele faz de si mesmo uma peça descartável. Com notáveis exceções, o perigo vem do fato de que o neocon acredita nas sandices que profere. Além disso, ele também se mantém inconsciente dos seus verdadeiros motivos, que são invariavelmente projetados em seu inimigo. É triste que a maior parte da humanidade não pensará seriamente nesses assuntos, e a porcentagem de “pensadores” próximos ao topo da pirâmide política tem diminuído desde o século XIX. O que temos hoje, em vez de pensamento sério, é um falatório inconsequente que quase sempre ofende simultaneamente o senso comum e o bom gosto e nos traz até à ridícula situação política que vemos em torno.
Na maior parte das vezes, os nossos líderes não podem identificar o interesse nacional nem se for colocada uma arma na cabeça deles e for feita uma contagem regressiva começando do número 100. Eles simplesmente são incapazes de pensar além de um emaranhado de imperativos pseudo-religiosos disfarçados de princípios políticos. A maior parte das pessoas está absorta em ideias abstratas, embora sejam por causa destas que ou uma civilização se mantém viva ou se arruína. Penso que chegamos a um ponto em que quase ninguém em posição de tomar as decisões é capaz de entender as ideias e a “ciência” as quais se basearam de fato nossa civilização, e que tampouco sabe da tecnologia política da Antiguidade a qual nossos Pais Fundadores se basearam. Em vez disso, nossos líderes e analistas que estão na mídia estão obcecados por ideias abstratas que são autodestrutivas. Uma avaliação das limitações humanas não está presente em lugar algum nas ações ou teorias neoconservadoras. Deste modo, é improvável que eles evitem aventuras estrangeiras, déficits de orçamento ou aquele tipo de conservadorismo compassivo (que significa o derradeiro colapso da própria civilização).
O líder marxista é mais prático que seu joguete enquanto tenciona saquear uma determinada economia. O neocon se engrandece psicologicamente ao acreditar sinceramente que ele está do lado dos anjos. Esse tipo de gente confusa se encaixa naquela expressão de Churchill: “ovelha em pele de ovelha”. Eles não podem derrotar um inimigo verdadeiro, dado que eles representam na estratégia nacional o que os New Dealers representaram na economia, isto é, o idealismo barato, o slogan barato e um regime em que os resultados são os opostos dos esperados. A esse respeito, podemos considerar Woodrow Wilson o primeiro presidente neoconservador, especialmente se considerarmos sua “guerra para acabar com todas as guerras”. Sabemos o quão bem isso funcionou. (Após isso veio a Guerra contra a pobreza, a Guerra contra as drogas, e agora, a Guerra contra o terrorismo.)
O desperdício ao qual pode ser atribuído a esse pessoal não é mensurável em bilhões, mas em trilhões. Os esquerdistas e neoconservadores irão estragar tudo, e os marxistas (ou um bando de lobos nazistas redivivos [dependendo da região]) irão coloca-los contra a parede quando o sistema se tornar anárquico (o que eventualmente acontecerá). O verdadeiro marxista tem instintos, mesmo que homicidas. Esses instintos são insanos, mas não obstante são parte de uma coerência operacional, especialmente em se tratando de tomar o poder. Do outro lado vemos que os esquerdistas e neoconservadores são artistas do suicídio político, pois possuem uma criatividade infinita para se matarem lentamente. A razão pela qual não podemos levar a democracia ao Iraque é que, fundamentalmente, a democracia não é uma panaceia sequer para nós mesmos. Conforme Robert Michels provou em seu livro Political Parties, “a democracia é apenas mais uma maneira de organizar a oligarquia”. E que tipo de oligarquia! Veja o tipo de gente que está sendo elevada ao poder!
Os Founding Fathers e os filósofos da antiguidade não acreditavam na democracia. O que eles acreditavam eram nos “freios e contrapesos”. O elemento democrático em uma constituição serve apenas como freio ao poder dos ricos ou ao poder do Executivo. Celebrizar a democracia como se fosse algo quintessencial é como celebrizar a monarquia ou advogar o poder desenfreado dos aristocratas. Esse tipo de defesa desmoraliza a sociedade e corrompe aquela classe de pessoas designada como a toda-poderosa do Estado. Sob a democracia, portanto, observamos aquilo que Diana West chamou de a “morte do adulto”. O povo é o Nero da nossa era, mimado pelo poder e votando em nome de qualquer benefício ou direito da ordem do dia. Mas é melhor que você não diga nada contra a democracia universal, a paz universal ou qualquer outra dessas absurdidades.
Rastrear o pedigree do neoconservadorismo nos leva a um ambiente psicológico desolador. Falamos de um tipo de pessoa que gravita em torno de certas crenças. Os esquerdistas (e os neocons) comunicam o espírito do fiel em tudo que eles dizem e fazem, ou seja, eles propagam a justeza — e até a necessidade — da crença no equivalente político da fada dos dentes. E você pode arrancar todos os dentes da boca dele, que ainda ele os colocará fielmente embaixo do travesseiro esperando uma recompensa na manhã seguinte. Mas temo que na manhã seguinte ele estará sem dentes e sem recompensa.
Bem feito para ele.

Notas:
[1] N.T.: A esquerda americana chamada de ‘liberal’, que não é necessariamente marxista, por isso o autor separa em dois termos os liberals dos marxistas.

N.T.: Para contextualizar o leitor acerca do neoconservadorismo e da contenda deste artigo, citamos o Dicionário do Pensamento Político de Roger Scruton. Segundo ele, o neoconservadorismo é:

“O tipo de conservadorismo intelectual que surgiu nos Estados Unidos, em parte como reação aos movimentos sociais e políticos da década de 1960, e em parte como apoio à política externa americana durante a Guerra Fria. As figuras mais proeminentes do neoconservadorismo eram intelectuais urbanos, acadêmicos e publicitários. Muitas dessas figuras vieram da social democracia, que havia sido abalada por aquilo que foi visto como o colapso imanente da sociedade americana, que por sua fez fora provocado pela liberação sexual, pelo multiculturalismo, pelo politicamente correto e pela cultura de dependência do Estado. [...]
[Mais recentemente], nascido das posições neoconservadoras, tem surgido um movimento no mundo político que visa pôr em prática certos princípios e aspirações que surgiram nas origens dos debates neoconservadores. Alguns dos membros desse movimento têm obtido posições de destaque no governo dos EUA, fato esse que trouxe maior atenção à filosofia por eles defendida (que nem sempre coincide com o neoconservadorismo stricto sensu). (1) Predomina a ideia que a sociedade americana deve seu sucesso à sua tradição democrática e ao seu respeito pela liberdade individual.  Ameaças à América vêm de pessoas que invejam esse sucesso e que não possuem as instituições e costumes que os permitem emular esses valores. A resposta, então, não é contê-los (como se fazia no passado) em suas fronteiras. A resposta é, sempre que possível, depor regimes que fomentam essa inveja, para que assim se possa espalhar as instituições democráticas e a liberdade de mercado, para que assim todo o mundo possa desfrutar dos privilégios que são atualmente desfrutados na América. A guerra do Iraque trouxe inevitavelmente olhares atentos a esse tipo de pensamento, e boa parte desses olhares são hostis. Parte da hostilidade vem de conservadores mais tradicionais (também descritos como “paleoconservadores”), que defendem uma política externa mais isolacionista e uma abordagem mais cética e introspectiva do legado democrático”.

http://jrnyquist.com

Tradução: Leonildo Trombela Junior

Nenhum comentário:

Postar um comentário