Rememora-se hoje o início do golpe militar que derrubou o governo João Goulart, há 50 anos. Por causa do número redondo, que marca a metade de um século, a data nunca foi tão lembrada. É um bom momento para se pensar o passado desta Nação, com a mente voltada para o futuro.
Do passado, vale reconhecer que a ditadura que se seguiu ao golpe não
foi uma exclusividade das Forças Armadas. Em sua gênese se encontravam
políticos, empresários, jornais – todos civis. Entre os jornais mais
influentes na época, apenas “Última Hora”, que nasceu na década anterior
com apoio do então presidente Getúlio Vargas – do qual Goulart foi
ministro do Trabalho –, se opôs à derrubada do governo.
Somente depois, quando ficou claro que em vez de democracia o país
caminhava para uma feroz ditadura, o “Correio da Manhã”, que pagou caro
pela ousadia, saiu em oposição ao novo regime. E o mais importante
jornal paulista na época, “O Estado de S. Paulo”, um dos mais influentes
na preparação do golpe, só passou a atuar em oposição à ditadura na
década de 1970, depois do AI-5. Ele expôs a censura à imprensa, ao
publicar poemas no espaço deixado em branco por notícias censuradas. Não
foi imitado por nenhum outro.
Entre as muitas entrevistas sobre o assunto, um destaque neste fim de
semana foi a do historiador Daniel Aarão Reis, professor da Universidade
Federal Fluminense, que acaba de lançar o livro “Ditadura e Democracia
no Brasil”, pela editora Zahar. Em entrevista publicada sábado pela
“Folha de S. Paulo”, Reis critica: falar em ditadura militar esconde a
participação de civis no golpe e no regime instalado em 1964.
O historiador integrava, aos 24 anos, o comando da Dissidência
Universitária da Guanabara. Ele foi preso em1970 e passou 50 dias muito
duros no DOI-Codi, onde foi torturado. Em seguida, foi mandado para a
Ilha Grande. Três meses e meio depois da prisão, foi colocado na lista
dos 40 presos trocados pelo embaixador alemão Ehrenfried Von Holleben,
que fora sequestrado pela luta armada em junho de1970. Os presos
libertados foram levados, num avião, para a Argélia.
Aos 68 anos, Reis avalia que a luta armada contra a ditadura foi um
equívoco, pois esse tipo de resistência não contava com o apoio popular.
Na época, o país era governado pelo general Médici, o mais popular
entre os ditadores pós 64.
Tampouco acredita que torturadores sejam punidos em consequência do
trabalho da Comissão da Verdade instituída pela presidente Dilma
Rousseff – que também foi presa e torturada. Para o historiador, “uma
comissão digna desse nome deveria ter o poder para vasculhar os porões
das Forças Armadas”.
De olhos no futuro, o historiador defende a abertura de um debate
nacional sobre a tortura como método. Seja de investigação, seja de
política de Estado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário