Abaixo, editorial da Folha de São Paulo, intitulado "Chinelos da
impunidade", sobre as chinelagens da Rose do Lula no escritório paulista
da Presidência da República:
Pouco mais de um ano e três meses
atrás, logo depois de decididas as penas para figurões do mensalão do PT, veio
à tona um novo e bizarro escândalo: o escritório da Presidência da República em
São Paulo se transformara numa filial de tráfico de influência sob a chefia de
Rosemary Noronha.
Íntima de Luiz Inácio Lula da
Silva desde a década de 1990, ela vai agora responder na Justiça pelos muitos
favores que teria concedido e pedido como uma das mulheres mais influentes da
república petista. A ação criminal contra ela e 17 associados se inicia no
exato momento em que próceres do partido se livram de cumprir penas de prisão
em regime fechado.
Noronha foi instalada no gabinete
paulistano por Lula e ali mantida por Dilma Rousseff, mas não tanto por seus
dotes administrativos.Como se tivesse recebido um feudo
para nele mandar e desmandar, de acordo com a Polícia Federal, comandava de São
Paulo um esquema de venda de pareceres que chegou a envolver duas agências
reguladoras federais e a Advocacia-Geral da União (AGU).
A amiga de Lula indicou os irmãos
Paulo Rodrigues Vieira e Rubens Carlos Vieira para diretorias da ANA (águas) e
da Anac (aviação civil), respectivamente. Na AGU, segundo a investigação,
contavam com o beneplácito do advogado-geral-adjunto da União, José Weber
Holanda Alves, que ajudou a resolver problemas do ex-senador Gilberto Miranda
(PFL-AM) com ilhas no litoral paulista.
Eram várias as moedas de troca
aceitas pelo grupo. De pagamentos em dinheiro vivo a passagens para cruzeiros,
circulava de tudo pelos dutos do esquema. Tais miudezas, diante das enormidades
do mensalão, chegaram a ser descritas por policiais como
"chinelagem".
Na época em que eclodiu, o
escândalo ajudou a firmar a noção de que o PT, ou ao menos setores do partido,
não conhecia limites para a corrupção. Solidificou a ideia de que a praticava
no atacado e no varejo --como fazem de resto tantas agremiações políticas no
Brasil.
Para impor tais limites, porém,
existe a Justiça. Se vierem novas condenações neste caso --que ora se torna
mais robusto com a aceitação da denúncia-- e outras nos muitos escândalos que
decerto surgirão, talvez um dia se recomponha a certeza de que a coisa pública
não é um butim devido a quem conquista o poder.
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