JC Teixeira Gomes*
É esse mesmo fenômeno que explica a reação da torcida do Esporte Clube Bahia contra os desmandos de Marcelo Guimarães Filho, cuja incompetência é agravada pela insensatez de querer continuar na presidência do clube, mesmo arrastando-o à pior crise de toda a sua existência. O movimento "Bahia da Torcida" é apenas uma reação necessária e legítima do torcedor, que, aliás, foi paciente, durante muito tempo, com o descalabro administrativo no tricolor, sem igual no Brasil.
Marcelo Filho meteu na cabeça que é dono do Bahia, da mesma forma que poderia julgar-se Napoleão Bonaparte, pois a megalomania costuma manifestar-se através de várias formas. Talvez seja conveniente lembrar que até Napoleão acabou desmoralizado e foi escorraçado pelos russos na histórica derrota de 1812. Em suma, ele age com uma compulsão que o leva a ficar absolutamente insensível ante a possibilidade de estar levando ao extermínio uma das principais forças populares do futebol brasileiro e a principal do Nordeste. As derrotas no Brasileirão já começaram.
O presidente do Bahia alega que não renuncia porque sua permanência é legal (fato que muitos contestam e está sendo objeto de controvérsia jurídica). Na verdade, porém, não se trata de ser ou não legal. Sua renúncia se impõe por motivos éticos e esportivos. Já não tem condições de permanecer no cargo, pois é um cidadão acuado, que age de forma emocional, de maneira tão irrealista que julga poder enfrentar e vencer uma das maiores e mais apaixonadas torcidas do futebol brasileiro. Torcida, de resto, que progressivamente foi perdendo o entusiasmo e o brilho, abafada pela escuridão que emana dos atos da diretoria como um jorro maléfico sobre a alegria do povo.
No entanto, a grande fonte de renda do Bahia é a presença da sua torcida. Todos os demais patrocínios dependem do comparecimento maciço que faz do Bahia o que se convencionou chamar de "um clube de massa". Se os torcedores se ausentam, de onde Marcelo Guimarães Filho vai extrair recursos para sustentar sua ambição de poder? A sobrevivência desse dirigente depende da presença dos torcedores que ele hostiliza.
Até do ponto de vista da sua segurança, é traumática a situação do presidente do Bahia, que dificilmente se arriscaria, hoje, a andar por Salvador, sem o biombo da sua poderosa guarda pessoal. A violência é sempre condenável, mas registremos que ainda recentemente torcedores revoltados depredaram o Fazendão. Nem custa lembrar que multidões enfurecidas são como manadas desembestadas.
Tão fácil seria ao presidente contestado convocar representantes da coalisão "Bahia da Torcida" para uma reunião e saída honrosa, que preservasse o Bahia do desastre final, através da racionalidade de um novo planejamento! No entanto, em total descontrole, o homem investiu ainda há pouco em termos grosseiros contra o governador e a primeira dama do Estado, atacou jogadores campeões brasileiros e desafetos políticos, qualificando a senadora Lídice da Mata de "prefeita dos ratos". Só não explicou se os ratos invadiram também o Bahia.
No último dia 17, numa reunião histórica na Fonte Nova, o espírito libertário do Dois de Julho baixou sobre a massa tricolor em retumbantes protestos. Havia cartazes denunciando até Paulo Maracajá, que botou na direção seus apaniguados e hoje se recolheu a proveitoso ostracismo. A grande diferença é que em 1823 os bravos baianos botaram para correr as tropas lusas do general Madeira, enquanto agora quase sete mil tricolores exigiam a cabeça de um único homem, sem liderança e desprestigiado.
E vejam que ironia! Hoje, o grande adversário do Esporte Clube Bahia não está em campo, mas oculto nos bastidores: é o próprio presidente Marcelo Guimarães Filho, obstinado em seu afrontoso desafio de permanecer.
*jornalista, membro da Academia de Letras da Bahia
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