Coluna de Carlos Brickmann, publicada nos jornais deste domingo:
Falta
pouco para a escolha do presidente da República. Até agora nenhum dos
dois candidatos disse o que pretende fazer se for eleito. Lula, segundo
pessoas próximas, aproveitará seu mandato para lustrar uma biografia de
extrema esquerda, com estatizações, regulamentações generalizadas (o que
inclui a imprensa, num retorno à Censura), volta à política dos
“campeões nacionais”. Segundo outras pessoas próximas, vai aproximar-se
da classe média, com políticas que exercitou em seus mandatos e baseadas
na Carta aos Brasileiros. Bolsonaro garantirá verbas à Educação e à
Pesquisa, irá se afastar ou se aproximar da China, continuará a
administrar por atrito?
Os
dois candidatos se esmeram, ao contrário, apenas em campanhas de
destruição da imagem do adversário. Lula desenterrou uma velha
declaração de Bolsonaro, de estupenda falta de senso, dizendo que só não
comeu carne de índio por falta de companhia. Bolsonaro recortou uma
fala de Lula para inverter seu sentido: Lula disse que nenhum governo
investiu em educação e foi preciso que ele, quase analfabeto, abrisse
universidades e garantisse verbas para o ensino. Bolsonaro só manteve a
parte referente a “nenhum governo investiu em educação” no vídeo que
divulgou, para dar a impressão de que Lula incluía seu governo entre os
que não gastaram com educação.
Em
1692, houve uma caça às bruxas em Salem, nos EUA. Não é que agora, mais
de 300 anos depois, a eleição aqui gira em torno da religião?
De volta para o futuro
Em
1618, na Europa, começou a Guerra dos 30 Anos, entre protestantes e
católicos. No final, houve um acordo: em cada Estado a população teria a
religião de seu monarca. Naqueles tempos, era estranhíssima a ideia de
que cada pessoa pudesse ter a religião de sua escolha. E que é que
discutimos no Brasil de hoje? Se um candidato ter visitado um templo
maçom é suficiente para que não se vote mais nele, ou se evangélico deve
ser obrigado a votar em evangélico. No século 15, Galileu Galilei
demonstrou que a Terra é uma esfera. E hoje temos discussões sobre a
Terra plana.
Só
falta discutir se os índios têm alma – e dá até medo ver essa ideia
voltar na campanha eleitoral mais antiga de nossa História.
Boa notícia
O
jornalista e escritor Ruy Castro, competentíssimo, é o novo membro da
Academia Brasileira de Letras. Castro, com seu texto deliciosamente
agradável, é colunista da “Folha de S.Paulo”, autor de excelentes
biografias de Garrincha, Carmen Miranda, Nelson Rodrigues, de livros
sobre movimentos musicais – “Chega de Saudade”, “A Onda que se Ergueu no
Mar”, sobre a bossa nova, “A Noite do Meu Bem”, sobre o samba-canção, e
sobre o Rio de Janeiro, sua cidade do coração (embora tenha nascido em
Caratinga, Minas Gerais).
Pois
Ruy Castro é carioca como poucos cariocas. É capaz de escrever sobre
temas dolorosos e complexos com sinceridade e mantendo uma qualidade
literária que agrada a todos. Ruy é alcoólatra e narra sua luta diária
contra o problema; já foi demitido por adultério. Um nome que engrandece
a Academia Brasileira de Letras. Como escreve bem!
A marcha das urnas
Já
saem as primeiras pesquisas sobre o segundo turno, com vantagem para
Lula, mas encostado no empate técnico. De qualquer forma, é cedo: a
campanha está aberta e o fôlego do bolsonarismo e de Bolsonaro
surpreendeu. Haverá erros e alguns, em ambas as candidaturas, podem ser
fatais. Lembremos que, nas eleições de 2018, uma declaração infeliz de
Ciro Gomes (de que o papel de sua então esposa Patrícia Pillar na
campanha era o de dormir com ele) provocou forte queda em seus índices.
As mudanças
Bolsonaro
está um pouco atrás, mas tem a caneta, a tinta e a disposição para
utilizar todo o poder da Presidência na luta pela reeleição. Pode-se
achar um monte de defeitos no presidente, mas ele não pode ser
subestimado. Sim, pode ser grosso, tosco, o que se quiser, mas burro não
é: burro não chega até onde chegou. E não leve muito a sério a tradição
de que ninguém ganha uma eleição se não ganhar em Minas Gerais: a
tradição existe enquanto existir, e nada impede que seja modificada.
Lula, sem dúvida, tem mais carisma. Mas ou mostra o que pretende fazer
se eleito ou corre grandes riscos.
Bolsonaro
mente com a maior tranquilidade (agora, nega que tenha prometido nomear
um ministro terrivelmente evangélico para o Supremo. Mas já nomeou
André Mendonça; já comentou que gostaria de ver o STF iniciar as sessões
com uma oração). A mentira pode ou não pegar e influir poderosamente
nos números finais.
A grande pergunta
Uma
dúvida: sabendo-se que o país está dividido e que é muito mais difícil
governar assim, qual dos candidatos terá planos para reduzir o ódio
entre as alas predominantes no país? Algum candidato terá esses planos?
BLOG ORLANDO TAMBOSI
Nenhum comentário:
Postar um comentário