Código patriarcal é quebrado nos atos oníricos do longa-metragem IMO
Dirigido por Bruna Schelb Corrêa, obra sem diálogos é fragmentada em partes relacionadas a espaço e à memória, em um manifesto feminista alegórico carregado de tocante honestidade
Nosso espírito se dilata de acordo com o tamanho daquilo que contemplamos. Como enxergar além da aparente normatividade contida no código masculino? Se racionalizar e reproduzir apontam para esta padronagem, a diretora brasileira, natural de Cataguases (MG), Bruna Schelb Corrêa, segue por outros caminhos em seu longa de estreia, IMO.
Sete anos após sua idealização, o filme recebeu remasterização completa pela autora e chega aos cinemas nacionais dia 20 de Março - mês em que é celebrado o Dia Internacional da Mulher. A distribuição do longa é da Descoloniza Filmes com apoio da Lei Paulo Gustavo de Minas Gerais.
Entre os alinhavos das lembranças reside a matéria que nos constroi a alma. Alma que nos guia dentro da realidade, nos sonhos e na vigília: elemento daquilo que nos é inerente, o imo. Memória é lugar de voltar, ainda que doa. Dirigido e roteirizado por Bruna, IMO apresenta três mulheres que revisitam suas histórias e, neste ambiente regido pelas próprias angústias, podem vislumbrar novas reações possíveis. Fragmentado em partes relacionadas pelo espaço e a memória, o filme conta com atuações performativas de Giovanna Tintori, Mc Xuxu e Helena Frade.
Produzida de modo independente, a obra traz consigo um caráter fantástico e onírico, numa tentativa de abarcar, através de imagens, as minúcias do cotidiano feminino e suas opressões diárias, que dentro da história são apresentadas em situações ditas absurdas – ações e cenas como traduções de sentimentos. É o imaginário, esse campo subjetivo, não linear ou lógico, que busca revelar as emoções das personagens a partir de elementos que gerem no espectador autorreconhecimento ou estranhamento.
“Quando a gente não coloca o diálogo, não contamos para as pessoas o que elas têm que sentir, e as reações podem ser as mais variadas. De modo geral, a assimilação do filme por homens e mulheres tem sido completamente oposta. O mal estar causado no público masculino é bastante evidente”, revela Bruna.
Com referências que passam pelo surrealismo de André Breton, o cinema marginal de Rogério Sganzerla, o cotidiano feminino de Chantal Akerman e o experimentalismo de Maya Deren, IMO parte de experiências íntimas e memórias da própria diretora para elucidar o coletivo.
Baseado num estudo dos gestos cotidianos e suas frágeis relações com o absurdo, IMO busca convidar o espectador a mergulhar numa mente alheia à sua, todavia similar: é proposto um encontro com a experiência humana. Em meio às suas ações cotidianas de acordar, arrumar a casa e se pentear, as personagens param para refletir diante da luz catalisadora que as transporta para o ambiente em que suas memórias são exageradas de maneira lírica, sempre com um fio que as liga a realidade: a presença masculina.
Assim como as ações rotineiras de cada uma poderia fazer parte do repertório de qualquer outra mulher, assim também poderiam suas lembranças. Os ideais que cobram postura, subserviência e beleza são explorados nos segmentos oníricos sem que se percam nos elementos fantásticos - estes, pelo contrário, os fazem aflorar. A intenção da narrativa que intercala a realidade com o devaneio é justo a de salientar que momentos absurdos residem naqueles que parecem normais, corriqueiros, lançando luz a demandas sociais que por vezes se encontram obscuras.
Ao expor as rotinas que se naturalizam por serem comuns, nasce um enfrentamento às tradições que compõem a memória social coletiva, reivindicando o reconhecimento da mulher como sujeito histórico. Através de suas metáforas visuais é aberta uma janela para o sentimento feminino dentro da sociedade, janela esta que há muito se encontra fechada. IMO propõe, através do encontro com quem o vê, um convite à reflexão conjunta acerca desse vivo e pungente sentimento.
Ficha Técnica: IMO
Direção e Roteiro: Bruna Schelb Corrêa
Produção Executiva: Bruna Schelb Corrêa
Elenco: Giovanna Tintori, Mc Xuxu e Helena Frade
Assistente de Direção: Felipe Monteiro
Produtores: Renata Schettino, João Gabriel Marques, Bruna Schelb Corrêa, Luis Bocchino
Direção de Fotografia: Luis Bocchino, ABC
Montagem: Bruna Schelb Corrêa e Luis Bocchino
Assistentes de Fotografia: Caio Deziderio e Leonardo Morais
Mixagem: Chico Almeida
Som Direto: Michel Sagaz e Pedro Ivo Tanagino
Edição de Som: Luis Bocchino e Bruna Schelb Corrêa
Figurino: Isadora Martins
Produção: Filmes do Mato
Bruna Schelb Corrêa - Nascida em Cataguases - MG, Bruna Schelb Corrêa atua majoritariamente como diretora e roteirista de ficção. Escreveu e dirigiu o longa-metragem "IMO" que teve sua estreia na 21ª Mostra de Cinema de Tiradentes como parte integrante da Mostra Aurora e exibições nacionais e internacionais. Diretora e roteirista de outros quinze curtas-metragens de ficção, que acumulam premiações técnicas, de júri popular e crítica, tendo sido exibidos em mais de 150 festivais e mostras no Brasil e no mundo. Doutoranda em Artes, Cultura e Linguagens pela Universidade Federal de Juiz de Fora, possui pesquisa com enfoque em roteiro, técnicas criativas dadaístas, surrealistas e oulipianas, direção e produção independente no Brasil. Formada em Artes (UFJF, 2016), Jornalismo (FESJF, 2017) e Cinema e Audiovisual (UFJF, 2018). Sócio-fundadora da produtora audiovisual cataguasense Filmes do Mato.
Descoloniza Filmes - Fundada por Ibirá Machado em 2017, a Descoloniza Filmes é uma distribuidora paulistana dedicada a produções independentes e socialmente engajadas. Ao longo dos anos, lançou mais de 30 filmes que abordam temas políticos e culturais relevantes, estabelecendo-se como uma das distribuidoras mais ativas no cenário do cinema independente brasileiro.
Assessoria de Imprensa - IMO (Brasil)
@assessoriza: Izabela Costa
izabelacosta.imprensa@gmail.com
Da Lira Cultural: Flora Miguel
Nenhum comentário:
Postar um comentário