quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Saída de Maduro não acabaria com problemas da Venezuela, diz Capriles

Opositor, ex-candidato presidencial e governador de Miranda falou ao G1.

Governo vê 'golpismo' em onda de manifestações que deixou 14 mortos.

Giovana Sanchez Do G1, em São Paulo

Henrique Capriles fala durante protesto contra o governo em Caracas, no último dia 22 (Foto: Juan Barreto/AFP)Henrique Capriles fala durante protesto contra o governo em Caracas, no último dia 22 (Foto: Juan Barreto/AFP)
Para o principal líder oposicionista da Venezuela, Henrique Capriles, a recente onda de protestos de rua no país ocorre porque o governo "dá as costas para os problemas do povo". Quase um ano após a morte do líder Hugo Chávez, os venezuelanos tomaram as ruas das principais cidades do país para protestar contra o governo chavista, num cenário de crise econômica e reivindicações sociais. Herdeiro político do chavismo, o presidente Nicolás Maduro enfrenta as primeiras grandes manifestações contra sua administração — que deixaram, desde a metade de fevereiro, 14 mortos, mais de 140 feridos e 45 detidos.
arte perfil capriles (Foto: 1)
Em entrevista ao G1 por e-mail, Capriles, governador do estado de Miranda e ex-candidato presidencial derrotado por Hugo Chávez em 2012, argumenta que as manifestações —apoiadas e infladas pelo opositor radical Leopoldo López, que defende a saída antecipada de Maduro do poder— são legítimas, já que o país está mergulhado em uma crise que deve ser encarada de frente, mas não será resolvida com uma possível renúncia do presidente. "Os problemas seguem sendo os mesmos, e outros se intensificaram. Temos uma das mais altas taxas de inflação do mundo, a mais alta do continente. Temos o nível de desabastecimento mais elevado de nossa história. [...] Não existem incentivos para a produção nacional, tudo precisa ser importado, mais de 80% dos produtos que consumimos são importados."
A insegurança, uma das principais reclamações dos estudantes e de quem protesta nas ruas, foi evidenciada com a morte da atriz e Miss Venezuela Mónica Spear em um assalto que provocou comoção nacional em janeiro deste ano, segundo Capriles. No último dia 19, outra miss morreu, dessa vez baleada durante um protesto de rua.
"Para que tenham ideia, em 2013 houve mais de 25 mil assassinatos por atos delitivos, ao passo que no Iraque, um país em guerra, nesse mesmo ano se registraram cerca de 8 mil mortes por violência. Superamos em mais de três vezes a cifra de falecidos de um país em guerra. Isso quer dizer que na Venezuela temos uma guerra com a violência e não estamos ganhando", disse o governador.
Cronologia Venezuela com miss (Foto: Arte/G1)
Segundo ele, na questão de segurança, "o governo já implantou 22 planos que foram um fracasso. Por isso, quando ocorreu a morte de Mónica Spear eu sugeri ao governo deixar de lado nossas diferenças e sentarmos para buscar uma solução para o problema da insegurança, pois a vida de cada venezuelano é sagrada. Já conversamos várias vezes e iniciamos, com o ministro do Interior, Justiça e Paz, um plano de trabalho com os grupos policiais e queremos que funcione, queremos devolver a tranquilidade a nosso povo."
Capriles deixa claro que os problemas da Venezuela não se resolveriam apenas com a renúncia de Maduro. "São muitos os problemas que temos na Venezuela sem uma resposta por parte do governo. Não se trata de que saia o presidente, pois os problemas não vão ser solucionados só com sua renúncia. Trata-se de exigir do governo que corrija as políticas que assumiu e estabeleça as medidas necessárias para sair da crise em que nos colocou. Está na hora de o governo enfrentar os problemas."
Racha no chavismo?
Maduro tem chamado estes protestos de "golpe de Estado em andamento". Eles seriam promovidos por setores da oposição com o suposto apoio de conservadores americanos e do ex-presidente colombiano Alvaro Uribe, segundo o presidente. Uribe e os EUA negam.
"Se há uma coisa que esses protestos violentos fizeram, foi unir o chavismo", afirmou Maduro, na noite de domingo, em referência ao regime de 14 anos de Chávez. Sobre uma possível cisão entre os chavistas, Capriles diz que há declarações estranhas atualmente, mas nada que se possa comprovar. "Isso você teria que perguntar ao oficialismo, mas algumas declarações de alguns funcionários surpreenderam nos últimos dias.".
Repressão
Países vizinhos — e não tão vizinhos — começaram a se manifestar nos últimos dias a respeito da repressão aos protestos na Venezuela. O governo americano afirmou por meio de seu porta-voz presidencial Jay Carney que está empenhado — junto com os aliados regionais — em promover a calma e um "diálogo genuíno" no país. Para Carney, as autoridades venezuelanas deveriam "libertar imediatamente os manifestantes detidos e também suspender as restrições ao trabalho da imprensa independente e a divulgação de informações".
A procuradora-geral Luisa Ortega admitiu que 12 denúncias de violações aos direitos fundamentais nas três semanas de protestos estão sendo investigadas.
"Protestar não é um delito, é um direito consagrado na Constituição de nosso país. A Constituição estabelece que nós venezuelanos temos direito de participar livremente dos assuntos públicos. Vemos como em outros países os cidadãos realizam manifestações reivindicando e os governos não saem reprimindo os manifestantes, nem torturando, nem violando seus direitos humanos como faz Nicolás Maduro", disse Capriles.
A saída, segundo o opositor, é saber ouvir. "O governo tem que escutar o que o povo venezuelano está dizendo. É preciso existir um diálogo sincero e transparente se queremos sair da crise em que está nosso país. É preciso sentar e dialogar com todos os setores, mas não em um show de TV com uma pistola na cabeça."
"Por onde pode começar o governo para demonstrar seu verdadeiro interesse em solucionar a crise do país? Bom, libertando os presos políticos, por exemplo. Desarmando os grupos paramilitares. Sentando com a iniciativa privada, trabalhadores e com os venezuelanos para reativar a economia. Mostrando o verdadeiro interesse em demonstrar e combater a corrupção. Deixando de dar de presente nosso petróleo a outros países, enquanto haja um venezuelano com necessidades. Só assim acharemos o caminho para superar a crise."

Nenhum comentário:

Postar um comentário