domingo, 29 de abril de 2012

Vítimas de abuso sexual precisam de assistência para enfrentar a violência


Conselho Tutelar de Uberlândia conta como é o trabalho.
'Profissionais devem entender causas e consequências', diz psicóloga.

Carolina Portilho Do G1 Triângulo Mineiro
Vítima podem levar marcas para o resto da vida (Foto: Reprodução EPTV Sul de Minas)Vítima podem levar marcas para o resto da vida
(Foto: Reprodução EPTV Sul de Minas)
Os casos de abuso sexual sempre envolvem histórias tristes, difíceis, que muitas vezes comprometem toda a família. Causam revolta e deixam marcas que no futuro podem fazer a vítima seguir caminhos que talvez não trilhasse se não tivesse sido violentada. O G1 foi ao Conselho Tutelar de Uberlândia, no Triângulo Mineiro, para saber como funciona o trabalho de assistência à vítima e à família e também ouviu uma psicóloga que enfatizou a necessidade de preparar profissionais para ajudarem na questão.
Há cerca de 14 anos uma adolescente, hoje com 16 anos, vinha sendo abusada sexualmente pelo padrasto em Uberlândia. O caso só chegou ao Conselho Tutelar da cidade após denúncias de vizinhos e da própria polícia. Durante visitas à casa para entender os motivos das agressões ao menino, a adolescente contou que era abusada pelo padrasto. O abusador também agredia fisicamente o enteado, irmão da adolescente.

“A vítima contou espontaneamente dos abusos e defendia o padrasto por achar normal a situação já que era violentada desde os dois anos de idade. Descobrimos que o abusador mandava o irmão e a mãe para a praça perto de onde moravam para ficar à sós com a adolescente e, neste período, tinha relação sexual com ela. Os irmãos foram acolhidos em 2010 e foram assistidos pelo Conselho Tutelar. Agora, após alta, passarão a ser cuidados por uma tia”, contou a conselheira tutelar Elza Vicência Oliveira.
Cada caso tem suas particularidades e alguns tratamentos podem levar anos."
Elza Vicência Oliveira, conselheira tutelar.
Esse é um dos muitos casos ocorridos na cidade e, na maioria das situações, as consequências vão além das marcas no corpo. O lado psicológico é o mais afetado e como forma de contribuir na recuperação de crianças e adolescentes que sofreram abuso sexual, o Centro Municipal de Atendimento à Criança e ao Adolescente (Cemaia) atua não só com as vítimas, mas também com as famílias dos envolvidos. São realizadas atividades como terapia, acompanhamento em grupo e individual, visita às casas, escolas e vizinhos para que a situação seja a menos traumática possível. Cada caso tem suas particularidades e de acordo com Elza, alguns tratamentos podem levar anos.

“Quando os abusos são recentes é menos traumático para as crianças e os adolescentes, mas quando são de muitos anos exige-se mais atenção. É muito importante as vítimas serem assistidas para evitar possíveis consequências como depressão, autoextermínio, suicídio, medo, isolamento, vergonha e uso de drogas”, afirmou a conselheira.
Ainda de acordo com a conselheira, em muitos casos também ocorrere a negligência da família em que a mãe, por exemplo, não percebe os sinais apresentados pela vítima, como baixo rendimento na escola, tristeza e introspecção. Além disso, as omissões ocorrem pelo fato de os abusos acontecerem, em boa parte, em ambiente familiar. “Geralmente a vítima só conta dos abusos na adolescência ou até mesmo na fase adulta, pois quem pratica o ato é uma pessoa de confiança e o líder dos abusos são os próprios pais, em seguida os padrastos”, contou Elza.
Psicóloga e doutora em psicologia diz que é preciso capacitar os profissionais. (Foto: Arquivo pessoal)Psicóloga e doutora em psicologia diz que é preciso
capacitar os profissionais. (Foto: Arquivo pessoal)
A psicóloga e doutora em psicologia, Eleusa Gallo Rosenburg, enfatizou que é preciso capacitar profissionais das diversas áreas, famílias e crianças e adolescentes para que entendam as diversas violências, inclusive a sexual, suas causas e consequências e principalmente o que fazer frente a cada uma delas.
“Todos precisam compreender que raramente a criança inventa fatos sobre violência sexual. Acreditar na criança ou no adolescente é o primeiro passo para romper com o ciclo da violência. Geralmente a mãe é conivente com a agressão por vários motivos, tais como ter sofrido na infância a mesma violência, viver uma relação de dependência psicológica ou financeira com o agressor, ausência da autoestima e recursos próprios e institucionais para enfrentar a situação. Quando é descoberta a violência sexual a família tende a mudar de bairro, escola, unidade de saúde ou cidade para poder continuar a violência”, explicou.
Segundo a doutora em psicologia, a criança e o adolescente que sofrem incestos - violência sexual sofrida dentro de casa entre parentes, ou pedofília – quando o agressor não reside na casa de vítima, têm condições de viver uma vida normal com o passar do tempo. “Seja numa relação direta com os cuidados que recebeu pós-denúncia, quer sejam de ordem médica, psicológica, social e principalmente afetiva dos membros da família, até mesmo do agressor que pode repensar seus atos e torna-se um adulto responsável e cuidador, arrependendo-se dos atos praticados e tentar rever os vínculos rompidos”, finalizou.

Atendimentos em Uberlândia
Em 2011, em Uberlândia, o Centro Municipal de Atendimento à Criança e ao Adolescente (Cemaia), que concentra as ocorrências dos três Conselhos Tutelares, da Delegacia Especializada de Atendimento à Criança e ao Adolescente e da Promotoria da Infância e Juventude, atendeu 498 famílias, um aumento de quase 65% em relação a 2010, em que foram feitas 302 assistências.

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