sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Pais lutam para manter tratamento de menina com corpo coberto de pelos


Para acompanhar filha, pai se ausenta do trabalho e tem dias descontados.
Família do TO pede ajuda para conseguir transporte aéreo para Goiânia.

Fernanda Borges Do G1 GO

Quarta sessão removeu pelos de parte do tórax e do braço direito (Foto: Fernanda Borges/G1)Quarta sessão removeu pelos de parte do tórax e do braço direito (Foto: Fernanda Borges/G1)
A menina Kemilly Vitória Pereira de Souza, de 2 anos e 9 meses, que tem o corpo coberto de pelos, passou pela quarta sessão de laserterapia na quinta-feira (30) no Hospital Materno Infantil (HMI), em Goiânia. A criança já está com o rosto, os braços e a parte frontal do tórax sem as pelugens. Os pais comemoram os resultados, no entanto, enfrentam dificuldades para continuar o tratamento. “Os dias que preciso acompanhá-la estão sendo descontados do meu salário. Está difícil”, contou o pai, o eletricista Antônio de Souza, 34 anos.
A família mora em Augustinópolis, no Tocantins, e a renda familiar mensal é de R$ 1 mil. O eletricista diz que a empresa concordou em não demití-lo por causa dos dias em que fica ausente, mas que eles não serão pagos. “Só neste mês já perdi mais de R$ 300 no pagamento. E a situação vai se complicar mais, pois o tratamento dela é quinzenal. Não sei como vamos conseguir manter essa situação. O problema é que não temos condições de largar tudo lá e mudar de vez para Goiânia”, afirmou o eletricista.

Kemilly foi diagnosticada com uma doença genética e hereditária chamada hipertricose lanuginosa, também conhecida como "síndrome do lobisomem", que a faz ter uma quantidade de pelos no corpo acima do considerado normal.
Após dois anos buscando tratamento, os pais conseguiram a laserterapia no Hospital Materno Infantil, em Goiânia. “Agradecemos muito por tudo o que está sendo feito por ela, a ajuda que recebemos de muita gente, mas ainda precisamos de um suporte maior da Secretaria Municipal de Saúde do Tocantins, que não está nos ajudando como deveria”, lamentou a mãe da criança, a dona de casa Patrícia Batista Pereira, 22 anos.
Outra dificuldade enfrentada pela família é o deslocamento até a capital. Eles precisam ir de Augustinópolis até a cidade de Imperatriz (TO), de onde embarcam rumo a Goiânia. O problema é que o trajeto é feito de ônibus e a viagem leva mais de 25 horas. “Desta vez, viemos de avião, mas as passagens foram pagas por um voluntário. Mesmo assim, chegamos a Brasília às 20h de terça-feira e só embarcamos no voo para Goiânia às 13h de quarta. Por sorte, outra pessoa pagou a dormida em um hotel, ou então, teríamos que ficar no aeroporto”, conta Antônio.
Os pais dizem que já solicitaram três vezes ao governo do Tocantins o pagamento do transporte aéreo, mas que todos foram negados. “Eles alegam que o médico não preencheu o laudo direito e nos mandam pedir de novo. Essa será a terceira vez que apresentaremos a justificativa. Pode parecer capricho, mas se conseguirmos viajar em menos tempo, de avião, isso vai refletir no salário do meu marido, já que ele ficará menos dias afastado do trabalho. Sem contar no alívio que será para a Kemilly”, ressaltou Patrícia.
Pai diz que Kemilly demosntra estar feliz com o resultado do tratamento (Foto: Fernanda Borges/G1)Pai diz que Kemilly demosntra estar feliz com a
nova aparência (Foto: Fernanda Borges/G1)
No último dia 16, a Secretaria de Saúde do Tocantins (Sesau) informou ao G1 que entraria em contato com o médico responsável pelo tratamento, Zacharias Calil, para orientá-lo sobre o procedimento de solicitação do transporte aéreo. Porém, segundo ele, isso não aconteceu. "Eu já cansei de enviar laudos e eles não aceitam. A viagem de avião é necessária para o bem-estar da criança, pois as aplicações de laser deixam a pele sensível e a menina não pode ficar exposta ao sol. Sendo assim, quanto mais rápido ela estiver em casa, melhor”, destacou o médico.

Procurada novamente pelo G1, a Sesau informou que vai aguardar a nova justificativa clínica para a troca do meio de transporte para deslocamento da paciente. "Sendo aceita, será feita a troca de terrestre para transporte aéreo, mas inicialmente a equipe considera que a viagem não acarreta qualquer complicação para a saúde da menina e, por isso, é necessário que o médico seja mais específico no pedido."

A pasta ressaltou que  "todo esse rigor tem fundamento na previsão da Portaria/SAS/Nº 055/99, a qual impõe que a autorização de transporte aéreo para pacientes e acompanhantes será precedida de rigorosa análise dos gestores do Sistema Único de Saúde”.
A mãe de Kemilly também afirma que a ajuda de custo prometida para Tratamento Fora de Domicílio (TFD) nunca foi paga. “Até hoje não recebemos nenhum centavo desse benefício. Todos nos dizem que temos direito a essa ajuda, mas até agora nada. Sinceramente, não sei mais a quem recorrer.”

Sobre o pagamento dos valores para o Tratamento Fora de Domicílio, a Secretaria de Saúde do Tocantins informou que o processo para a liberação do recurso para a família está em andamento.
Kemilly Vitória nasceu com o corpo coberto de pelos e pais buscam tratamento (Foto: Fernanda Borges/G1)Pais levaram quase três anos para conseguir
ajuda para a filha (Foto: Fernanda Borges/G1)
Tratamento
A quarta sessão de laserterapia removeu os pelos de parte do tórax e do braço esquerdo. O procedimento durou cerca de 45 minutos. No entanto, a menina levou mais uma hora para sair do centro cirúrgico. “Como a área foi grande e fizemos alguns retoques nas demais que já haviam sido depiladas, a anestesia inalatória foi um pouco mais forte. Aí ela demorou mais para acordar, mas tudo ocorreu como planejado”, explicou Calil.
O médico diz que a criança está reagindo bem ao tratamento e, até que o laser seja aplicado em todo o corpo, as sessões devem continuar a ser feitas de 15 em 15 dias. “Esse é nosso objetivo. Aí, quando todo esse pelo inicial tiver sido removido, ampliaremos as sessões para períodos mensais, quando será feita a manutenção”, estimou.
Após a última sessão, quando foram retirados os pelos do tórax e do braço direito, a pele da menina descascou um pouco. Para Calil, essa reação já era esperada. “O laser faz uma espécie de queimadura leve na pele e é normal que aconteçam algumas pequenas lesões. Mas é tudo superficial e estamos tomando todos os cuidados para evitar que ela fique com manchas.”
Antônio afirma que a filha estranhou quando viu que estava com um dos braços sem pelos. “Ela apontava e dizia que foram os médicos que fizeram isso com ela. Mas em todos os sentidos demonstrava estar feliz, pois percebe que está ficando igual as outras crianças”, destacou o pai.
A próxima sessão de laserterapia está marcada para o próximo dia 20 de fevereiro.

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